28 de fevereiro de 2021

ALGUNS ASPECTOS SOBRE OS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS (PEQUENAS CAUSAS)


 

Alexandre Luso de Carvalho

 

I – INTRODUÇÃO

 

Em 1995 foi publicada a Lei nº. 9.099/95 que instituiu os Juizados Especiais Cíveis e Criminais – popularmente chamados de “Pequenas Causas” – para casos de valor econômico reduzido, baixa complexidade jurídica e para os crimes de baixo potencial ofensivo. Com isso, visava-se “desafogar” o que chamamos de “Justiça Comum”, que se ateria aos processos mais complexos e de maior vulto econômico. 

Sem dúvida, a criação dos Juizados Especiais foi uma inovação que diminuiu a sobrecarga nas varas comuns do Poder Judiciário e tornou ao cidadão mais fácil e menos oneroso o acesso à Justiça. Ocorre que ainda há um nível de desconhecimento sobre o seu funcionamento que geram equívocos ou até mesmo “mitos” sobre o popularmente conhecido Juizado de “Pequenas Causas”.

 

II – FUNCIONAMENTO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS

 

No que diz respeito aos Juizados Especiais Cíveis, o ajuizamento das ações, obviamente cumprem a finalidade de julgamento de causas de menor valor e menor complexidade, tendo ainda algumas características importantes de serem destacadas:

 

a)   Limites de valores das causas para o ajuizamento nos Juizados Especiais Cíveis:

 

a.1. causas de até vinte (20) salários mínimos para ajuizar sem a necessidade de advogado; 

a.2. causas de até quarenta (40) salários mínimos, mas para o ajuizamento destas há necessidade de o pedido ser feito por meio de advogado;

 

b) causas de baixa complexidade jurídica;

 

c) não há pagamento de custas processuais nos seguintes casos:

 

c.1. quando do ajuizamento da ação (custas iniciais); 

c.2. quando é concedido o benefício da Assistência Judiciária Gratuita ao autor da ação ou ao réu, em razão destes comprovadamente serem pessoas de poucos recursos; 

c.3. quando não há recurso da sentença de Primeiro Grau;

 

d) ocorrência de duas audiências (uma audiência de conciliação e, caso não haja acordo, a designação de audiência de instrução e julgamento, para ouvir depoimentos pessoais das partes e das testemunhas);

 

e) não há prova pericial por parte do Juízo;

 

f) há menos recursos a serem interpostos;

 

g) impossibilidade de citação por edital, excetuando nos casos de execução[1];


h) podem ser autores das ações as pessoas físicas, excetuando os incapazes e presos, e as pessoas jurídicas, desde que sejam microempreendedores individuais, microempresas, empresas de pequeno porte, sociedades de crédito de microempreendedor, organizações civis de interesse público;

 

i)    podem ser réus perante os Juizados Especiais Cíveis, as pessoas físicas, exceto os incapazes e os presos, as pessoas jurídicas de direito privado e as organizações civis de interesse público;

 

j) não podem ser partes nas ações dos Juizados Especiais Cíveis, o incapaz, o preso, as empresas de direito público, as empresas públicas da União, a massa falida e o insolvente civil.

 

Evidentemente que há outras particularidades sobre os procedimentos dos Juizados Especiais Cíveis, mas algumas delas, por vezes, dependem de exame caso a caso, que não é o objetivo desse artigo.

 

II – EQUÍVOCOS OU “MITOS” SOBRE OS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS

 

Apesar das facilidades que os Juizados Especiais Cíveis trouxeram ao cidadão, há uma série de equívocos ou “mitos” sobre os Juizados de “Pequenas Causas”. Vejamos:

 

a)   o Juizado Especial Cível sempre é mais rápido que a “Justiça Comum”. Esse é um equívoco muito comum em razão do rito estabelecido pela Lei nº 9.099/95 prever essa celeridade. Todavia, há certos aspectos que, por vezes, tornam a tramitação do processo no Juizado de “Pequenas Causas” quase tão demorado quanto ao da ação que é ajuizada na “Justiça Comum”. Por exemplo: volume de processos e infraestrutura do Foro, dificuldade de encontrar e citar a parte ré, dificuldade de encontrar bens do devedor, etc.;

 

b)  o Juizado Especial Cível é totalmente gratuito. Só há a gratuidade  de Justiça quando da distribuição da ação, quando autor e/ou réu são pessoas comprovadamente de poucos recursos e quando não há recurso da sentença de Primeiro Grau. Caso contrário, em caso de interposição de recurso, o recorrente paga custas, bem como quem perder o recurso (autor ou réu) paga honorários advocatícios sucumbenciais[2], ou seja, os honorários do advogado da parte contrária;

 

c) não há necessidade de advogados nos Juizados Especiais Cíveis nas ações até vinte (20) salários mínimos. Não é uma verdade absoluta e, por isso, é um “mito” que muitas vezes acarreta prejuízos a quem até tem o direito postulado. Explico:

 

c.1. o autor pode ajuizar a ação, peticionando de próprio punho ou tendo o auxílio de um servidor da Distribuição do Juizado Especial Cível, que tomará a termo o pedido de forma resumida. Isto acarreta, na maioria dos casos, a falta do devido detalhamento dos fatos, das provas e sem a devida e expressa fundamentação jurídica (legal, doutrinária e jurisprudencial); 

c.2. não ocorrendo acordo na audiência de conciliação, é designada uma audiência de instrução e julgamento (para o depoimento das partes e testemunhas, se tiverem), sendo a partir daí obrigatório que as partes sejam acompanhadas por advogados. É aí que reside o problema. O advogado que assumir o caso em andamento e na qual já existe uma petição inicial (geralmente sem o detalhamento dos fatos e sem a devida fundamentação jurídica que sustente e justifique o pedido) e no qual já há documentos juntados, terá uma grande limitação em sua atuação, uma vez que não será mais possível a juntada de novas provas ou a apresentação de tese jurídica mais adequada e tampouco a realização de novos pedidos ou de pedidos diversos dos contidos na petição inicial. Isso, não raro, causa a perda do processo; 

c.3. importante frisar que comumente a parte ré já comparece acompanhada por advogado desde a audiência de conciliação. As empresas, em especial, quando não enviam advogados, mas só prepostos, geralmente não oferecem proposta de acordo. E aí o estrago já está feito, pois o autor entrou com uma ação, tendo uma petição inicial distante de qualquer técnica jurídica e terá que enfrentar a parte contrária que apresentará uma contestação elaborada por um advogado. Ou seja, haverá uma luta desigual.

  

III - CONCLUSÃO

 

O que se conclui a partir da abordagem feita acima, é que apesar da notória e incontestável importância dos Juizados Especiais Cíveis no sistema judicial brasileiro, a sua praticidade, celeridade e menor ônus ao cidadão é relativa diante dos direitos e/ou prejuízos que a escolha equivocada desse rito processual pode ocasionar. Portanto, é fundamental que antes de ser ajuizada uma ação pelo Juizado de “Pequenas Causas” haja uma reflexão por parte de quem busca o direito (o autor) e obviamente a adequada orientação profissional.

  

Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

alexandre_luso@yahoo.com.br




[1] Fórum Nacional dos Juízes Estaduais (FONAJE), Enunciado 37. Em exegese ao art. 53, § 4º, da Lei 9.099/1995, não se aplica ao processo de execução o disposto no art. 18, § 2º, da referida lei, sendo autorizados o arresto e a citação editalícia quando não encontrado o devedor, observados, no que couber, os arts. 653 e 654 do Código de Processo Civil (nova redação – XXI Encontro – Vitória/ES).

[2] Código de Processo Civil, art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. § 1º São devidos honorários advocatícios na reconvenção, no cumprimento de sentença, provisório ou definitivo, na execução, resistida ou não, e nos recursos interpostos, cumulativamente. § 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos: I - o grau de zelo do profissional; II - o lugar de prestação do serviço; III - a natureza e a importância da causa; IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.


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