30 de junho de 2024

A SEGURANÇA E A RESPONSABILIDADE DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO EM CASOS DE MAUS TRATOS AOS ALUNOS



Alexandre Luso de Carvalho 

 

I – Introdução 

 

A matrícula de um filho, seja de educação infantil, fundamental, médio e superior, sempre inicia, em resumo, pelas seguintes preocupações: a) reputação acerca da qualidade de ensino; b) estrutura física; c) valor da mensalidade; d) proximidade da residência; e) segurança (externa e interna).

 

II – Dos Fatores de Segurança

 

Acerca do requisito “segurança”, que é tão importante quanto todos os outros – e que se falhar gera uma série de consequências à toda comunidade escolar (alunos, familiares, professores e a própria instituição de ensino) – há de se observar os seguintes fatores:

 

a)  Externo: visa propiciar o máximo possível de proteção contra agentes externos. Muitas vezes é o mais visível aos olhos da comunidade escolar, sendo também, um atrativo aos pais, e diz respeito a: 

a.1. estrutura física e tecnológica da instituição e ensino; 

a.2. efetivo humano especializado para tal; 

a.3. protocolos de segurança para potencializar toda a estrutura de segurança;

 

b)  Interno: visa propiciar a máxima segurança em relação à interação diária entre alunos, professores e funcionários, abrangendo: 

b.1. estrutura física e tecnológica, no sentido de cumprir suas finalidades (vigiar e obter provas de ilícitos), se mostrando presente, mas não interferir ou causar desconforto nas relações interpessoais; 

b.2. escolha criteriosa, precedida de minuciosa pesquisa, dentro dos limites legais, do corpo de funcionários a ser contratado; 

b.3. treinamento específico de professores, monitores e demais funcionários para lidarem e agirem sempre visando proteger os alunos em sua integridade física e psicológica de qualquer espécie de agressão – feitas por crianças, adolescentes e adultos –, o que inclui o bullyng; 

b.4. constantes ações preventivas contra maus tratos aos alunos, seja por meio de campanhas educativas ou ações de vigilância ostensiva, sempre respeitando os limites legais; 

b.5. ações reativas contundentes, por parte das direções das instituições de ensino, quando se descobre qualquer espécie de maus tratos aos alunos. Saliente-se: a pior atitude possível que uma escola ou faculdade pode tomar é “varrer a sujeira para baixo do tapete”, ou seja, não agindo ou agindo parcialmente, isto é, resolvendo o problema somente no âmbito interno, deixando de levar o caso às esferas policial e judicial.

 

Portanto, esses são alguns dos fatores de segurança imprescindíveis no sentido de resguardar a segurança dos alunos – que é o principal –, bem como tornar mais difícil qualquer evento que venha a acarretar a responsabilidade civil das instituições de ensino. E jamais devem ser ignorados em detrimento de outros aspectos mais sedutores da escola ou universidade.

 

III – Da Responsabilidade Civil

 

A responsabilidade civil de qualquer instituição de ensino (pública ou particular) é evidente em casos de maus tratos aos alunos, seja em razão de atos realizados por professores e funcionários, seja por atos realizados por outros alunos; e é determinada a partir das seguintes legislações:

 

a)  Código Civil (de forma geral, isto é, para alunos menores – crianças e adolescentes – como para alunos maiores):


Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

 

b)  Estatuto da Criança e do Adolescente (específico para o público infantil e adolescente):

 

Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais. 

Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor. 

Art. 18-A. A criança e o adolescente têm o direito de ser educados e cuidados sem o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante, como formas de correção, disciplina, educação ou qualquer outro pretexto, pelos pais, pelos integrantes da família ampliada, pelos responsáveis, pelos agentes públicos executores de medidas socioeducativas ou por qualquer pessoa encarregada de cuidar deles, tratá-los, educá-los ou protegê-los. 

Parágrafo único.  Para os fins desta Lei, considera-se: 

I - castigo físico: ação de natureza disciplinar ou punitiva aplicada com o uso da força física sobre a criança ou o adolescente que resulte em:

a)   sofrimento físico; ou

b)   lesão; 

II - tratamento cruel ou degradante: conduta ou forma cruel de tratamento em relação à criança ou ao adolescente que:

a)   humilhe; ou

b)   ameace gravemente; ou

c)   ridicularize 

 

c)   Código de Defesa do Consumidor (para os alunos matriculados em instituições particulares): 

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

 

Com isso, quando as medidas de segurança externas e internas, que são obrigações de todas as instituições de ensino, demonstram falhas que não poderiam ocorrer, tanto em sua prevenção, como em sua reação, há responsabilidade civil e dever de indenizar, conforme amplo entendimento dos tribunais:

 

APELAÇÃO CÍVEL. CONSUMIDOR. CONSTRANGIMENTO DE ALUNO DE 3 ANOS DE IDADE FEITO POR DUAS PROFESSORAS EM SALA DE AULA. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. REDUÇÃO DO QUANTUM. CABIMENTO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. No caso, duas professoras constrangeram o menor de 3 (três) anos depois que este urinou na roupa, ficando exposto aos demais colegas enquanto as docentes zombavam da situação. 2. O valor da indenização deve ser fixado considerando-se a lesão sofrida e o caráter pedagógico e punitivo da medida (binômio reparação/reprimenda), ponderando-se a proporcionalidade e a razoabilidade. Reduzida a condenação da empresa ré ao pagamento de R$ 25.000,00 (vinte cinco mil reais) a título de danos morais. 3. Recurso conhecido e parcialmente provido. Sentença reformada somente para reduzir a indenização por dano moral de R$ 45.000,00 para R$ 25.000,00. (TJDF, AC nº 0701535-37.2017.8.07.0007, 5ª Turma Cível, Rel. Robson Barbosa De Azevedo, julgado em 09.10.2019). (Grifado)

 

RECURSO INOMINADO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRETENSÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. BULLYING ESCOLAR. Parte autora que desenvolveu fobia de chuva após tempestade ocorrida durante o período letivo na escola. Piora do quadro clínico após comentários depreciativos por parte dos colegas. Inexistência de prova de que as professoras do reclamante tenham se referido a ele como “bebê chorão”. Comentários que partiram dos demais alunos. Instituição de ensino que não tomou todas as providências para combater a prática do bullying. Alunos praticantes que não foram devidamente repreendidos. Evasão escolar do reclamante. Dever de indenizar. Inação da instituição de ensino que implica aderência da escola à prática de bullying. Danos morais arbitrados em R$ 10.000,00, em consonância com precedente do TJPR. Recurso conhecido e provido. (TJPR, RI nº 0018818-29.2017.8.16.0019, 4ª Turma Recursal, Rel. Juíza Manuela Tallão Benke, julgado em 16.09.2019). (Grifado)

 

IV – Conclusão

 

Assim, a partir dessas considerações, é fundamental que todas as partes envolvidas nas relações estudantis (alunos, familiares e instituições de ensino) fiquem absolutamente atentas ao aspecto “segurança” (externa e interna), no sentido de evitar ao máximo qualquer episódio de maus tratos, pois, sob o ponto de vista do aluno, é um trauma que dinheiro não paga; e sob o ponto de vista da instituição, a condenação gerará um custo desnecessário e, principalmente, um abalo à sua reputação, algo que o dinheiro, também, não paga. 

 

Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

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16 de junho de 2024

COMO FICAM OS ANIMAIS NA SEPARAÇÃO DO CASAL


Alexandre Luso de Carvalho 

 

I – Introdução 

 

Quando um casal se divorcia ou dissolve a união estável, um dos aspectos que atualmente tem feito parte, tanto nos processos judiciais como nos procedimentos extrajudiciais, é a situação dos animais de estimação, isto é, com quem estes permanecerão e como se dará o custeio de suas despesas. 

Tais questionamentos são decorrentes da evolução nas relações afetivas entre humanos e animais de estimação, que passaram a ser encarados como membros da família – o que de fato são – e não mais meros animais domésticos, meras propriedades (bens semoventes, conforme estabelece o artigo 82 do Código Civil[1]).

 

II – Da Guarda Compartilhada

 

Nos últimos anos o Poder Judiciário tem decidido, quando solicitado, tanto acerca da possibilidade da guarda (ou tutela) compartilhada dos animais e todas as responsabilidades inerentes a tal condição, conforme pode ser visto abaixo, a título exemplificativo:

 

"APELAÇÃO CÍVEL - DIVÓRCIO C/C PARTILHA - PARTILHA DE BENS ADQUIRIDOS NA CONSTÂNCIA DO CASAMENTO - NECESSIDADE - PARTILHA DE BENS MÓVEIS DA RESIDÊNCIA - PROPRIEDADE - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO - GUARDA COMPARTILHADA DE CÃES - POSSIBILIDADE - O art. 1.658, do Código Civil prevê que, se tratando de comunhão parcial de bens, necessária a partilha de bens adquiridos na constância da relação conjugal - Os bens eventuais bens que guarnecem a residência em que o casal residia devem ser partilhados, desde que comprovadas suas existência e propriedade - Quanto aos animais de estimação, retrocesso entender que são meros bens materiais ou semoventes. Nos dias atuais, os animais de estimação são considerados membros integrantes da família (família multiespécie) - Certo que, no caso dos autos, denota-se que, antes do casamento, o 1º apelado já detinha de um cachorro, com o advento de outros cães, estes integram de forma social ao cão já existente, sendo cruel a separação dos animais - Ainda, como dito, há uma interação pessoal significativa, dos animais de estimação com os humanos. Assim, no caso dos autos, não há que se falar em partilha, não sendo meros objetos, e sim assegurar a guarda compartilhada ao 1ª apelante." (TJMG, AC nº 10000220328439001, 8ª Câmara Cível Especializada, Rel. Des. Carlos Roberto de Faria, julgado em 02/12/2022). (Grifado)

 

Assim, no que tange à tutela compartilhada dos animais vemos que o entendimento jurisprudencial está em acordo com a evolução do comportamento social e até a legislação de proteção que tem se mostrado mais evoluída, tanto que está em tramitação na Câmara do Deputados, o Projeto de Lei nº 1.806/2023, de autoria do Deputado Alberto Fraga (PL/DF), no sentido de alterar dispositivo do Código Civil para “(...) disciplinar o tratamento dos animais domésticos quando da dissolução da sociedade conjugal, e dá outras providências[2].

 

III – Da Divisão das Despesas

 

No que diz respeito à divisão de despesas dos custos dos animais, apesar de o entendimento ser cada vez maior de que os animais de estimação fazem parte da família, quando o tema é “DESPESAS”, o Poder Judiciário ainda se posiciona de forma mais conservadora – antiquada, diria –, observando o modo como o Código Civil ainda encara os animais de estimação: uma “propriedade”. 

Com isso, quanto a tal tema, ainda há certa divisão nos Tribunais do País, havendo entendimentos de que:

 

a) se há guarda compartilhada do animal, há o dever de divisão despesas, já que se trata de uma “copropriedade” (pela visão do Código Civil) ou de uma tutela compartilhada (pela visão mais avançada);

 

b) se não há divisão de guarda (ou “propriedade”), ou seja, se o animal ficar com um só dos cônjuges, não existe o dever de dividir as despesas.

 

Entretanto, se as partes entrarem em acordo (extrajudicial ou judicial) no sentido de ambos arcarem com as despesas do animal de estimação, mesmo que um só fique com a tutela do animal, tal acordo necessita ser cumprido.

 

IV – Conclusão

 

Para finalizar, o que se vê nesse tema é um exemplo de como a modificação – no caso específico, uma benéfica evolução – do comportamento social acarreta, também, na mudança das decisões do Poder Judiciário e que numa espécie de “efeito dominó” acaba em modificação legislativa (revogação, modificação ou criação de leis). 

Com isso, o que se espera sobre o destino dos animais de estimação quando dos divórcios e dissoluções de uniões estáveis, é que esses não fiquem só nas mãos do bom senso dos cônjuges ou do entendimento (sempre variável) do Poder Judiciário, mas que mudem de status legal, a partir da aprovação do Projeto de Lei nº 1.806/2023 pelo Congresso Nacional, não mais sendo considerados “propriedades”. 

 

Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

alexandre_luso@yahoo.com.br


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[1] Código Civil, Art. 82. São móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social.

2] Fonte: Câmara dos Deputados (https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2355801)


 

26 de maio de 2024

O PODER PÚBLICO FALHOU NAS ENCHENTES DO RIO GRANDE DO SUL?



Alexandre Luso de Carvalho 

 

Muitas pessoas têm questionado se o Poder Público falhou em relação às enchentes no Rio Grande do Sul e até que ponto há possibilidade de serem pleiteadas indenizações por danos materiais e morais. 

Sobre a possibilidade de responsabilização do Poder Público, tenho respondido que deve haver cautela, pois são necessárias uma série de verificações:

 

a)  Questões macropolíticas de proteção ambiental: como vêm se dando as políticas da União, estados e municípios quanto à proteção e fiscalização ambiental e ocupação de áreas ribeirinhas e dos aspectos que influenciaram ou foram determinantes para que as consequências das enchentes atingissem essa proporção. Exemplo: até que ponto a ineficiência da legislação federal e da fiscalização ambiental realizada pela União (fiscalização que foi propositalmente muito enfraquecido no Governo Bolsonaro), bem como a flexibilização das leis ambientais do Estado, no Governo Eduardo Leite, e de cada município tiveram influência direta ou indireta nos danos causado à população;

 

b)  Questões de infraestrutura pública para proteger as cidades e as populações das cheias: aqui se vê uma questão até mais imediata em relação às cheias. Exemplo disso vemos em Porto Alegre, quando ficou claro que os diques, bombas, dentre outros equipamentos não se mostraram eficientes para impedir ou minimizar ao máximo que as águas do lago Guaíba invadissem a cidade, ou seja, nesse caso, há de se fazer uma série de perguntas iniciais: b.1. o projeto original era suficiente para proteger de tamanho volume de cheia? b.2. a manutenção das comportas e bombas estava em dia? b.3. houve aviso antecipado de que o sistema apresentava falhas? b.4. o que Poder Público Municipal fez para corrigir essas falhas e melhorar o sistema a partir dessa ciência de falhas no sistema de proteção? b.5. havia tempo hábil para correções, tendo em vista a burocracia da Administração Pública (que é imposta pela legislação)?

 

c)   A resposta do Poder Público ao evento: se a resposta ocorreu dentro de um prazo considerável, no mínimo, razoável e de modo eficiente ao resgate de pessoas, animais e reestabelecimento da infraestrutura pública à propiciar o recomeço da rotina das cidades. 

 

A partir do momento em que tais questões esclarecidas é que se pode verificar se as consequências das chuvas sobre as populações  podem ter como responsáveis, ao menos em parte, a União e/ou do Estado e/ou do Município, pelo fato de não tomarem as medidas de prevenção as quais eram obrigadas a fazer. 

Com isso, havendo essa responsabilidade, partimos para um segundo momento: provar o dano, isto é, demonstrar o quanto se perdeu, o quanto se deixou de ganhar, além, é claro, de todo o sofrimento – que neste caso, pode-se entender como presumido a partir da demonstração do que se passou. 

Assim, havendo a prova da responsabilidade, mesmo que parcial, dos entes públicos pelas consequências das chuvas e a prova do dano, é possível a promoção de ações de caráter indenizatório, tendo em vista a teoria do risco administrativo, contemplado no parágrafo 6º do artigo 37 da Constituição Federal: “As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.” 

Com isso, para finalizar, vale destacar que mesmo havendo grande comoção nacional e revolta com o que está acometendo as populações atingidas,  há de se ter um olhar técnico e pragmático sob o ponto de vista jurídico acerca dos requisitos processuais, evitando, o que é muito importante nesse momento, qualquer ato de precipitação no ajuizamento de ações contra o Poder Público.

 

 

Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808


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19 de maio de 2024

MEDIDAS DO PODER PÚBLICO PARA AUXILIAR OS ATINGIDOS PELAS ENCHENTES NO RS



Alexandre Luso de Carvalho


I - INTRODUÇÃO

 

A partir do momento em que a tragédia climática se abateu sobre o Rio Grande do Sul, vimos a comovente e imediata mobilização das forças públicas (municipais, estadual e federal, bem como pelo inestimável voluntariado. 

Importante frisar que concomitantemente aos resgates, acolhimento das vítimas, distribuição de roupas e alimentos, várias outras medidas foram tomadas pelos governos (federal, estadual e municipais) para auxiliar a população gaúcha, conforme amplamente divulgado pelos meios de comunicação. Ocorre, que apesar da divulgação feita pela imprensa: a) os fatos ocorrem numa velocidade assustadora que as vítimas do desastre acabam por não saber ou esquecer do que lhes está sendo propiciado; b) a reiterada proliferação das criminosas Fake News, geralmente lançadas pelos que têm algum intuito político e/ou por seus apoiadores. 

Assim, no sentido de auxiliar a se ter uma informação unificada – até o momento – vale relembrar essas medidas para que o cidadão atingido possa acessar tais benefícios.

 

II – GOVERNOS MUNICIPAIS

 

Em relação aos governos municipais, as medidas que esses tomaram e tomarão dependem de como as cidades foram atingidas e do que solicitaram a partir da decretação do estado de calamidade pública. 

Em relação à PORTO ALEGRE, vale destacar as seguintes medidas iniciais: 

a)  Prorrogação e suspensão de prazos quanto aos tributos municipais[1], conforme transcrito abaixo:


- Prorrogação de vencimentos de tributos: o vencimento do ISS de autônomos (ISS-TP), assim como do IPTU e TCL referentes ao mês de maio, será prorrogado para agosto, oferecendo um período adicional para os contribuintes organizarem suas finanças. 

- Suspensão das ações de negativação e de protesto: não serão enviados registros de inadimplência aos órgãos de proteção ao crédito, e não haverá realização de protesto extrajudicial para os contribuintes que não realizarem pagamento de tributos em maio. 

- Suspensão de ações de cobranças administrativas: também estão suspensas as demais ações de cobrança administrativa e de encaminhamento de dívidas para execução fiscal, salvo risco de prescrição, até 31 de maio de 2024. 

- Suspensão de prazos para reclamações e recursos na Fazenda: os prazos para reclamações e recursos na Fazenda serão suspensos a partir de 30 de abril até 31 de maio de 2024. 

- Prorrogação do prazo de validade da Certidão Negativa de Débitos: a validade das certidões negativas de débitos relativos aos tributos municipais serão prorrogadas. Certidões válidas em 2 de maio de 2024 terão sua validade estendida por 60 dias, e novas certidões terão sua validade temporariamente alterada para 90 dias a partir da data de emissão. 

- Priorização de atendimento de processos de restituições: para agilizar o suporte aos contribuintes, os processos de restituições serão priorizados pela prefeitura. 

- Suspensão de intimações para comparecimento presencial: até 31 de maio de 2024, estão suspensas as intimações para comparecimento presencial, em consonância com as medidas de segurança definidas pelo município.”

 

b)  Atestados expedidos pela Defesa Civil para moradores atingidos pela enchente que não puderam retornar ao trabalho[2]: tal atestado tem o objetivo de justificar a ausência para o abono das faltas para que os trabalhadores não sejam descontados e tampouco despedidos por não comparecerem ao trabalho. O atestado pode ser obtido pelo link https://atestado-defesacivil.portoalegre.rs.gov.br/ ou pelo Whatsapp 156;

c)   Suporte aos desabrigados estabelecido pela Lei Ordinária nº 13.640/2023, que Institui o Programa de Recuperação Emergencial e Auxílio Humanitário destinado à mitigação de danos à população afetada por situações de emergência ou calamidade pública, no Município de Porto Alegre da qual destaco o seguinte:

c.1. auxílio humanitário, pecuniário ou não, e por prazo determinado, aos atingidos social e economicamente pelo desastre que se encontrem em situação de risco e vulnerabilidade, para aquisição de bens de utilidade doméstica e da linha branca, podendo ser, tal benefício, concedidos até o valor de R$3.144,59 por meio de cartão magnético, sendo limitado a um núcleo familiar;

c.2. estadia solidária de natureza pecuniária, e por prazo determinado, aos atingidos social e economicamente cuja situação de desastre tenha atingido sua moradia, comprometendo a habitabilidade. Tal benefício será concedido mediante laudo social e da Defesa Civil, até o valor de R$733,73 por mês e terá caráter temporário de até 3 (três) meses, podendo ser prorrogado 1 (uma) única vez, caso permaneça a situação que deu causa, e observará a sazonalidade e a gravidade. Caso a situação, findado o período de concessão, o beneficiário será automaticamente inserido no benefício do aluguel social, nos termos da Lei Complementar nº 612/2009, e alterações posteriores;

c.3. auxílio à retomada da atividade econômica, pecuniário ou não, e por prazo determinado, aos atingidos social e economicamente cuja situação de desastre tenha impactado o local de sua atividade econômica, ocasionando situação de vulnerabilidade na retomada das atividades econômicas, para aquisição de bens relacionados à atividade econômica do estabelecimento afetado, podendo ser, tal benefício, concedidos até o valor de R$3.144,59 por meio de cartão magnético, sendo que deverão ser observados dois requisitos: c.3.1. a localização em área atingida, reconhecida pela Defesa Civil; c.3.2. a identificação de potencial ou efetivo prejuízo ao exercício ou à manutenção da atividade econômica, reconhecida pela Defesa Civil e por laudo social

d) outras finalidades diretamente vinculadas ao enfrentamento do desastre.

 

III – GOVERNO ESTADUAL

 

Quanto ao Governo do Estado, foram adotadas as seguintes medidas[3]:

 

a) Programa Volta por Cima – o primeiro lote foi pago em 17.05.2024 – para famílias vítimas das chuvas intensas e enchentes no período de 1º de janeiro a 31 de maio de 2024. O benefício foi creditado no Cartão Cidadão de 7.269 famílias de 62 municípios. Foram destinados R$2.500,00, em parcela única, para cada família desabrigada ou desalojada, seguindo os seguintes requisitos:

a.1. ter sido desabrigada ou desalojada em razão de eventos climáticos adversos ocorridos entre 1º de janeiro e 31 de maio de 2024, conforme Decreto Estadual 57.607;

a.2. residir em município com Decreto de Situação de Emergência ou Calamidade Pública homologado pelo governo do Estado;

a.3. ter cadastro incluído pelas equipes de Assistência Social municipais em formulário disponibilizado pelo programa Volta por Cima;

a.4. constar no Cadastro Único (CadÚnico) na condição de pobre ou extremamente pobre, mesmo com a inscrição sendo realizada após os eventos climáticos.

 

b) Pix SOS Rio Grande do Sul: Para atender famílias não contempladas pelo Volta por Cima, o Comitê Gestor dos recursos arrecadados por meio do pix SOS Rio Grande do Sul determinou a distribuição de R$ 2 mil para 428 famílias do Vale do Taquari, totalizando uma distribuição de R$ 856 mil neste primeiro lote. A distribuição priorizou as áreas mais afetadas do Estado que já possuem infraestrutura adequada para iniciar a recuperação e a reconstrução. Nos próximos dias, serão anunciadas novas fases de pagamento, abrangendo outras cidades”;

 

c)   Programa Todo Jovem na Escola: O pagamento da bolsa-auxílio do programa Todo Jovem na Escola de maio foi adiantado, com objetivo de auxiliar os estudantes e suas famílias no momento de dificuldade decorrente das inundações e alagamentos. Ao todo, 83.018 alunos foram contemplados com um repasse de R$ 12,9 milhões”;

 

d)  Isenção da tarifa de saneamento e água: Por meio de acordo entre a Aegea Corsan, Ministério Público e Defensoria Pública do Estado, cerca de 900 mil clientes abastecidos pela companhia, em 90 municípios atingidos pela enchente, ficarão isentos de pagamento da conta por até seis meses”;

 

e)   Gratuidade para emissão de certidões: As pessoas afetadas pela enchente não precisarão pagar pela emissão de 2ª via de certidões de nascimento e casamento. Atualmente, sete pontos realizam o serviço em Porto Alegre, sendo quatro cartórios, um no Instituto Geral de Perícias, no Shopping João Pessoa, outro no Tudo Fácil Zona Norte e um terceiro no Shopping Bourbon Wallig, além do Foro Regional do Partenon”;

 

f)   Negociação de dívidas: O Banrisul anunciou uma repactuação para três parcelas nas operações de crédito pessoal, além de também ter suspendido a cobrança das faturas de maio e junho dos seus cartões de crédito. No crédito imobiliário, clientes com contratos ativos podem também solicitar a suspensão do pagamento de três parcelas, diluindo o valor no prazo restante”;

 

g)   Canal de emergências: Para facilitar o atendimento da população, a Defesa Civil do Estado lançou um novo canal, por meio do Whatsapp[4]para contato com o Centro de Operações de Proteção e Defesa Civil (Codec). Na ferramenta, o cidadão pode informar a necessidade de resgate urgente ou emergências, e de forma automática é realizado o encaminhamento para o órgão de segurança que possa fazer o atendimento. Em casos de risco iminente, o atendimento é passado para um atendente humano, que verifica a demanda e os dados para dar prosseguimento à solicitação”;

 

h)  Apoio ao produtor rural: Uma resolução da Secretaria de Desenvolvimento Rural (SDR) prorrogou por 90 dias o pagamento das parcelas de financiamento do Fundo Estadual de Apoio ao Desenvolvimento dos Pequenos Estabelecimentos Rurais (Feaper). Foram prorrogadas parcelas que vencem em maio, junho e julho de 2024, com aplicação a todos os agricultores beneficiários do fundo.

 

IV – GOVERNO FEDERAL

 

No que tange ao Governo Federal, as ações tomadas até o momento, foram as seguintes:

 

a)  Saque Calamidade do FGTS: O Saque Calamidade permite ao trabalhador sacar até R$ 6.220,00 de cada conta de sua titularidade no FGTS, limitado ao saldo disponível, por motivo de necessidade pessoal, urgente e grave em caso de desastre natural (alagamentos, deslizamentos de terra, fortes chuvas etc.) que tenha atingido sua residência, após declaração oficial da Defesa Civil de seu município. O saque pode ser liberado para cada evento caracterizado como desastre natural, respeitado o intervalo mínimo de 12 meses entre um saque e outro[5]”;

 

b)  Suspensão do Recolhimento do FGTS: pela Portaria nº 729/2024 foi autorizada a suspensão do recolhimento do FGTS pelo empregador do período entre abril a julho, sendo que tais valores poderão ser pagos em quatro (04) parcelas a partir da competência de outubro de 2024. Tal suspensão vale para os municípios em estado de calamidade pública reconhecidos pela Portaria nº 1.377/2024[6];

 

c)   Pagamento de até duas parcelas extras do seguro-desemprego: pela Resolução nº 1.003/2024 do CODEFAT, o Ministro do Trabalho e Emprego foi autorizado a conceder ampliação do benefício do seguro-desemprego aos trabalhadores com domicílio em municípios do Rio Grande do Sul, declarados pelo Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional em situação de calamidade pública e reconhecidos pelo Governo Federal[7];

 

d)  Autorização para agilização de procedimentos para compras públicas diante de calamidades: a Medida Provisória nº 1.21/2024 dispõe sobre “medidas excepcionais para a aquisição de bens e a contratação de obras e de serviços, inclusive de engenharia, destinados ao enfrentamento de impactos decorrentes de estado de calamidade pública[8]”;

 

e)   Auxílio de R$5.100,00 para famílias desabrigadas ou desalojadas: o pagamento, em parcela única, de R$ 5,1 mil para famílias desalojadas ou desabrigadas em municípios com reconhecimentos de estado de calamidade pública ou situação de emergência. A operacionalização do benefício será de responsabilidade do MIDR. O pagamento do dinheiro, limitado a uma pessoa por família, será feito pela Caixa Econômica Federal, por meio de conta poupança social digital, de abertura automática em nome do beneficiário, ou de outra conta, também em nome do beneficiário, na mesma instituição financeira[9]”;

 

f)   Antecipação do pagamento de programas sociais: o Bolsa Família e o Benefício de Prestação Continuada, a prioridade para os gaúchos na restituição do Imposto de Renda e novos aportes no seguro-desemprego (já comentado), bem como linhas especiais de crédito para setores produtivos, totalizando 50 bilhões de reais[10];

 

g)   Crédito Extraordinário de mais de 12,1 bilhões de reais: a Medida Provisória nº 1.218/2024 também contempla medidas já anunciadas referentes a linhas de crédito (FGI, FGO, Pronampe e Pronaf/Pronamp), às medidas de apoio à segurança alimentar (Programa de Aquisição de Alimentos e cestas básicas), abrigamento e parcela extra do SUAS, parcelas extras do seguro desemprego (já comentado), serviços para a saúde primária, especializada e vigilância epidemiológica, assistência farmacêutica e contratação temporária de profissionais e também para a importação de 100 mil toneladas de arroz[11];

 

h)  Suspensão do Pagamento da Dívida do Rio Grande do Sul com a União por três anos: tal medida, aprovada pelo Congresso Nacional – pela Câmara dos Deputados com 404 votos a favor e 2 contra (dos Deputados Elio Biondini, do PL/MG e Stelio Dener, do Republicanos/RR[12]) e pelo Senado, por unanimidade –, liberou 11 bilhões para um fundo para a reconstrução do Estado, bem como 12 bilhões referentes a juros do estoque total da dívida serão perdoados[13];

i) Prorrogação de declaração de imposto de renda e prioridade na restituição: foi prorrogado para 31 de agosto a entrega da declaração do imposto de renda de pessoas físicas e a declaração anual de microempresas, bem como os gaúchos terão prioridade na restituição.

 

V – CONCLUSÃO 

 

Vale destacar que a tendência é que o Poder Público, nas próximas semanas e meses tomem medidas maiores de suporte à população e às empresas, no sentido de incentivar a manutenção de empregos e rendas, além, é claro, do aspecto humanitário. 

Por fim, é fundamental a atenção da população às informações pelos canais oficiais das prefeituras, do Governo do Estado, do Governo Federal, bem como dos órgãos de imprensa, lembrando que as notícias veiculadas em redes sociais devem, sempre, ser checadas, uma vez que há muitas Fake News circulando. 

 

Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808


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[1] Fonte: Prefeitura da Porto Alegre (https://prefeitura.poa.br/smf/noticias/prefeitura-prorroga-vencimentos-de-impostos-e-adota-medidas-em-resposta-enchentes)

[2] Fonte: site Prefeitura da Porto Alegre (https://prefeitura.poa.br/gp/noticias/defesa-civil-de-porto-alegre-emite-atestados-para-moradores-afetados-por-enchentes)

[3] Fontes: Defesa Civil do Rio Grande do Sul (https://www.defesacivil.rs.gov.br/primeiro-lote-de-beneficio-do-volta-por-cima-para-atingidos-pelas-enchentes-e-pago-nesta-sexta-feira-17) e Governo do Estado do Rio Grande do Sul (https://www.rs.gov.br/conheca-as-acoes-do-governo-estadual-que-buscam-dar-auxilio-imediato-as-pessoas-afetadas)

[4] https://api.whatsapp.com/message/2RN2EMU6X6S5B1?autoload=1&app_absent=0

[5] Fonte: https://www.fgts.gov.br/Pages/sou-trabalhador/saque-calamidade.aspx 

[6] Fonte: Diário Oficial da União (https://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?data=15/05/2024&jornal=601&pagina=4&totalArquivos=4) 

[7] Fonte: Diário Oficial da União (https://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?data=15/05/2024&jornal=601&pagina=4&totalArquivos=4) 

[8] Fonte: Diário Oficial da União (https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/medida-provisoria-n-1.221-de-17-de-maio-de-2024-560445831)

[9] Fonte: Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional (https://www.gov.br/mdr/pt-br/noticias/governo-federal-segue-em-trabalho-de-reconstrucao-do-rio-grande-do-sul#:~:text=Ajuda%20para%20reconstru%C3%A7%C3%A3o,p%C3%BAblica%20ou%20situa%C3%A7%C3%A3o%20de%20emerg%C3%AAncia. 

[10] Fonte: Secretaria de Comunicação Social do Governo Federal (https://www.gov.br/secom/pt-br/assuntos/noticias/2024/05/lula-anuncia-nesta-quarta-15-novas-medidas-para-ajudar-a-populacao-e-a-reconstrucao-do-rs) 

[11] Fonte: Secretaria de Comunicação Social do Governo Federal (https://www.gov.br/secom/pt-br/assuntos/noticias/2024/05/lula-anuncia-nesta-quarta-15-novas-medidas-para-ajudar-a-populacao-e-a-reconstrucao-do-rs) 

[12] Fonte: Uol (https://www.google.com/search?q=placar+da+aprova%C3%A7%C3%A3o+da+suspens%C3%A3o+da+d%C3%ADvida+do+rs&oq=placar+da+aprova%C3%A7%C3%A3o+da+suspens%C3%A3o+da+d%C3%ADvida+do+rs&gs_lcrp=EgZjaHJvbWUyBggAEEUYOdIBCjE2MzI2ajBqMTWoAgiwAgE&sourceid=chrome&ie=UTF-8)

 [13] Fonte: Secretaria de Comunicação Social do Governo Federal (https://www.gov.br/secom/pt-br/assuntos/noticias/2024/05/lula-anuncia-nesta-quarta-15-novas-medidas-para-ajudar-a-populacao-e-a-reconstrucao-do-rs)