Alexandre
Luso de Carvalho
A Constituição Federal de 1988 estabelece que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações (artigo 5º, inciso I), bem como estabelece a proteção da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, inciso III) e a proteção da vida (artigo 5º, caput).
Apesar desses princípios constitucionais, em nosso sistema jurídico havia a possibilidade de utilização de uma tese de defesa em casos de homicídio e/ou graves lesões praticados, principalmente, quando havia a certeza ou a suspeita de adultério ou situações semelhantes: a legítima defesa da honra, que mesmo não estando expressa, tal tese era utilizada quase que em sua totalidade em crimes praticados por homens contra suas namoradas, companheiras e esposas.
O fundamento dessa tese de
defesa tinha é que qualquer bem jurídico pode ser defendido legitimamente,
incluindo a honra, por meio do homicídio, utilizando como suporte legal o
artigo 25 do Código Penal, que estabelece:
Art. 25 - Entende-se em
legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele
injusta agressão, atual ou iminente, a DIREITO seu ou de outrem. (Grifado)
Ocorre que mesmo o direito de matar em defesa da honra ter sido abolido da legislação brasileira em 1830, quando da promulgação do Código Criminal do Império, tal tese, por vezes foi utilizada. Um exemplo disso foi em 1976, quando o jurista Evandro Lins e Silva alegou legítima defesa da honra, no rumoroso caso em que o empresário Raul Fernando do Amaral Street, o Doca Street, matou a socialite Ângela Diniz, tendo sido bem-sucedida no primeiro julgamento.
Entretanto, mesmo tendo pouquíssima adoção nos casos de homicídio e feminicídio, a tese de legítima defesa da honra estava no sistema jurídico brasileiro, humilhando, principalmente, as mulheres e deixando claro que nossa sociedade continua tratando-as como cidadãs a serem subjugadas aos homens. Algo completamente inadmissível.
Assim, no sentido de dar mais um passo, mesmo que tardio, no combate à violência, principalmente contra as mulheres, em 1º.08.2023 em julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 779[1] de forma unânime o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou inconstitucional a tese a legítima defesa da honra e, portanto, baniu de nosso sistema jurídico esse odioso argumento de defesa.
Por fim, impossível não
saudar tal decisão e registrar neste blog, assim como fizeram várias entidades
da sociedade civil organizada e a própria imprensa (em sua grande parte) mais
essa emblemática ruptura com o pensamento e modo de agir arcaico da sociedade
brasileira, deixando, como últimas palavras, as proferidas pelas Ministras CÁRMEN LÚCIA e ROSA WEBER,
respectivamente, no mencionado julgamento:
“A sociedade ainda hoje é machista, sexista, misógina e mata
mulheres apenas porque elas querem ser donas de suas vidas”. (Cármen Lúcia)
“(...) não há espaço para a restauração dos costumes medievais e desumanos do passado pelos quais tantas mulheres foram vítimas da violência e do abuso em defesa da ideologia patriarcal fundada no pressuposto da superioridade masculina pela qual se legitima a eliminação da vida de mulheres”. (Rosa Weber)
Alexandre Luso de Carvalho
OAB/RS nº 44.808
Nossaaa que artigo! Chega de tanta violência contra as mulheres, meu Deus 🙌❤️
ResponderExcluirFico feliz que tenhas gostado do artigo!
ExcluirÉ dever de todos nós lutarmos contra tudo o que signifique desrespeito aos direitos das mulheres.
Quem diria , algo sensato, corretíssimo.
ResponderExcluirExcelente, Alexandre! Temos mesmo que divulgar esta "conquista"!
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