25 de outubro de 2020

O QUE SE DEVE OBSERVAR NA COMPRA E VENDA DE VEÍCULOS USADOS


 

Alexandre Luso de Carvalho

 

Na compra e venda de veículos usados e/ou seminovos muitas vezes, no anseio de os envolvidos não perderem o negócio, esses não tomam os devidos cuidados quanto ao estado físico do veículo, bem como ao seu estado legal e de seu proprietário – e aqui não se discute o mérito dessa falta de cuidado –, o que acaba gerando uma série de problemas que poderão acarretar ações judiciais, nas esferas civil e criminal.

Todavia, há alguns cuidados que podem e devem ser tomados para que não ocorram danos a nenhuma das partes envolvidas e a terceiros. Vejamos o que pode ser feito:

a)   AVALIAR O ESTADO FÍSICO DO CARRO: além do motivo óbvio – o comprador saber se comprará o veículo e se o fizer, qual o estado do bem – essa medida é importante em duas situações distintas:

 a.1. se a compra é feita junto à uma loja do ramo: nesse caso teremos uma relação de consumo e, portanto, haverá a natural observância dos princípios contidos no Código de Defesa do Consumidor, dentre eles a garantia integral do veículo – e não apenas para “motor e caixa”, como muitas vezes se vê – por noventa (90) dias a partir da efetiva entrega do bem, conforme determina o artigo 26, inciso II e parágrafo primeiro, do Código de Defesa do Consumidor[1];

a.2. se a compra é feita junto ao particular: nesse caso não haverá relação de consumo (tutelada pelo Código de Defesa do Consumidor), mas uma relação regida pelo Código Civil, no qual o vendedor é responsável pelo vício oculto, podendo acarretar a devolução do bem ou o abatimento do preço, conforme dispõem os artigos 441 e 442[2], dentre outras obrigações.


b)  PESQUISAR O HISTÓRICO DO VEÍCULO JUNTO AO DETRAN: essa pesquisa é básica e deve ser feita em relação ao veículo objeto da venda, bem como em relação ao veículo que entrar no negócio, pois é necessário saber:

b.1. se há multas vinculadas ao veículo;

b.2. se o IPVA e licenciamento estão em dia;

b.3. se não há restrição no prontuário do veículo, seja por alienação fiduciária, seja por determinação judicial ou por informação de furto/roubo ou qualquer outro motivo;


c)   PESQUISAR O HISTÓRICO DO VENDEDOR: tal cautela é fundamental, pois pode ser que o vendedor – particular ou loja do ramo – seja demandado em processos judiciais e seus bens estejam por serem penhorados ou ainda investigado ou réu por algum ilícito penal que no futuro possa afetar a compra e venda do veículo. Essa pesquisa pode ser feita junto ao Poder Judiciário e, em alguns casos em sites de busca;

d)  PESQUISAR O HISTÓRICO DO COMPRADOR: essa cautela, da mesma forma é fundamental, principalmente quando a compra não se efetuará por pagamento à vista. Como ter certeza se o pagamento será realmente efetuado? Essa certeza não se tem, mas a pesquisa auxilia a diminuir as probabilidades de realizar o negócio com um inadimplente frequente ou com um golpista;

e)  JAMAIS OUTORGAR PROCURAÇÃO PARA A VENDA DO VEÍCULO AO COMPRADOR: essa prática é extremamente comum, principalmente quando a venda é feita com uma loja do ramo no sentido dessa economizar nas despesas com a transferência do veículo. Todavia é algo muito perigoso e um risco que o vendedor do veículo não precisa (e não deve) assumir. Vejamos alguns pontos:

e.1. quando outorgamos (“passamos” na linguagem popular) uma procuração à alguém, estamos dando poderes para essa pessoa fazer algo em nosso nome. Isso significa que o veículo ainda continua sendo de propriedade do vendedor;

e.2. sendo o veículo ainda de propriedade do vendedor, tudo o que ocorrer será de responsabilidade desse, ou seja, este será o responsável pelo pagamento do IPVA, pelas multas (pagamento e pontuação) e corresponsável por fraudes que envolvam o veículo, acidentes com danos, lesões e/ou óbitos relacionados ao seu “antigo” veículo.


f)   ELABORAR UM CONTRATO DE COMPRA E VENDA: a elaboração de tal documento – com a necessária qualidade técnica – é importante, pois nele estarão as condições do veículo, o valor e os demais detalhes do negócio, o que resguarda ambas as partes de qualquer eventualidade ou acusação infundada;

 g) REALIZAR A IMEDIATA COMUNICAÇÃO DE VENDA AO DETRAN: o artigo 134 do Código de Trânsito Brasileiro[3] determina que no caso de transferência de propriedade do veículo, o prazo para a comunicação é de trinta (30) dias. Essa comunicação de venda pode ser feita pelo comprador ou pelo vendedor. Entretanto, o que se recomenda é que a comunicação seja feita no mesmo dia da venda, pois, de um dia para outro é o suficiente para ocorrerem infrações de trânsito, acidentes ou quaisquer outros eventos danosos envolvendo o veículo, o que significa “dor de cabeça” na certa para o antigo proprietário. Portanto, na dúvida, que o vendedor faça tal comunicação.

 

Assim, independentemente se a compra e venda do veículo é entre amigos, parentes, vizinhos, colegas de trabalho, membros da mesma congregação religiosa, clube, etc., as cautelas elencadas acima devem ser adotadas no sentido de se reduzir qualquer problema no negócio, mas que, se caso ocorra, a possibilidade de uma resolução favorável no âmbito extrajudicial ou no âmbito judicial aumentam.

  

Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808


Fonte da imagem 

alexandre_luso@yahoo.com.br


[1] Código de Defesa do Consumidor, Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em: (...) II - noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis.  § 1° Inicia-se a contagem do prazo decadencial a partir da entrega efetiva do produto ou do término da execução dos serviços.

[2] Código Civil, art. 441. A coisa recebida em virtude de contrato comutativo pode ser enjeitada por vícios ou defeitos ocultos, que a tornem imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe diminuam o valor.

Código Civil, art. 442. Em vez de rejeitar a coisa, redibindo o contrato (art. 441), pode o adquirente reclamar abatimento no preço.

[3] Código de Trânsito Brasileiro, art. 134. No caso de transferência de propriedade, o proprietário antigo deverá encaminhar ao órgão executivo de trânsito do Estado dentro de um prazo de trinta dias, cópia autenticada do comprovante de transferência de propriedade, devidamente assinado e datado, sob pena de ter que se responsabilizar solidariamente pelas penalidades impostas e suas reincidências até a data da comunicação.


2 comentários:

  1. Que bela postagem, Alexandre! Tantos são os cuidados necessários! Você fez uma abordagem por demais esclarecedora. Gostei muito. Abraço.

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  2. Bom dia, Marilene.

    Realmente tais cuidados são absolutamente necessários para algo que parece tão trivial - a compra de um carro.

    Muito obrigado por estares lendo os meus artigos!

    Abraço!

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