23 de maio de 2021

ALGUNS ASPECTOS SOBRE AS ALTERAÇÕES DO CONTRATO DE TRABALHO


 

Alexandre Luso de Carvalho

 

 Numa relação de trabalho com vínculo empregatício, por vezes a dinâmica das atividades da empresa e/ou a evolução da capacidade produtiva do empregado acarretam a necessidade de alterações no contrato de trabalho. Entretanto, não raro surgem dúvidas acerca da possibilidade legal da alteração no contrato e sua extensão. 

Quanto aos contratos individuais de trabalho, a CLT estabelece, entre seus artigos 468 e 470, basicamente, o seguinte:

 

a) QUANTO A POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO: “ (...) só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado (...)” (artigo 468[1]). Aliás, sendo esse artigo o centro de toda o tema aqui tratado, vale destacar, rapidamente, a lição do ilustre jurista SERGIO PINTO MARTINS[2]:

 

“O fundamento do art. 468 da CLT é o de que o trabalhador não poderia aceitar uma condição de trabalho pior do que a anterior; além disso, o obreiro poderia ser induzido em erro pelo empregador, ou por não ter condições de discernir o ato praticado pelo empregador que lhe é prejudicial – ou até mesmo sofrer coação patronal”.

 

b) QUANTO À REDUÇÃO SALARIAL: a Constituição Federal, em seu artigo 7º, inciso VI[3] deixa claro que o salário é irredutível, exceto em caso de acordo ou convenção coletiva dispor sobre essa possibilidade;

 

c) QUANTO À REDUÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO: tanto a Constituição Federal (artigo 7º, inciso XIII[4]), como a CLT (artigo 58[5]) estabelecem a jornada de trabalho não superior a oito (08) horas diárias. Todavia, essa jornada poderá ser reduzida mediante acordo e convenção coletiva. Aqui, vale ressaltar que a legislação específica (Medida Provisória nº 936/2020, convertida na Lei nº 14.020/2020) que instituiu o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda em razão da pandemia de Covid-19 permitiu a negociação para a redução proporcional da jornada de trabalho e do salário;

 

d) QUANTO À REVERSÃO DO CARGO DE CONFIANÇA OCUPADO: não é considerada alteração unilateral o empregador determinar o retorno do empregado, ocupante de cargo de confiança, ao seu antigo cargo (exemplo: gerente voltar a ser vendedor) e, consequentemente, não assegura a manutenção e/ou incorporação da gratificação ao funcionário durante o período em que exerceu a função (artigo 468, parágrafos primeiro e segundo[6]); 

 

e) QUANTO À TRANSFERÊNCIA DO EMPREGADO: os artigos 469 e 470 são muito claros quanto ao tema, principalmente quando se refere à transferência de município:

 

Art. 469. Ao empregador é vedado transferir o empregado, sem a sua anuência, para localidade diversa da que resultar do contrato, não se considerando transferência a que não acarretar necessariamente a mudança do seu domicílio. 

§ 1º. Não estão compreendidos na proibição deste artigo: os empregados que exerçam cargo de confiança e aqueles cujos contratos tenham como condição, implícita ou explícita, a transferência, quando esta decorra de real necessidade de serviço. 

§ 2º. É licita a transferência quando ocorrer extinção do estabelecimento em que trabalhar o empregado. 

§ 3º. Em caso de necessidade de serviço o empregador poderá transferir o empregado para localidade diversa da que resultar do contrato, não obstante as restrições do artigo anterior, mas, nesse caso, ficará obrigado a um pagamento suplementar, nunca inferior a 25% (vinte e cinco por cento) dos salários que o empregado percebia naquela localidade, enquanto durar essa situação.

Art. 470. As despesas resultantes da transferência correrão por conta do empregador.

 

f) QUANTO À ALTERAÇÃO DO TURNO DE TRABALHO: outro aspecto importante e que é bastante comum diz respeito a troca de turno (do diurno para o noturno e vice-versa), no qual destaco dois aspectos:

 

f.1. apesar do poder diretivo do empregador, constante no artigo 2º da CLT[7], essa alteração também segue a norma estabelecida no mencionado artigo 468 da CLT quanto a necessidade de mútuo consentimento e o não prejuízo ao empregado, seja de forma direta ou indireta;

 

f.2. não ficando demonstrada a existência de prejuízo ao empregado nessa alteração de turno não há o que se falar em ilegalidade do ato, conforme entendimento do Tribunal Superior do Trabalho (TST) em vários julgados, desde que observados os direitos e deveres de ambos (exemplo: se transferência para o turno da noite, deve receber o adicional noturno; se transferência para o turno do dia, perde o adicional noturno, conforme Súmula 265 do TST[8]). 

 

Um aspecto importante de ser abordado é que o mútuo consentimento, em alguns casos não necessita de registro, ou seja, de formalização, bastando a não oposição do empregado (é o consentimento tácito). Entretanto, particularmente considero isso  absolutamente temerário, principalmente para o empregador, uma vez que abre um flanco imenso para uma demanda trabalhista futura. 

Por fim, pelos pontos acima elencados, que trata de forma bastante resumida do assunto, verifica-se que as alterações do contrato de trabalho podem ocorrer, mas para tal, é fundamental que se respeite o direito dos empregados, bem como que se formalize detalhadamente em que consiste essa mudança dentro da relação laboral. A formalização significa tranquilidade para o empregado no presente e para o empregador, no futuro. 

 

Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

alexandre_luso@yahoo.com.br




[1] CLT, Art. 468. Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.

 

[2] MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho, 28ª ed., São Paulo, Editora Atlas, 2012, p.337


[3] Constituição Federal, art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: (...) VI - irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo;

 

[4] Constituição Federal, art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: (...) XIII - duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho;

 

[5] CLT, art. 58. A duração normal do trabalho, para os empregados em qualquer atividade privada, não excederá de 8 (oito) horas diárias, desde que não seja fixado expressamente outro limite.

 

[6] CLT, Art. 468. (...) § 1o. Não se considera alteração unilateral a determinação do empregador para que o respectivo empregado reverta ao cargo efetivo, anteriormente ocupado, deixando o exercício de função de confiança.

§ 2o. A alteração de que trata o § 1o deste artigo, com ou sem justo motivo, não assegura ao empregado o direito à manutenção do pagamento da gratificação correspondente, que não será incorporada, independentemente do tempo de exercício da respectiva função.


[7] CLT, Art. 2º. Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.

 

[8] TST, Súmula 265 - ADICIONAL NOTURNO. ALTERAÇÃO DE TURNO DE TRABALHO. POSSIBILIDADE DE SUPRESSÃO. A transferência para o período diurno de trabalho implica a perda do direito ao adicional noturno.


3 comentários:

  1. Esse excelente artigo sobre as Alterações do Contrato de Trabalho certamente será bem recebido tanto por empregado como por empregador, para que possam tomar todos os cuidados relativamente ao que preceitua a Constituição Federal de 1988, a Consolidação das Leis do Trabalho e outras Leis Ordinárias, como está fundamentado nesse importante artigo.
    Além do interesse por esse trabalho, que aborda às alterações desse contrato bilateral, há casos que podem estar relacionados com a Covid 19, por sua importância prática e por sua excepcionalidade.
    Além das partes que compõem a referida alteração, certamente advogados especializados em Direito do Trabalho terão proveito na leitura deste trabalho elaborado pelo ilustre causídico.
    Um grande abraço, meu filho.

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  2. Boa noite, pai.

    Que bom que gostaste do artigo! Além do que abordaste de maneira irretocável, é importante destacar que a observância do que determina a lei e as devidas anotações, se implementadas pelo empregador, se constituiria na quebra de uma certa e resistente informalidade dentro das relações laborais, o que só prejudica empregador e empregado.

    Grande abraço!

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  3. Boa noite!
    Excelente artigo, obrigado por compartilhar.

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