26 de maio de 2024

O PODER PÚBLICO FALHOU NAS ENCHENTES DO RIO GRANDE DO SUL?



Alexandre Luso de Carvalho 

 

Muitas pessoas têm questionado se o Poder Público falhou em relação às enchentes no Rio Grande do Sul e até que ponto há possibilidade de serem pleiteadas indenizações por danos materiais e morais. 

Sobre a possibilidade de responsabilização do Poder Público, tenho respondido que deve haver cautela, pois são necessárias uma série de verificações:

 

a)  Questões macropolíticas de proteção ambiental: como vêm se dando as políticas da União, estados e municípios quanto à proteção e fiscalização ambiental e ocupação de áreas ribeirinhas e dos aspectos que influenciaram ou foram determinantes para que as consequências das enchentes atingissem essa proporção. Exemplo: até que ponto a ineficiência da legislação federal e da fiscalização ambiental realizada pela União (fiscalização que foi propositalmente muito enfraquecido no Governo Bolsonaro), bem como a flexibilização das leis ambientais do Estado, no Governo Eduardo Leite, e de cada município tiveram influência direta ou indireta nos danos causado à população;

 

b)  Questões de infraestrutura pública para proteger as cidades e as populações das cheias: aqui se vê uma questão até mais imediata em relação às cheias. Exemplo disso vemos em Porto Alegre, quando ficou claro que os diques, bombas, dentre outros equipamentos não se mostraram eficientes para impedir ou minimizar ao máximo que as águas do lago Guaíba invadissem a cidade, ou seja, nesse caso, há de se fazer uma série de perguntas iniciais: b.1. o projeto original era suficiente para proteger de tamanho volume de cheia? b.2. a manutenção das comportas e bombas estava em dia? b.3. houve aviso antecipado de que o sistema apresentava falhas? b.4. o que Poder Público Municipal fez para corrigir essas falhas e melhorar o sistema a partir dessa ciência de falhas no sistema de proteção? b.5. havia tempo hábil para correções, tendo em vista a burocracia da Administração Pública (que é imposta pela legislação)?

 

c)   A resposta do Poder Público ao evento: se a resposta ocorreu dentro de um prazo considerável, no mínimo, razoável e de modo eficiente ao resgate de pessoas, animais e reestabelecimento da infraestrutura pública à propiciar o recomeço da rotina das cidades. 

 

A partir do momento em que tais questões esclarecidas é que se pode verificar se as consequências das chuvas sobre as populações  podem ter como responsáveis, ao menos em parte, a União e/ou do Estado e/ou do Município, pelo fato de não tomarem as medidas de prevenção as quais eram obrigadas a fazer. 

Com isso, havendo essa responsabilidade, partimos para um segundo momento: provar o dano, isto é, demonstrar o quanto se perdeu, o quanto se deixou de ganhar, além, é claro, de todo o sofrimento – que neste caso, pode-se entender como presumido a partir da demonstração do que se passou. 

Assim, havendo a prova da responsabilidade, mesmo que parcial, dos entes públicos pelas consequências das chuvas e a prova do dano, é possível a promoção de ações de caráter indenizatório, tendo em vista a teoria do risco administrativo, contemplado no parágrafo 6º do artigo 37 da Constituição Federal: “As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.” 

Com isso, para finalizar, vale destacar que mesmo havendo grande comoção nacional e revolta com o que está acometendo as populações atingidas,  há de se ter um olhar técnico e pragmático sob o ponto de vista jurídico acerca dos requisitos processuais, evitando, o que é muito importante nesse momento, qualquer ato de precipitação no ajuizamento de ações contra o Poder Público.

 

 

Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808


alexandre_luso@yahoo.com.br


Fonte da imagem


 

2 comentários:

  1. Muito obrigado Dr.Alexandre! Matéria elucidativa e pontuada.

    ResponderExcluir
  2. Anônimo5/26/2024

    Boa noite! Obrigada Alexandre Luso!

    ResponderExcluir