19 de junho de 2022

STF DECIDE SER INCONSTITUCIONAL A TRIBUTAÇÃO SOBRE A PENSÃO DE ALIMENTOS


 

Alexandre Luso de Carvalho

 

Em sessão realizada em 03.06.2022 o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), em razão da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI nº 5422) ajuizada pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) no ano de 2015 e relatada pelo Ministro Dias Toffoli, julgou ser inconstitucional a incidência de imposto de renda sobre a pensão de alimentos. 

Tal Ação Direta de Inconstitucionalidade questionou a constitucionalidade de duas normas:

 

a)   Lei nº 7.713/1988: altera a legislação do imposto de renda e dá outras providências.

 

Art. 3º O imposto incidirá sobre o rendimento bruto, sem qualquer dedução, ressalvado o disposto nos arts. 9º a 14 desta Lei. (Vide Lei 8.023, de 12.4.90). 

§ 1º Constituem rendimento bruto todo o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos, os alimentos e pensões percebidos em dinheiro, e ainda os proventos de qualquer natureza, assim também entendidos os acréscimos patrimoniais não correspondentes aos rendimentos declarados”.

 

b)  Decreto nº 3.000/1999 (revogado pelo Decreto nº 9.580/2018): regulamentava a tributação, fiscalização e administração do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza.

 

Em seu voto, o Ministro Dias Toffoli entendeu para determinar a inconstitucionalidade do imposto de renda sobre a pensão de alimentos alguns motivos, dentre os quais destaco:

 

a) a ocorrência de bitributação, uma vez que já há desconto de imposto de renda sobre os ganhos do alimentante (quem paga os alimentos) e mais sobre a própria pensão, conforme vê-se em transcrição abaixo:

 

É certo, ademais, que, em regra, o imposto de renda só pode incidir uma única vez sobre a mesma realidade, sob pena de ocorrência de bis in idem vedado pelo sistema tributário.” (Grifado)

 

b) os valores decorrentes de pensão de alimentos não são rendas e nem proventos:

 

“Alimentos ou pensão alimentícia oriunda do direito de família não são renda nem provento de qualquer natureza do credor dos alimentos, mas simplesmente montantes retirados dos rendimentos (acréscimos patrimoniais) recebidos pelo alimentante para serem dados ao alimentado. Nesse sentido, para o último, o recebimento de valores a título de alimentos ou de pensão alimentícia representa tão somente uma entrada de valores.”

  

Quanto aos efeitos das ações direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, quando o STF não modulá-los, esses têm:

 

a)   repercussão geral (erga omnes): a decisão vale para todos e não só para as partes envolvidas na ação;

 

b)  retroatividade (ex tunc): o que no caso objeto desse artigo significa que a decisão de inconstitucionalidade da incidência de imposto de renda sobre a pensão de alimentos inclui os anos anteriores ao do julgamento, O QUE POSSIBILITA A BUSCA DA DEVOLUÇÃO DO TRIBUTO PAGO INDEVIDAMENTE

 

Assim, com tal entendimento, o Supremo Tribunal Federal ajusta uma situação de tributação indevida e que feria princípios constitucionais, gerando dano a quem recebia a verba de caráter alimentar. 

 

Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

alexandre_luso@yahoo.com.br


Fonte da imagem

12 de junho de 2022

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA DECIDE QUE ROL DE TRATAMENTOS PELA ANS É TAXATIVO


 

Alexandre Luso de Carvalho

 

Em artigo postado em 07.03.2022, intitulado Superior Tribuna de Justiça Julga a Natureza do Rol de Tratamentos pela ANS[1], o qual recomendo a leitura ou releitura, foi abordado o julgamento pelo STJ dos embargos de divergência[2] em recurso especial[3] (EREsp nº 1.886.929 e 1.889.704), de relatoria do Ministro Luís Felipe Salomão, membro da 2ª Seção, que reúne ministros das 3ª e 4ª Turmas, que possuem entendimentos diversos sobre a natureza do rol de tratamentos pela ANS ser meramente exemplificativo ou taxativo e o que essa decisão poderia implicar. 

Pois bem: o Superior Tribunal de Justiça julgou nesta quarta-feira (08.06.2022) que o rol da ANS é taxativo, que, em resumo significa que:

 

a)   os tratamentos prescritos pelos médicos e registrados na ANVISA, se não estiverem no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar não serão custeados pela operadora de plano de saúde se existir outro tratamento/procedimento eficaz e seguro constante no mencionado rol;

 

b)  há possibilidade de cobertura ampliada ou aditivo contratual para a cobertura de procedimento não incluído no rol, o que certamente gerará um aumento significativo no custo mensal do plano contratado;

 

c)    não existindo substituto terapêutico ou esgotados os procedimentos do rol, excepcionalmente poderá o tratamento prescrito pelo médico ser coberto pelo plano de saúde desde que:

 

c.1. não tenha sido indeferida expressamente pela ANS a incorporação do procedimento em seu rol; 

c.2. seja comprovada, por estudos médicos, a eficácia do tratamento; 

c.3. seja recomendada pelos órgãos técnicos nacionais e estrangeiros, tais como Conitec e NatJus; 

c.4. ocorra, quando possível, a comunicação interinstitucional dos juízes com entes ou pessoas capacitados na área de saúde, incluída a comissão de atualização do rol de procedimentos em saúde suplementar;

 

Ou seja, pelos requisitos acima, vê-se que será inevitável a continuidade da judicialização da relação das operadoras de planos de saúde e seus clientes, pois a excepcionalidade da cobertura fora do rol taxativo da ANS dependerá de determinação do Poder Judiciário. 

Entretanto, essa busca ao Poder Judiciário não ficará resumida à relação do cliente com as operadoras, mas se estenderá ao Supremo Tribunal Federal (STF), por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 7.088, ajuizada pela Associação Brasileira de Proteção aos Consumidores de Planos e Sistemas de Saúde (Saúde Brasil), cuja relatoria está com o Ministro Luís Roberto Barroso. Além disso, há possibilidade de Recurso Extraordinário ao STF em razão dos embargos de divergência julgados no dia 08.06.2022. 

Outro fato, é que na Câmara dos Deputados foram apresentados em 2022 vinte projetos de leis, no sentido de transformar o rol em meramente exemplificativo. Todavia, será uma batalha entre consumidores e o poderoso lobby político das operadoras de planos de saúde. E todos sabem como as tratativas legislativas funcionam... 

Com tudo isso, sem dúvida, com as inúmeras negativas de cobertura que virão aos clientes/pacientes de planos de saúde, muitas dessas ações terão seu foco desviado para o Estado (União, estados e municípios), no sentido deste fornecer o tratamento mais adequado, até pelo seu dever constitucional de assegurar a saúde à população. 

Portanto, não há dúvidas que o julgamento do STJ, no caso em questão, determinando a taxatividade do rol da ANS foi um desserviço à população brasileira e, num curto espaço de tempo, provavelmente às próprias finanças públicas, quando começarem a multiplicar-se decisões que determinem que o Estado deverá suprir essa lacuna. 

 

Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

alexandre_luso@yahoo.com.br



[2] Conceito de embargos de divergência: é o recurso que objetiva a uniformização da jurisprudência interna do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

[3] Conceito de recurso especial: é o recurso dirigido ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) sob a argumentação de que as decisões judiciais de Segundo Grau não estão em conformidade com a lei vigente e com a jurisprudência.


5 de junho de 2022

O DIREITO DO CONSUMIDOR NÃO É ABSOLUTO


 

Alexandre Luso de Carvalho

 

O Código de Defesa do Consumidor, datado de 11.09.1990, apresenta uma série de princípios e dispositivos que visam compensar essa relação que sempre foi desigual em desfavor do consumidor, dado o poder econômico do fornecedor de produtos e/ou serviços. 

Com isso, passou a ser bastante comum ouvir do consumidor que este tem a proteção absoluta do Código de Defesa do Consumidor e, portanto, sempre terá razão em seus pleitos, tanto perante o PROCON, como perante o Poder Judiciário, levando-o (o consumidor) a crer que se o fornecedor de produtos e/ou serviços não o atender é “causa ganha”. Todavia, não é bem assim. 

Quando houver suspeita que direitos contidos no Código de Defesa do Consumidor possam ter sido desrespeitados, em que pese exista a inversão do ônus da prova[1], ou seja, o fornecedor de produtos e/ou serviços dever demonstrar que agiu de acordo com o que determina a lei, aoe consumidor cabe observar o seguinte:

 

a)   apresentar uma narrativa verossímil (plausível) acerca dos fatos que possam ter acarretado o alegado desrespeito aos direitos do consumidor;

 

b)  apresentar, ao menos, um começo de prova acerca do alegado, isto é, algo que demostre a existência da relação de consumo e que uma lesão aos seus direitos pode ter ocorrido.

 

A partir disso, o Magistrado julgará o pedido levando em conta os fatos narrados, as provas e a fundamentação jurídica apresentada. 

Entretanto, é importante salientar que por mais elaborada que seja a tese jurídica, é muito improvável que algum juiz decida em favor do consumidor se este não apresentar uma narrativa plausível e provas da inobservância às leis de consumo que cause lesão aos seus direitos, bem como impedirá uma tentativa de ganho indevido ou excessivo pelo consumidor. 

Outro aspecto importante é que nem sempre que ocorrer uma falha na relação de consumo, haverá direito à indenização, obrigação de fazer ou cumprimento de uma suposta oferta inserida no mercado. Um exemplo disso é quando se verifica a ocorrência de um erro grosseiro de oferta de um produto no qual o preço ou outras condições, notadamente, se apresentam muito destoantes do que é praticado no mercado à ponto de acarretar prejuízo ao anunciante. Nesse tipo de caso o próprio Poder Judiciário entende que não há necessidade de cumprimento da oferta:

 

RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. OFERTA DE PRODUTO PELA INTERNET. ERRO GROSSEIRO NA DIVULGAÇÃO DO PREÇO. PRECEITO DA BOA FÉ-OBJETIVA. AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO DO FORNECEDOR À OFERTA. PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO DO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. Foi publicado, equivocadamente, no endereço eletrônico da demandada, uma oferta de um determinado produto com preço ínfimo em relação ao seu preço real de mercado. Tendo a ré comprovado que o produto adquirido pelo autor foi ofertado erroneamente, ilegítima a pretensão do demandante em buscar ressarcimento material tampou extrapatrimonial. Sentença de improcedência mantida. (TJRS, Recurso Cível nº 71005096649, Relator Juiz Roberto Behrensdorf Gomes da Silva, 2ª Turma Recursal Cível, julgado em 24.09.2014)

 

Portanto, o que se vê é que o direito do consumidor não é absoluto – qualquer alegação ao contrário não corresponde ao que acontece, é um mito. A aplicação da legislação relativas às regras de consumo depende de uma série de fatos, requisitos e provas a serem analisadas, inclusive, antes do ajuizamento de qualquer pleito perante o Poder Judiciário. 

 

Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

alexandre_luso@yahoo.com.br



[1] Código de Defesa do Consumidor. Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...) VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;