Alexandre Luso de Carvalho
I - INTRODUÇÃO
Quem está procurando colocação ou recolocação no mercado de trabalho enfrenta alguns problemas muito comuns: pouco experiência, muita idade, pouca qualificação, excesso de qualificação – por incrível que pareça –, distância do emprego pretendido, etc. E isso, faz parte do mercado e da livre escolha de quem contrata.
Todavia,
há uma escolha que se mostra bem mais complicada, uma vez que trafega numa
linha muito tênue entre a livre escolha do empregador e a discriminação: é
quando a escolha ou rejeição ao posto de trabalho estão ligados às características pessoais do candidato.
II – A DIFERENÇA ENTRE A NECESSIDADE
ESPECÍFICA PARA UM CARGO E A DISCRIMINAÇÃO PARA COM O CANDIDATO
Um
aspecto que sempre deve ser observado no processo seletivo de contratação está na diferenciação entre o que é a escolha do candidato para uma
função que exige características específicas e o que é
discriminação. Tomemos como exemplo
a categoria dos comissários de bordo da aviação civil:
a)
O
QUE NÃO É DISCRIMINAÇÃO:
a.1. Quanto às características físicas: escolher um candidato, em razão das dimensões do local em que desempenharão a atividade laboral (aeronave), sendo exigidas aos homens uma altura mínima de 1,65m e máxima de 1,85m; às mulheres uma altura mínima de 1,58m e máxima de 1,80m, bem como não poderem ser obesos, por motivos óbvios;
a.2.
Quanto à apresentação: a exigência de os funcionários estarem sempre alinhados, com o
uniforme da empresa, cabelos presos para mulheres e curtos para homens – já que
lidam com alimentos, também –, uma vez que isso faz parte das normas de postura que o futuro empregador necessita e exige que seus funcionários tenham;
b) O QUE É DISCRIMINAÇÃO: rejeitar contratar
alguém em razão da raça ou etnia, nacionalidade, preferência sexual, religião, gênero (homem ou mulher) condição socioeconômica ou atributos estéticos.
No
caso de discriminação ao candidato à vaga de emprego estar-se-á
desrespeitando o que estabelece a Constituição Federal, em seus artigos 5º,
incisos XLI e XLII; e 7º, inciso XXXII, que assim dispõem:
Art.
5º Todos são iguais
perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito
à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:
(...)
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a
honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano
material ou moral decorrente de sua violação;
(...)
XLI – a lei punirá qualquer
discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais;
XLII – a prática do racismo constitui
crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da
lei;
(...)
Art.
7º São direitos dos
trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua
condição social:
(...)
XXXII
- proibição de
distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os
profissionais respectivos;
Além
da Constituição Federal, a Lei nº 9.029/1995 (que proíbe a exigência de
atestados de gravidez e esterilização, e outras práticas discriminatórias para
efeitos admissionais ou de permanência da relação jurídica de trabalho)
estabelece o seguinte:
Art. 1o É proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de trabalho, ou de sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros, ressalvadas, nesse caso, as hipóteses de proteção à criança e ao adolescente previstas no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal.
Como
não poderia deixar de ocorrer, a CLT também estabelece a proibição de
discriminação na contratação, conforme se vê no artigo 373-A, inciso I:
Art. 373-A. Ressalvadas as disposições legais destinadas a
corrigir as distorções que afetam o acesso da mulher ao mercado de trabalho e
certas especificidades estabelecidas nos acordos trabalhistas, é vedado:
I - publicar ou fazer publicar anúncio de emprego no qual haja
referência ao sexo, à idade, à cor ou situação familiar, salvo quando a
natureza da atividade a ser exercida, pública e notoriamente, assim o exigir;
Assim,
a partir de constatada e comprovada a discriminação, o Poder Judiciário entende
ser devida a indenização por dano moral, individual e coletivo, conforme vê-se,
ilustrativamente, pelo julgado abaixo:
DISCRIMINAÇÃO DE SEXO DA CONTRATAÇÃO. OBRIGAÇÃO DE NÃO
FAZER. DANO MORAL COLETIVO CONFIGURADO. Para efeito
de dano moral coletivo, o ilícito e seus consectários hão de ser dotados de tal
gravidade que impliquem na imediata repulsa social, ultrapassando, portanto,
aquela reação decorrente da mera inobservância de determinada norma
trabalhista. Destarte, evidenciada a discriminação na contratação por razão de
sexo, há submissão da coletividade (grupo, categoria ou classe de pessoas) a
uma situação capaz de ensejar a indenização por dano moral coletivo. (TRT-17,
RO nº 0001144-61.2015.5.17.00009, 1ª Turma, Rel. Des. José Luiz Serafini,
julgado em 29.05.2018).
Portanto, o que deve ficar claro é a necessidade de uma correta
leitura da situação, tanto por quem está oferecendo a vaga, como pelo
candidato, nos seguintes aspectos:
a) quem oferece a vaga: deve ser absolutamente
claro no anúncio da vaga e na orientação de quem seleciona, no sentido de conduzir o
processo e realizar a escolha de acordo com as necessidades específicas para a
função, mas sempre observando a lei para que não se cometa qualquer discriminação pessoal ao candidato;
b) quem se candidata à vaga: ter a lucidez para
diferenciar o que é a necessidade específica para uma função e o que é um ato
discriminatório, pois nem toda a recusa é discriminação, mas pode ser decorrente
de sua inaptidão técnica ou até física para o cargo, conforme exemplicado.
III - CONCLUSÃO
Por fim, é importante destacar que os integrantes do mercado de
trabalho (empregadores e candidatos ao emprego) sabedores de tais
características do processo seletivo, devem observar os requisitos estritamente
técnicos para o preenchimento da vaga, pois com tal comportamento diminuir-se-á
uma parte das tensões sociais que acabam por resultar inúmeros processos
judiciais e prejuízo para todos.
Alexandre
Luso de Carvalho
OAB/RS
nº 44.808
Um pouco a leste do tema de hoje, quero aplaudi-lo pelo excelente trabalho que faz, elucidando e aconselhando os cidadãos a fim de evitarem situações que envolvem a atuação da lei.
ResponderExcluirBom e repousante fim de semana. Beijos
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Bom dia, caríssima Majo Dutra!
ExcluirMuito obrigado pelo elogio! Fico muito feliz que estejas gostando das postagens e, principalmente, que elas são úteis de alguma forma.
Grande abraço!