Alexandre Luso de Carvalho
Na mesma medida em que o acesso ao crédito e às compras parceladas aumentou, também cresceram os serviços de cobrança realizados diretamente pelas empresas credoras e por empresas terceirizadas. Até aí nenhum problema. Ocorre que a maioria (senão a totalidade) desses serviços e empresas de cobrança utilizam métodos abusivos na abordagem aos devedores, seja por meio de cartas, e-mails e SMS, seja por meio de ligações telefônicas.
Dentre os meios de cobranças, as que ocorrem via ligações telefônicas onde vemos os maiores abusos, uma vez que um devedor, por exemplo, pode receber dezenas de ligações por dia, nos sete dias da semana e a qualquer horário; ou em vários casos a pessoa que recebe a ligação nem sequer é a devedora. Essa abusividade, importante ressaltar, é proibida pelo Código de Defesa do Consumidor, conforme vê-se abaixo:
Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem
por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua
dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a
melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das
relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:
(...)
VI - coibição e repressão eficientes de todos os abusos
praticados no mercado de consumo, inclusive a concorrência desleal e utilização
indevida de inventos e criações industriais das marcas e nomes comerciais e
signos distintivos, que possam causar prejuízos aos consumidores;
(...)
Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor
inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de
constrangimento ou ameaça.
(...)
Art. 71. Utilizar, na cobrança de dívidas, de ameaça,
coação, constrangimento físico ou moral, afirmações falsas incorretas ou
enganosas ou de qualquer outro procedimento que exponha o consumidor,
injustificadamente, a ridículo ou interfira com seu trabalho, descanso ou
lazer:
Pena – Detenção de três meses a um ano e multa.
Todavia, apesar do que estabelece o Código de Defesa do Consumidor, as práticas abusivas na cobrança de dívidas continuam a abarrotar os PROCONs e o Poder Judiciário. Em razão disso, nessa semana (03.11.2022) a ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicações) aprovou o uso do código 0304 antes do número do telefone, identificando as chamadas de serviços de cobrança. Assim, o devedor poderá decidir se atende ou não a ligação, uma vez que saberá sobre o que se trata.
No entanto, vale destacar que a “Anatel realizará consulta pública, durante 60 dias, para regulamentar o procedimento operacional e após a publicação de ato pela Agência as empresas terão 180 dias para implementar a medida”, conforme consta em nota à imprensa. Ou seja, o consumidor ainda aguardará 240 dias para ter essa medida entrando em vigor.
Apesar
desse importante instrumento que será proporcionado ao consumidor, nunca se pode
deixar de ter em mente dois fatos:
a)
é direito dos credores
cobrar (sem abusividade) e, portanto, esses serviços continuarão;
b) a abusividade na cobrança não desaparecerá. Só será atenuada, pois as empresas provavelmente já estão buscando outras maneiras de “infernizar” a
vida dos devedores.
Com isso, é fundamental que o consumidor sempre que necessário
continue a buscar o PROCON e/ou o Poder Judiciário para proteger-se dessas abusividades.
Entretanto, para ter êxito nessa busca pela proteção legal é essencial:
a)
fazer a captura da tela do
celular (screenshot) com as mensagens
de SMS e WhatsApp enviados e/ou números da empresa que ligou, em todas as vezes que isso ocorrer;
b) anotar o nome da empresa de cobrança, da empresa credora, os
números de protocolos de ligações de reclamações que o consumidor fizer para essas empresas, anotando, também, a data e horário.
Assim, tendo consciência de que não pode ser objeto de abusividade na cobrança de dívida e coletando as provas de que isso acontece, o consumidor devedor poderá restabelecer, ao menos, um mínimo de tranquilidade em sua vida buscando tanto o PROCON como o Poder Judiciário para que as empresas cessem o abuso e, dependendo de cada caso, até indenizem quem está sendo perturbado pela avalanche de ligações.
Alexandre
Luso de Carvalho
OAB/RS
nº 44.808
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