4 de abril de 2021

AÇÃO REVISIONAL DE FINANCIAMENTO VALE A PENA?


 

Alexandre Luso de Carvalho

 

Com a estabilização da economia iniciada no Governo Itamar Franco, decorrente da criação do Real, em 1º.07.1994, e de toda a sua política econômica, o brasileiro passou a ter uma possibilidade de planejamento orçamentário e um maior poder de compra. Com isso,  camadas da população que antes não tinham acesso a determinados bens e serviços, passaram a consumir, também facilitada pela possibilidade da contratação de empréstimos bancários.  

Ocorre que tudo isso tem um preço e, por vezes, muito alto. E não é força de expressão. É do conhecimento de todos que o Brasil tem uma das maiores taxas de juros do Planeta, o que tornam os financiamentos demasiadamente onerosos e, muitas vezes impossíveis de serem pagos. 

Em razão disso, é frequente os consumidor chegar ao escritório de advocacia, com o contrato de financiamento – que não leu em sua totalidade –, com um carnê que não consegue mais pagar, com o nome nos cadastros de restrição de crédito (SPC e Serasa), sendo réu de uma ação de execução ou de busca e apreensão por causa desses contratos e, pretendendo resolver a sua situação financeira por meio da ação de revisional do contrato de financiamento. 

Todavia, a ação revisional, com fundamento nos altos juros cobrados, não pode ser encarada como a solução dos problemas advindos da inadimplência contratual, pois juros altos não significam juros abusivos. Explico: as taxas de juros das instituições bancárias, conforme consta no site do Banco Central do Brasil[1] demonstram uma média de mercado bastante alta. Assim, se num determinado contrato é aplicada essa média de juros praticada pelo mercado, mesmo que alta, não há abusividade de juros. Para ilustrar tal entendimento, vale destacar um julgado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:

 

AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. CÉDULA DE CRÉDITO. IMPROCEDÊNCIA. ALEGAÇÃO DE ABUSIVIDADE DA TAXA DE JUROS DO NEGÓCIO. DESCABIMENTO. Não tendo sido apresentada aos autos qualquer documentação que demonstre qual é o percentual estipulado pelo Banco Central, órgão econômico responsável pela divulgação dos respectivos índices, em negócios como o entabulado pelas partes e no período de vigência do respectivo contrato, resta descabido a alegação de juros praticados pela instituição financeira ré acima da média de mercado. Outrossim, não se aplica ao caso a limitação das taxas de juros prevista no Decreto nº 22.623/33 e na Lei nº 1.521/51 – Partes que tinham liberdade para contratarem a taxa de juros que melhor espelhava a relação de crédito. Recurso desprovido nessa parte. REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. FINANCIAMEMTNO DE VEÍCULO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA CONTRA A CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. DESCABIMENTO. A capitalização de juros, na hipótese, é permitida pela Lei nº 10.931/2004. E não há que se falar na inconstitucionalidade da MP 2.170-36/2001, que continua em vigor por força do art. 2º da EC nº 32, de 11/9/2001. Recurso desprovido nessa parte.” (TJSP, AC nº 1022060-53.2014.8.26.0100, 11ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Walter Fonseca, julgado em 10.08.2017). (Grifado)

 

Mas, então não há como revisar um contrato de financiamento? Claro que há possibilidade de revisão! No contrato de financiamento – que sempre é de adesão, isto é, com cláusulas pré-definidas pela instituição financeira – pode conter cláusulas que determinem taxa de juros muito acima do mercado, tarifas e/ou custos indevidos ou cumulativos e que podem tornar tais cláusulas anuláveis mediante a ação de revisão contratual. 

Entretanto, para que a ação revisional de financiamento possa ser ajuizada e tenha realmente um sentido prático para o consumidor, é fundamental que o advogado analise o contrato para verificar se:

 

a) há alguma ilegalidade neste;

b) qual o provável retorno financeiro que o ajuizamento de tal ação trará em caso de êxito, devendo entrar no cálculo as despesas que o consumidor terá com o processo (custas processuais e honorários advocatícios).


Portanto, tendo em vista que as ações revisionais não são (e não podem ser) a “tábua de salvação” para resolver o endividamento de famílias, já que o êxito não é garantido ou o retorno financeiro pode ser baixo e praticamente não fazer diferença em razão do montante da dívida contratada, é fundamental que o consumidor avalie com extremo cuidado antes de contratar um empréstimo e veja se o compromisso assumido caberá, com boa margem de segurança para que possa incluir qualquer outra despesa até então não prevista, dentro de seu orçamento, pois uma vez inadimplente, as consequências são absolutamente sérias e duradouras. Na dúvida, se não for urgente, não tome o empréstimo.

 

 Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

alexandre_luso@yahoo.com.br




[1] https://www.bcb.gov.br/estatisticas/txjuros


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