29 de novembro de 2020

O REAJUSTE DE PLANOS DE SAÚDE PARA IDOSOS

 


Alexandre Luso de Carvalho

 

Um dos temas que causa mais indignação quando se fala em saúde é o gigantesco aumento da mensalidade dos planos de saúde quando o contratante se torna idoso. Aliás, na mesma proporção da indignação vemos as dúvidas: pode um aumento tão grande? A partir de que idade? Pode haver exclusão de cobertura? Enfim, são muitas dúvidas.

Os planos de saúde são contratos de adesão, ou seja, com cláusulas preestabelecidas (sem possibilidade de alterações) e que têm como sua característica principal, no meu entender, o desequilíbrio entre direitos e deveres conferidos às partes. Entretanto, é importante salientar que, devido à massificação das relações de consumo, seria impossível, obviamente, elaborar um contrato específico para cada consumidor. Mas, reitere-se, mesmo sendo necessária essa padronização, são contratos desequilibrados.

Mas, falando de modo específico aos contratos de plano de saúde, é importante destacar que, quanto ao aumento do valor da mensalidade a cada faixa etária, tal prática não se mostra ilegal, desde que não esteja em desacordo com a Resolução Normativa nº 63/03 da Agência Nacional de Saúde (ANS), que estabelece no artigo 3º, incisos I e II:

 

Art. 3º Os percentuais de variação em cada mudança de faixa etária deverão ser fixados pela operadora, observadas as seguintes condições:

I - o valor fixado para a última faixa etária não poderá ser superior a seis vezes o valor da primeira faixa etária;

II - a variação acumulada entre a sétima e a décima faixas não poderá ser superior à variação acumulada entre a primeira e a sétima faixas.

 

Portanto, acima dos parâmetros estabelecidos pela ANS, o aumento das mensalidades é abusivo, devendo o reajuste ser readequado e os valores cobrados a maior devolvidos com a devida atualização monetária, conforme entendimento jurisprudencial:

 

"AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DANOS MORAIS E MATERIAIS C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER. REAJUSTE ABUSIVO DO PLANO DE SAÚDE EM RAZÃO DA MUDANÇA DE FAIXA ETÁRIA DO CONSUMIDOR. AUSÊNCIA DE RAZOABILIDADE E DESCONFORME À RESOLUÇÃO Nº 63/03 DA AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE. JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE DE JUSTIÇA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO À UNANIMIDADE. 1. Ainda que seja possível o reajuste no plano de saúde em razão da mudança de faixa etária do consumidor, este deve ser balizado em critérios de razoabilidade e em observância às condições fixadas na Resolução nº 63 da ANS. 2. In casu, o reajuste de 92,2% foge aos parâmetros legais e aos critérios de razoabilidade, considerando-se assim abusiva a cláusula contratual que a estabeleceu. 3. Recurso conhecido e desprovido." (TJPA, AC nº 00095580720118140301, 1ª Turma de Direito Privado, Rel. Des. José Roberto Pinheiro Maia Bezerra Júnior, julgado em 03.06.2019, Data da Publicação: 13.06.2019). (Grifado)

 

 Outro aspecto importante de ser ressaltado é que nos contratos de plano de saúde, no caso específico do reajuste para a faixa estaria de idosos, devem ser observados o Código de Defesa do Consumidor e o Estatuto do Idoso em todos os seus aspectos, havendo uma dupla proteção a tal público.

Portanto, sempre que houver um aumento que o consumidor entenda demasiado de uma faixa etária para outra, há de ser feita a análise para certificar-se se o reajuste é legal ou não e, caso se mostre abusivo, buscar todos os meios administrativos e/ou judiciais para reverter tal situação.

 

 Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

alexandre_luso@yahoo.com.br


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21 de novembro de 2020

A VISTORIA NO CONTRATO DE LOCAÇÃO


 

Alexandre Luso de Carvalho

 

O primeiro passo num contrato de locação é verificar o valor do aluguel, a periodicidade e o índice de reajuste, os direitos e deveres de ambas as partes e algumas outras especificidades do contrato em si. O segundo passo, e não menos importante, dá-se quando da realização da vistoria e na elaboração do termo e sua aceitação ou contestação.

Entretanto, quando esse “segundo passo”, ou seja, o momento da vistoria, é entendido como algo secundário, daí começam os problemas. O Termo de Vistoria não é um “mero anexo” ao contrato, mas sim parte fundamental do contrato de locação e, portanto, merecedor do maior detalhamento possível em cada etapa de sua elaboração e/ou contestação.

Essa atenção em todos os momentos da vistoria terá reflexos durante toda a locação, caso o locatário peça algum reparo no imóvel, mas, principalmente, na entrega deste, quando findar o contrato.

Nesse sentido, é fundamental que locador e locatário tomem algumas medidas referente ao Termo de Vistoria. Vejamos:

 

a)  pelo LOCADOR:

a.1. tendo contratado uma imobiliária para administrar o imóvel, mesmo assim, é sempre bom que antes da vistoria, o locador verifique as condições deste e, antes da assinatura, solicite que o Termo de Vistoria lhe seja enviado para revisão e aprovação;

a.2. quando o contrato não tiver intermédio de imobiliária, é fundamental contratar um profissional que saiba realizar a vistoria e redigir o Termo de Vistoria;


b) pelo LOCATÁRIO: contratar um advogado para analisar o contrato de locação em sua íntegra, o que inclui o acompanhamento na vistoria e, caso necessário, a contestação a essa. Esse procedimento deve ser feito no início e no final do contrato.

 

Importante salientar, com isso, que uma vistoria detalhada, um termo bem redigido e uma contestação, caso necessária, bem-feita muitas vezes acaba por incentivar que as partes envolvidas na relação contratual resolvam qualquer problema ou dúvida de modo amigável, e não busquem o Poder Judiciário, aliviando a sobrecarga deste e evitando agravar os prejuízos financeiros de ambos, em razão dos riscos, demora e custos de uma ação judicial, pois, em caso de desacerto, locatário e locador estão sujeitos a duas situações:

 

a)   quanto ao LOCATÁRIO: a pagar as despesas contratuais (aluguéis, condomínio e IPTU) até que restitua o imóvel nas condições em que recebeu, o que aumenta seus custos de forma muito elevada. E, sobre tal matéria, diga-se, o entendimento jurisprudencial é nesse sentido:

 

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATO DE ALUGUEL. RESCISÃO. VISTORIA. CONSTATAÇÃO DE AVARIAS NO IMÓVEL. REALIZAÇÃO DE OBRAS PELO LOCADOR. RESSARCIMENTO. PAGAMENTO DE ALUGUÉIS E ENCARGOS ATÉ A FINALIZAÇÃO DAS REFORMAS. POSSIBILIDADE. Se a vistoria final realizada no imóvel constatou diversas avarias neste, as quais não se encontravam presentes no laudo de vistoria inicial, deve o locador ser ressarcido dos gastos que teve com os reparos realizados no bem. Prevendo o contrato de locação que, uma vez findada a locação, o ato de restituição do imóvel somente se concluirá depois de satisfeita ou atendidas, pelo locatário ou por seus fiadores, todas as obrigações estabelecidas no contrato, a responsabilidade quanto ao pagamento dos aluguéis e encargos da locação permanece até que sejam realizadas todas as obras necessárias para reforma do imóvel, a despeito de já ter havido a entrega das chaves à imobiliária. (TJMG, AC nº 1.0024.13.183364-2/001, 17ª Câmara Cível, Rel. Des. Luciano Pinto, julgado em 08/03/2018). (Grifado)

 

b)  quanto ao LOCADOR: pode não conseguir provar que os danos foram causados pelo locatário, lembrando que o ônus da prova é de quem alega – e, além de não receber tais valores, ficar com o imóvel sem alugar durante a tramitação do processo, ainda pagar as custas processuais e honorários advocatícios. Ou seja, o que era para ser rentável, acaba acarretando um considerável prejuízo.


Portanto, vale ficar atento nesse aspecto do contrato, que muitas vezes é a diferença entre uma relação locatícia ser caracterizada pela tranquilidade ou pela animosidade e grandes prejuízos.

 

 Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

  

alexandre_luso@yahoo.com.br


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15 de novembro de 2020

ACIDENTE DE TRABALHO - CONCEITUAÇÕES PARA IDENTIFICAÇÃO E PREVENÇÃO


 

Alexandre Luso de Carvalho

 

Infelizmente a ocorrência de acidentes de trabalho ainda é algo muito expressivo no Brasil, já que a cada 49 segundos um acidente do trabalho é registrado no Brasil, conforme levantamento feito pelo Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho, entre 2012 a 2019[1].

Para entender-se um pouco melhor sobre o tema, primeiramente, cabe começar pela conceituação básica do que é acidente do trabalho:

 

“Todo acidente que ocorre pelo exercício do trabalho, a serviço da empresa, provocando lesão corporal ou perturbação funcional, resultando a morte, a perda ou a redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho”[2].

 

A partir dessa conceituação básica pode-se avançar no assunto sobre o tratamento que as leis dão acerca do tema, a começar pela Constituição Federal, que estabelece:

 

"Art. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
(...)

XXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;"


Tendo em vista essa diretriz estabelecida pela nossa Lei Maior, é obrigatória a abordagem à Lei nº 8.213/91 (Plano de Benefícios da Previdência Social) que em seu artigo 21, incisos II e III enumera as causas de acidente de trabalho:

 

"Art. 21. Equiparam-se também ao acidente do trabalho, para efeitos desta Lei:

(...)

II - o acidente sofrido pelo segurado no local e no horário do trabalho, em consequência de:

a) ato de agressão, sabotagem ou terrorismo praticado por terceiro ou companheiro de trabalho;

b) ofensa física intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionada ao trabalho;

c) ato de imprudência, de negligência ou de imperícia de terceiro ou de companheiro de trabalho;

d) ato de pessoa privada do uso da razão;

e) desabamento, inundação, incêndio e outros casos fortuitos ou decorrentes de força maior;

III - a doença proveniente de contaminação acidental do empregado no exercício de sua atividade;"

 

Tais casos de acidente do trabalho podem ocorrer, dentro das instalações do empregador, bem como fora dessas, conforme hipóteses contidas na mesma Lei nº 8.213/91 (artigo 21, IV):

 

"IV - o acidente sofrido pelo segurado ainda que fora do local e horário de trabalho:

a)   na execução de ordem ou na realização de serviço sob a autoridade da empresa;

b)   na prestação espontânea de qualquer serviço à empresa para lhe evitar prejuízo ou proporcionar proveito;

c) em viagem a serviço da empresa, inclusive para estudo quando financiada por esta dentro de seus planos para melhor capacitação da mão-de-obra, independentemente do meio de locomoção utilizado, inclusive veículo de propriedade do segurado;

d) no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela, qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado."

 

Destaque-se, também, dois pontos (Lei nº 8.213/91, artigo 21, parágrafos 1º e 2º):

 

"§ 1º Nos períodos destinados a refeição ou descanso, ou por ocasião da satisfação de outras necessidades fisiológicas, no local do trabalho ou durante este, o empregado é considerado no exercício do trabalho.

§ 2º Não é considerada agravação ou complicação de acidente do trabalho a lesão que, resultante de acidente de outra origem, se associe ou se superponha às consequências do anterior." (Grifado)

 

Um outro ponto que deve ser abordado é o que estabelece o artigo 23 da lei previdenciária, quanto a data da ocorrência do acidente:

 

Art. 23. Considera-se como dia do acidente, no caso de doença profissional ou do trabalho, a data do início da incapacidade laborativa para o exercício da atividade habitual, ou o dia da segregação compulsória, ou o dia em que for realizado o diagnóstico, valendo para este efeito o que ocorrer primeiro.

 

Assim, a partir da data do acidente, o auxílio-doença acidentário é devido pelo empregador até o 15º dia e, a partir do 16º dia pela Previdência Social. E com isso:

 

a) a empresa não paga mais o salário, apesar de ser computado para efeitos de indenização e estabilidade o tempo de serviço[3] e incidência do FGTS[4];

b) não será considerada falta ao serviço (CLT, artigo, 131, inciso III[5]);

c)   computar-se-á, ainda, o tempo para o período de férias, excetuando o caso de ter recebido o auxílio previdenciário, embora descontínuos por mais seis meses (CLT, artigo 131, inciso IV[6]).

 

Outro ponto que não se pode esquecer: apesar do auxílio estatal, também é cabível, dependendo do caso – condições de trabalho e como deu-se o acidente –, o pagamento de indenização do empregador ao empregado, em razão das consequências patrimoniais (despesas e lucros cessantes) e extrapatrimoniais (sofrimento físico e psicológico do empregado e de sua família). Para isso, entretanto, é necessário diferenciar a existência da responsabilidade objetiva ou subjetiva do empregador e do empregado no acidente, conforme conceitos abaixo[7]:

 

Responsabilidade objetiva: “Aquela que se configura com base exclusivamente no aspecto objetivo, sem exame, da falta de atenção, da falta de diligência, etc., do causador do evento. (Grifado)

 

Responsabilidade subjetiva: “É a que surge do não-cumprimento das normas que regem as relações interpessoais, através da imperícia, intencionalidade, imprudência e negligência do autor do dano”. (Grifado)

 

Com isso, levando-se em consideração as duas formas de responsabilidade acima citadas, há vários fatores a serem considerados quanto ao acidente ocorrido:


a)   Culpa direta do empregador;

b)  Culpa indireta do empregador;

c)   Culpa exclusiva do empregado;

d)  Em decorrência da natureza da atividade;

e)   Culpa exclusivamente de terceiro;

f)    Caso fortuito ou de força maior.

 

Por fim, para a diminuição do número de casos de acidente de trabalho, tanto pela primordial questão humana – a saúde do trabalhador –, como por uma questão empresarial, para diminuir-se as possibilidades de prejuízos advindos da ausência de um empregado treinado e/ou de uma condenação em ação trabalhista é fundamental a adoção de procedimentos preventivos pelo empregador – sempre comprovando que os fez –, sendo que tais procedimentos, para serem eficazes iniciam na sua elaboração a partir das especificidades de cada empresa e continuam na rotineira adoção por empregador e empregado.

 

 Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

alexandre_luso@yahoo.com.br

 

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[1] Fonte: https://www.amatra4.org.br/noticias/notmidia/um-acidente-de-trabalho-e-registrado-no-brasil-a-cada-49-segundos/

[2] Dicionário Jurídico Piragibe, 9ª edição, 2007, Ed. Lumen Juris, p.50.

[3] CLT, Art. 4º - Considera-se como de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada. § 1º  Computar-se-ão, na contagem de tempo de serviço, para efeito de indenização e estabilidade, os períodos em que o empregado estiver afastado do trabalho prestando serviço militar e por motivo de acidente do trabalho.

 [4] Lei nº 8.036/90, Art. 15. Para os fins previstos nesta lei, todos os empregadores ficam obrigados a depositar, até o dia 7 (sete) de cada mês, em conta bancária vinculada, a importância correspondente a 8 (oito) por cento da remuneração paga ou devida, no mês anterior, a cada trabalhador, incluídas na remuneração as parcelas de que tratam os arts. 457 e 458 da CLT e a gratificação de Natal a que se refere a Lei nº 4.090, de 13 de julho de 1962, com as modificações da Lei nº 4.749, de 12 de agosto de 1965. (Vide Lei nº 13.189, de 2015) Vigência. § 5º  O depósito de que trata o caput deste artigo é obrigatório nos casos de afastamento para prestação do serviço militar obrigatório e licença por acidente do trabalho.

 [5] CLT, Art. 131 - Não será considerada falta ao serviço, para os efeitos do artigo anterior, a ausência do empregado: (...)  III - por motivo de acidente do trabalho ou enfermidade atestada pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, excetuada a hipótese do inciso IV do art. 133;

[6] CLT, Art. 131 - Não será considerada falta ao serviço, para os efeitos do artigo anterior, a ausência do empregado: (...) IV - tiver percebido da Previdência Social prestações de acidente de trabalho ou de auxílio-doença por mais de 6 (seis) meses, embora descontínuo.

[7] Dicionário Jurídico Piragibe, 9ª edição, 2007, Ed. Lumen Juris, p. 1.062 e 1.064

8 de novembro de 2020

O ASSÉDIO MORAL DE CONDÔMINOS AOS FUNCIONÁRIOS E PRESTADORES DE SERVIÇOS


 

Alexandre Luso de Carvalho

 

Esse é um tema que considero bastante delicado, pois envolve relações de natureza trabalhista (condomínio e empregado), civil (condomínio e condômino), mas, sobretudo, sociocultural (condômino e empregado). Aliás, essa última é o fato gerador do que será tratado neste artigo.

Não é incomum moradores fazerem solicitações e/ou reclamações por algum serviço realizado no condomínio. Por vezes, essas reclamações/solicitações são feitas diretamente ao funcionário ou prestador de serviços terceirizado. Tal conduta, todavia, mesmo que feita com a educação necessária (e esperada), não é a mais adequada, tendo em vista que as determinações de como os serviços devem ser executados vêm do síndico, do gestor (se houver) e dos demais envolvidos com tais atividades. Portanto, as solicitações e críticas devem ser feitas a quem administra o condomínio, até para que se alinhem e padronizem os procedimentos.

Ocorre que certas situações levam o morador a solicitar diretamente ao funcionário que um determinado serviço seja refeito ou que algum procedimento seja corrigido. Isso acontece, e não é algo ilegal obviamente. Todavia, o modo como deve ser feita essa abordagem é o ponto crucial nesse momento, pois, de modo algum, o condômino pode solicitar ou reclamar aos funcionários e/ou prestadores de serviços de forma desrespeitosa, agressiva, arrogante, por vezes, intimidadora até. Eis a seguir dois exemplos do que não pode ser feito: a) ao solicitar que o funcionário refaça a limpeza de um local que não ficou bem-feita, jamais isso pode ser feito aos gritos ou chamando o serviço e, principalmente, o funcionário de “porco” ou de qualquer outro adjetivo depreciativo; b) quando ocorrer alguma falha de comunicação com a portaria, jamais se deve xingar o porteiro, ameaçá-lo ou tomar qualquer outra atitude desrespeitosa ou intimidadora.

Importante frisar que o comportamento abusivo por parte do condômino em relação aos trabalhadores que prestam serviços ao condomínio pode ser caracterizado, no âmbito trabalhista, como assédio moral, conforme conceito constante na cartilha elaborada no Ato Conjunto do Tribunal Superior do Trabalho e Conselho Superior da Justiça do Trabalho[1]:

 

“Assédio moral é a exposição de pessoas a situações humilhantes e constrangedoras no ambiente de trabalho, de forma repetitiva e prolongada, no exercício de suas atividades. É uma conduta que traz danos à dignidade e à integridade do indivíduo, colocando a saúde em risco e prejudicando o ambiente de trabalho.

O assédio moral é conceituado por especialistas como toda e qualquer conduta abusiva, manifestando-se por comportamentos, palavras, atos, gestos ou escritos que possam trazer danos à personalidade, à dignidade ou à integridade física e psíquica de uma pessoa, pondo em perigo o seu emprego ou degradando o ambiente de trabalho”. (Grifado)

 

Assim, havendo tal comportamento por parte do condômino em relação ao empregado/terceirizado, no final das contas, quem pode ser penalizado em ação trabalhista é o próprio condomínio, conforme consolidado entendimento jurisprudencial[2].

O condomínio, portanto, deve precaver-se dos riscos de condenação trabalhista por assédio moral, adotando medidas educativas (para moradores e funcionários), investigativas e punitivas aos condôminos que cometerem qualquer conduta abusiva (dentro do que determinar as normas internas), pois não é admissível que o condomínio seja prejudicado pelo comportamento de alguns poucos condôminos que ainda equivocadamente pensam que a relação existente é de servilismo, e não do que realmente é: uma relação puramente profissional, com direitos e deveres e, dentre estes, o de respeito recíproco.

Por fim, é importante frisar os seguintes aspectos em relação especificamente agora ao comportamento do síndico e do subsíndico: a ação destes, quando se virem diante de uma situação ou relato de conduta abusiva de morador contra funcionários, pode ser a diferença entre a condenação ou não por assédio moral em ação trabalhista. E, por ser também atribuição do síndico proteger o condomínio de tais prejuízos, este é legitimado a tomar, como foi dito, as medidas preventivas e punitivas para coibir a proliferação desse comportamento contrário ao direito e, antes de mais nada, socialmente reprovável.

 

 Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

alexandre_luso@yahoo.com.br


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[1] TST.CSJT.GP 8, de 21.03.2019, que institui a Política de Prevenção e Combate ao Assédio Moral no Tribunal Superior do Trabalho e no Conselho Superior da Justiça do Trabalho.

[2] TST, RR nº 93700-79.2009.5.04.0001, 2ª Turma, Rel. Min. José Roberto Freire Pimenta, julgado em 13.03.2013.

TST, RR nº 8493920125090013, 6º Turma, Rel. Aloysio Corrêa da Veiga, julgado em 05.02.2014.

TRT-13, RO nº 0163600-61.2013.5.13.0001, 1ª Turma, Rel. Juíza Convocada Margarida Alves de Araújo Silva, julgado em 25.01.2015.


3 de novembro de 2020

A PENSÃO PREVIDENCIÁRIA PARA O FILHO INVÁLIDO


                                                         Alexandre Luso de Carvalho

 

Esse tema gera uma série de questionamentos de familiares e amigos de pessoas portadoras de alguma patologia ou deficiência, principalmente, quando o assunto é sustento dessas num futuro, no caso de o provedor da família faltar.

Obviamente o nosso sistema previdenciário, tanto no Regime Geral de Previdência Social (INSS) como nos regimes próprios dos servidores públicos federais, estaduais e municipais, prevê o pensionamento para tais casos.

Em primeiro lugar, é importante abordar um aspecto fundamental para o direito à tal pensão previdenciária: não basta a pessoa ter uma doença e/ou deficiência, mas sim que a patologia/deficiência tenha como sua característica principal a incapacitação da pessoa para atos da vida civil e/ou para o trabalho, tornando-a DEPENDENTE de seus pais, responsáveis ou irmãos. Esse, aliás, é o requisito expresso na própria Lei nº 9.213/1992 (que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social), conforme verifica-se abaixo:

 

Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave;

(...)

III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave;

(...)

§ 2º. O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento.

§ 3º. Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal. 

§ 4º. A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.

  

Outro aspecto importante de ser abordado é que a mencionada Lei nº 9.213/1992 serve de parâmetro, nesse e em outros aspectos, para as legislações dos servidores públicos que têm regimes previdenciários próprios. Isto é, esses seguem o mesmo princípio para a concessão do benefício previdenciário para casos análogos.

Portanto, a partir do que estabelecem as legislações específicas, o direito ao pensionamento previdenciário é verificado a partir do grau da patologia/deficiência e como essa afeta o postulante ao benefício, uma vez que doença/deficiência e incapacidade, na maioria dos casos não são sinônimos.

 Com isso, o primeiro passo para a obtenção do benefício é o pedido administrativo a ser feito no instituto previdenciário competente, devendo ser, em linhas gerais, juntados os seguintes documentos:

 

a) laudo médico atualizado sobre a doença e/ou patologia, indicando se esta é ou não incapacitante, bem como os últimos exames e receituários médicos;

 

b) termo de tutela (caso exista) ou curatela (caso o dependente seja interditado, o que, muitas vezes, é medida necessária antes da solicitação do benefício, dependendo da deficiência ou da doença);

 

c) documentos pessoais do segurado e de seu dependente, bem como outros que forem solicitados.

 

Caso seja indeferido o pedido administrativo, aí, sim, deve ser buscado o Poder Judiciário para a devida análise do caso para concessão ou não do benefício previdenciário.

Aliás, um aspecto importante diz respeito ao momento em que o benefício é requerido, pois muitas vezes o pedido é feito após o falecimento do segurado e, não raro, a própria identificação da incapacidade do postulante à pensão é posterior ao falecimento do segurado. Todavia, cumpre salientar, conforme entendimento jurisprudencial, esse elemento temporal não é óbice para a concessão do benefício.

Assim, em caso de procedência da ação, o Poder Judiciário concederá o benefício previdenciário ao dependente do segurado, determinando a sua imediata inclusão na folha de pagamento da autarquia, bem como o pagamento de valores em atrasos, que, em geral, são calculados da data do pedido administrativo.

Por fim, cumpre frisar que é necessária a análise minuciosa de cada caso para se verificar a real possibilidade de se obter o benefício que irá propiciar o sustento do dependente.

 

 Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

alexandre_luso@yahoo.com.br