28 de março de 2025

O EMPRÉSTIMO CONSIGNADO PARA EMPREGADOS DA INICIATIVA PRIVADA



Alexandre Luso de Carvalho 

 

Na semana passada uma das notícias que mereceu relevância no Brasil foi a possibilidade de, agora, os empregados da iniciativa privada terem acesso aos empréstimos consignados, antes só possíveis para os servidores públicos da ativa e aposentados e pensionistas em geral. Tal fato, parece ser benéfico aos trabalhadores, pois possibilita o acesso ao crédito a juros mais baixos (ou menos altos), uma vez que há uma garantia maior de pagamento para os bancos e instituições financeiras. 

Todavia, é necessário que se analise com mais detalhes alguns aspectos dessa abertura na modalidade de empréstimo consignado, sendo importante salientar os seguintes pontos: 


a)  o empréstimo consignado aos empregados da iniciativa privada se deu por meio da Medida Provisória nº 1.292, de 12 de março de 2025, que altera a Lei nº 10.820/2003, que trata sobre as operações de crédito para:

 

a.1. empregados regidos pela CLT; 

a.2. trabalhadores rurais, regidos pela Lei nº 5.889/1973; 

a.3.  empregados domésticos, regidos pela Lei Complementar nº 150/2015; 

a.4. diretores não empregados com direito ao FGTS;

 

b)  o texto da Medida Provisória deixa claro vários direitos e obrigações para empregados, empregadores e Governo, dentre os quais destaco:

 

b.1. os empregados regidos pela CLT poderão autorizar, de forma irrevogável e irretratável, o desconto em folha de pagamento ou na sua remuneração disponível dos valores referentes ao pagamento de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil concedidos por instituições financeiras e sociedades de arrendamento mercantil, quando previsto nos respectivos contratos;

 

b.2. a consignação voluntária será aplicável a todos os vínculos empregatícios ativos no momento da contratação do crédito que se fizerem necessários ao pagamento das obrigações assumidas, e será autorizado, em caso de rescisão ou de suspensão do contrato de trabalho, o seu redirecionamento para:

 

·    outros vínculos de emprego ativos no momento da contratação do crédito, mas inicialmente não alcançados pela consignação; ou

 

·    vínculos empregatícios que surjam posteriormente à contratação da operação de crédito.

 

 b.3. sem prejuízo da possibilidade de contratação mediante canais próprios das instituições consignatárias, a operacionalização das operações de crédito será efetuada em sistemas ou em plataformas digitais acessíveis por meio eletrônico e mantidas por agentes operadores públicos e implica:

 

b.3.1. para os EMPREGADORES:

 

·    a obrigação de efetuar todos os procedimentos necessários para a operacionalização dos descontos dos valores das prestações contratadas em operações de crédito, inclusive nas verbas rescisórias;

 

·    a obrigatoriedade de fornecer aos agentes operadores públicos, aos empregados e ao órgão ou à entidade da administração pública federal responsável, informações relativas à folha de pagamento ou à remuneração disponível do empregado, eventuais acréscimos legais e descontos aplicados à folha de pagamento, e de disponibilizar o termo de rescisão de contrato de trabalho, quando aplicável;

 

·    a obrigação de efetuar todos os procedimentos operacionais necessários à eficácia do contrato de operação de crédito na instituição consignatária escolhida pelo empregado, independentemente da existência de prévio acordo ou convênio firmado;

 

b.3.2. para os EMPREGADOS:

 

·    a autorização para os descontos dos valores das prestações contratadas em operação de crédito, quando realizados através de sistemas ou de plataformas digitais;

 

·   o consentimento em compartilhar dados pessoais com os agentes operadores públicos credenciados e com bancos e financeiras habilitadas para a contratação de operação de crédito consignado nos termos do disposto na Lei nº 13.709/2018 (Lei Geral de Proteção de Dados);

 

b.3.3. para os BANCOS e FINANCEIRAS:

 

·    a obrigação de realizar todos os procedimentos necessários para a adaptação de sistemas e para a operacionalização do empréstimo nos sistemas ou nas plataformas digitais;

 

·    o cumprimento das obrigações assumidas nos atos expedidos pelo Poder Executivo federal, sob pena de suspensão ou cancelamento da habilitação.

 

 

b.4. aos agentes operadores públicos fica autorizado o acesso aos dados pessoais dos empregados, observado o consentimento destes e o tratamento e o uso compartilhado desses dados com os bancos e financeiras, para a operacionalização dos sistemas ou das plataformas digitais;

 

b.5. é proibido o compartilhamento de informações pessoais dos empregados entre os bancos e financeiras ou o uso de informações pessoais recebidas para qualquer outra finalidade;

 

b.6. os órgãos e as entidades federais compartilharão com os agentes operadores públicos e com os bancos e financeiras os dados e informações necessários à operacionalização dos sistemas ou das plataformas digitais;

 

b.7. as autorizações de desconto em folha de pagamento ou em remuneração disponível dos valores referentes ao pagamento de operações de crédito cursadas fora dos sistemas ou das plataformas deverão ser averbadas no sistema ou na plataforma dos operadores públicos, sob pena de nulidade;

 

b.8. o empregado pode solicitar a transferência, entre os bancos e financeiras, da consignação;

 

b.9.  os bancos e financeiras habilitadas que já possuam autorizações de desconto terão até 120 dias para averbá-las no sistema ou na plataforma dos operadores públicos;

 

b.10. durante o período de 120 dias, contado da entrada em funcionamento dos sistemas ou das plataformas digitais, as operações de crédito realizadas com os bancos e financeiras deverão ter seus recursos destinados exclusivamente para pagamento das seguintes modalidades, caso os mutuários tenham operações ativas nessas modalidades na data da concessão:

 

·    empréstimo não consignado, sem garantia e com parcelas vincendas; ou

 

·    empréstimo com descontos em folha de pagamento, com parcelas vincendas.

 

b.11. as novas operações de créditos de que trata este artigo poderão ser ofertadas por quaisquer instituições financeiras habilitadas;

 

b.12. a nova operação de crédito deverá ter taxa de juros inferior à taxa de juros da operação originária.

 

b.13. as instituições consignatárias deverão informar os dados das operações de crédito;

 

b.14. fica autorizada a portabilidade das operações de crédito que estejam averbadas nos sistemas ou nas plataformas.

 

 

Um outro aspecto que merece um destaque especial é que essa abertura de empréstimos consignados para essas categorias de trabalhadores deu-se por meio de Medida Provisória e que tem as seguintes características gerais:

 

a)  é uma norma com força de lei editada pelo Presidente da República em situações de relevância e/ou urgência;

 

b)  necessita da posterior apreciação do Congresso Nacional (Câmara e Senado) para se converter definitivamente em lei ordinária;

 

c)   o prazo inicial de vigência de uma Medida Provisória é de 60 dias, podendo ser prorrogado automaticamente por igual período caso não tenha sua votação na Câmara e no Senado;

 

d)  se não for apreciada em até 45 dias, contados da sua publicação, entra em regime de urgência, interrompendo todas as demais deliberações legislativas da Casa em que estiver tramitando. 

 

Por fim, em razão do crédito consignado para os trabalhadores da iniciativa privada estar sendo implementado e, portanto, ainda ser carente de ajustes e melhorias, bem como estar pendente a sua aprovação pelo Congresso – que se sabe ser complicada na maioria dos casos – para ter sua eficácia confirmada, ou seja, para realmente "valer". Com isso, entendo que se deve ter cautela na contratação desses empréstimos e, se possível, aguardar o desenrolar da votação para aprovação ou não da Medida Provisória. 

 

Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808


alexandre_luso@yahoo.com.br



 

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