25 de junho de 2023

ALGUNS ASPECTOS SOBRE O BOLETIM DE OCORRÊNCIA POLICIAL


 

Alexandre Luso de Carvalho 

 

Em muitas situações da vida em sociedade, quando ocorrem problemas nas relações entre particulares (interpessoais ou entre pessoas físicas e jurídicas), nas relações de consumo e nas relações entre pessoas ou empresas para com o Estado (município, estados e União), uma das primeiras providências que uma das partes pensa em fazer é uma ocorrência policial ou boletim de ocorrência (o famoso B.O) junto à policial civil, seja online ou de forma presencial. 

Todavia, tal procedimento, vale destacar, não consiste, por si só, na garantia de que o problema de quem registra um determinado fato será resolvido ou que, em possível ação judicial essa pessoa terá alguma vantagem probatória para uma vitória no processo. Isso porque:

 

a) a ocorrência policial é um documento de narrativa unilateral, isto é, consta somente a versão do comunicante (de quem faz o registro) e, portanto, não significa que os fatos narrados são verdadeiros ou que possam ser provados;

 

b) nem todo o fato que é comunicado no boletim de ocorrência consiste em crime ou qualquer outra ilicitude, ou seja, por vezes constará “fato atípico”.

 

Com isso, os boletins de ocorrência devem estar acompanhados das provas dos fatos (documentais ou testemunhais) a serem apresentadas no momento da comunicação ou posteriormente (não muito depois) para que se instaure o devido inquérito para que, então, a autoridade policial verifique se houve cometimento de crime para enviar ou não tal inquérito ao Poder Judiciário. 

Importante frisar que os aspectos ditos acima, apresentam algumas exceções. Dentre elas, podem ser mencionadas:

 

a) nos casos de violência doméstica: seja contra a mulher (regida pela Lei Maria da Penha[1]), seja contra o idoso (regido pelo Estatuto do Idoso[2]) ou contra o menor (regido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente[3]), o que se busca é a proteção imediata da vítima em razão da notícia do risco de agressão ou deste já ter ocorrido, levando a autoridade policial e judicial a prescindirem, num primeiro momento, da prova do ilícito para que sejam tomadas medidas de proteção. Saliento que num segundo momento, em respeito ao contraditório e à ampla defesa, provas deverão ser coletadas e a pessoa a quem se atribui a agressão ou ameaça será ouvida, podendo esta, também, produzir provas em sua defesa;

 

b) nos casos de perda de objetos, documentos e cartões bancários: nessas situações não há necessidade de provas, até porque seria impossível. E fazer a ocorrência policial é fundamental para bloquear cartões bancários, bem como prevenir-se que os documentos sejam indevidamente utilizados e, também, permitir que a segunda via destes sejam providenciadas;

 

c) nos casos de desaparecimento de pessoas: não é necessário qualquer tipo de prova, num primeiro momento, até para que se inicie de pronto a investigação acerca dos últimos locais em que a pessoa desaparecida esteve ou passou;

 

Para fins de ações penais privadas (crimes contra a honra) e casos de natureza civil ou de família, a ocorrência policial toma um caráter secundário, pode se dizer, ou seja, é um documento com caráter quase que informativo, tendo em vista que há necessidade de impulsionamento da pessoa prejudicada perante o Poder Judiciário, além da produção de provas. 

Por fim, cumpre deixar claro é que não se está desestimulando as pessoas que busquem a polícia para realizar o boletim de ocorrência sobre determinado fato. O que se está dizendo é que muitas vezes, para a finalidade que elas esperam não haverá resultado prático; e para a finalidade para a qual a ocorrência é o primeiro passo, em muitos casos, a informação contida nela não basta para o que se busca, sendo necessária a produção de provas, sendo algumas buscadas pela investigação policial e outras fornecidas pela vítima, seus familiares e amigos. 

 

Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

alexandre_luso@yahoo.com.br






[1] Lei nº 11.340/2006

[2] Lei nº 10.741/2003

[3] Lei nº 8.069/1990


17 de junho de 2023

O PROJETO DE LEI DA IGUALDADE SALARIAL ENTRE MULHERES E HOMENS (Postagem antecipada)


 

Alexandre Luso de Carvalho

 

Foi enviado ao Parlamento, pela Presidência da República, em 13.03.2023, o Projeto de Lei nº 1.085/2023 que (sic) dispõe sobre a igualdade salarial e remuneratória entre mulheres e homens para o exercício de mesma função e altera a Consolidação das Leis do Trabalho” (Decreto-Lei nº 5.452/1943). 

Após a tramitação na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, o texto final do referido Projeto de Lei foi aprovado com a seguinte redação:

 

Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a igualdade salarial e de critérios remuneratórios, nos termos da regulamentação, entre mulheres e homens para a realização de trabalho de igual valor ou no exercício da mesma função e altera a Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. 

Art. 2º A igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens para o exercício de mesma função é obrigatória e será garantida nos termos do disposto nesta Lei. 

Art. 3º A Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1943, passa a vigorar com as seguintes alterações:

  

 

Texto atual

 

Texto alterado pelo Projeto de Lei nº 1.085/2023

 

 

Art. 461.  Sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, no mesmo estabelecimento empresarial, corresponderá igual salário, sem distinção de sexo, etnia, nacionalidade ou idade.

 

 

Art. 461.  Sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, no mesmo estabelecimento empresarial, corresponderá igual salário, sem distinção de sexo, etnia, nacionalidade ou idade.

 

§ 6o  No caso de comprovada discriminação por motivo de sexo ou etnia, o juízo determinará, além do pagamento das diferenças salariais devidas, multa, em favor do empregado discriminado, no valor de 50% (cinquenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.

 

§ 6º Na hipótese de discriminação comprovada por motivo de gênero, raça ou etnia, além do pagamento das diferenças salariais devidas, o juízo determinará o pagamento de multa cujo valor equivalerá ao décuplo do maior salário pago pelo empregador, elevado em cem por cento em caso de reincidência.

 

 

§ 7º. Não há.

 

§ 7º Presume-se comprovada a discriminação, na hipótese de identificação de desigualdade salarial injustificada entre mulheres e homens, verificada em relatório de transparência salarial e remuneratória elaborado pelo empregador.

 

 

§ 8º. Não há.

 

§ 8º Na hipótese prevista no § 6º, o pagamento das diferenças salariais e da multa não afasta a possibilidade de indenização por danos morais à empregada, consideradas as especificidades do caso concreto.”

 

Art. 659. Competem privativamente aos Presidentes das Juntas, além das que lhes forem conferidas neste Título e das decorrentes de seu cargo, as seguintes atribuições:

 

 

Art. 659. Competem privativamente aos Presidentes das Juntas, além das que lhes forem conferidas neste Título e das decorrentes de seu cargo, as seguintes atribuições:

 

XI – Não há.

 

XI - conceder medida liminar, até decisão final do processo, em reclamações trabalhistas que visem à imediata equiparação salarial e remuneratória entre mulheres e homens, uma vez comprovada a discriminação nos termos do disposto no art. 461. desta Consolidação das Leis do Trabalho.

 

 

Art. 4º A igualdade salarial e remuneratória entre mulheres e homens será garantida por meio das seguintes medidas: 

I - estabelecimento de mecanismos de transparência salarial e de critérios remuneratórios; 

II - incremento da fiscalização contra a discriminação salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens; 

III - aplicação de sanções administrativas em caso de desigualdade ou discriminação salarial e remuneratória entre mulheres e homens; e 

IV - facilitação de meios processuais para a garantia da igualdade salarial e remuneratória entre mulheres e homens. 

Art. 5º Fica determinada a publicação de relatórios de transparência salarial e de critérios remuneratórios pelas pessoas jurídicas de direito privado com vinte ou mais empregados. 

§ 1º Ato do Ministro de Estado do Trabalho e Emprego regulamentará o disposto neste artigo. 

§ 2º Os relatórios de transparência salarial e de critérios remuneratórios conterão dados e informações que permitam a comparação objetiva entre salários e remunerações recebidos por mulheres e homens, observada a legislação de proteção de dados pessoais. 

§ 3º Nas hipóteses em que for identificada desigualdade na análise comparativa entre o conjunto de mulheres e o conjunto de homens indicados no relatório de transparência salarial e de critérios remuneratórios, a pessoa jurídica de direito privado apresentará e implementará plano de ação para mitigar a desigualdade, com metas e prazos, garantida a participação de representantes das entidades sindicais e de representantes das trabalhadoras e dos trabalhadores nos locais de trabalho. 

§ 4º Na hipótese de descumprimento do disposto nos § 2º e § 3º, será aplicada multa administrativa cujo valor equivalerá ao quíntuplo do maior salário pago pelo empregador, elevado em cinquenta por cento em caso de reincidência, sem prejuízo das sanções aplicáveis aos casos de discriminação salarial e remuneratória entre mulheres e homens. 

Art. 6º Ato do Ministro de Estado do Trabalho e Emprego instituirá protocolo de fiscalização contra a discriminação salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens. 

Art. 7º Fica revogado o art. 1º da Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017, na parte em que altera o § 6º do art. 461 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1943. 

Art. 8º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

 

Conforme verifica-se pelo texto do Projeto de Lei, que ainda aguarda sanção (aprovação) ou veto presidencial, o novo dispositivo legal necessitará de adequações no Ministério do Trabalho para a implementação da fiscalização, das punições e na Justiça do Trabalho para uma mudança no processo trabalhista quando houver o tema igualdade salarial entre homens e mulheres. 

Entretanto, apesar do tempo de implementação que levará até que efetivamente vejamos os resultados práticos dessa lei que será sancionada, há de se celebrar essa novidade legal, que vem a ser mais um instrumento na imprescindível igualdade entre homens e mulheres, já estabelecida na Constituição Federal de 1988 (artigo 5º, inciso I[1]). 

 

Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

alexandre_luso@yahoo.com.br




[1] Constituição Federal, Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;