Alexandre Luso de Carvalho
I – INTRODUÇÃO
Para quem está envolvido em relações de trabalho que tenham ou possam ter características de vínculo de emprego, até a Reforma Trabalhista de 2017 (Lei nº 13.467/2017), um dos problemas era a finalização da relação laboral de forma amigável por meio de acordo.
Essa
dificuldade de terminar a relação laboral ocorria em razão da ausência de
previsão legal e, portanto, da falta de validade do acordo realizado extrajudicialmente,
o que levava as partes envolvidas aos seguintes riscos:
a) por parte do empregador: despedir
o funcionário, arriscando-se a sofrer uma ação trabalhista após o pagamento e
acabar pagando duas vezes;
b) por parte do empregado: de
não receber todos os seus direitos, tendo que ajuizar a ação trabalhista e, por
vezes, tendo o risco de perder o direito de ação devido ao prazo prescricional
(dois anos a contar do término do contrato).
Com isso, infelizmente ocorriam episódios de ajuizamentos de ações trabalhistas nas quais os empregados e empregadores combinavam de simular um litígio – mesmo que não quisessem – para que na audiência de conciliação fizessem o acordo. Ocorre que mais do que uma hipocrisia judicial em sua manifestação mais explícita, tal prática se tratava de um ilícito processual (litigância de má-fé) e ético por parte dos advogados e disciplinar por parte do magistrado, caso, identificando a simulação, não a coibisse.
Essa
simulação – explicando, mas não justificando – ocorria também, a meu ver, por um não
acompanhamento da legislação trabalhista (CLT) à evolução das relações
trabalhistas e à própria filosofia do Poder Judiciário de incentivar os acordos,
no sentido de diminuir os litígios judiciais e aliviar a sobrecarga processual
existente, bem como a demora na solução dos problemas e os custos para as
partes, resultantes dos processos. Só para se ter ideia, em 2016 – um ano antes
da Reforma Trabalhista – no Brasil, foram ajuizadas mais de 3 milhões de ações
perante a Justiça do Trabalho, conforme reportagem do site Exame.com[1]. Não há
estrutura que dê conta.
II – DA IMPLEMENTAÇÃO DO ACORDO EXTRAJUDICIAL
A
Reforma Trabalhista trouxe a possibilidade da realização de acordos
extrajudiciais, homologados pela Justiça do Trabalho, pois passou-se a ter a
previsão legal para tal, com a inclusão dos seguintes dispositivos legais na
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT):
Art. 855-B. O processo de homologação de acordo
extrajudicial terá início por petição conjunta, sendo obrigatória a
representação das partes por advogado.
§ 1o As partes não poderão ser
representadas por advogado comum.
§ 2o Faculta-se ao trabalhador ser assistido
pelo advogado do sindicato de sua categoria.
Art. 855-C. O disposto neste Capítulo não prejudica o prazo estabelecido no §6º do art. 477 desta Consolidação e não afasta a aplicação da multa prevista no § 8o art. 477 desta Consolidação.
Art. 855-D. No prazo de quinze dias a contar da
distribuição da petição, o juiz analisará o acordo, designará audiência se
entender necessário e proferirá sentença.
Art. 855-E. A petição de homologação de acordo
extrajudicial suspende o prazo prescricional da ação quanto aos direitos nela
especificados.
Parágrafo único. O prazo prescricional voltará a fluir no
dia útil seguinte ao do trânsito em julgado da decisão que negar a homologação
do acordo.
Um aspecto importante de ser abordado é que não são somente as relações laborais já com Carteira de Trabalho anotada é que podem ser submetidas ao acordo extrajudicial homologado pelo Poder Judiciário, mas também aquelas sem vínculo reconhecido também passaram a ter a possibilidade de uma resolução por tal meio.
Todavia,
vale destacar que apesar de o juiz, no geral, não interferir nas cláusulas do acordo
a ele é vedado homologar um acordo ou cláusulas que:
a) estabeleça verbas
estranhas ao contrato de trabalho já existente;
b) em que o trabalhador
renuncie totalmente aos direitos trabalhistas, principalmente os indisponíveis
(quando já houver vínculo ou pedido de vínculo);
c) cause lesão ao INSS e/ou ao Fisco. Acerca desse ponto, cabe salientar
que a Lei nº 13.876/2019
alterou o artigo 832[2] da CLT nesse sentido, impedindo que nesses acordos fossem atribuídas a essas verbas o
caráter exclusivamente indenizatório, o que acarretaria a isenção de recolhimentos
previdenciários e isenção do imposto de renda. Essa
alteração na lei, diga-se, já era uma tendência jurisprudencial.
Com isso, a partir da intenção das partes em realizarem o acordo, cabem a essas estabelecerem, por
meio de seus advogados – lembrando que cada parte deverá ter seu advogado
– as cláusulas do acordo, com a
discriminação dos cálculos e dos valores a serem pagos.
III
– CONCLUSÃO
Assim, a partir do que foi resumidamente exposto, o que se verifica é que para a validade do acordo trabalhista ainda é necessária a participação do Poder Judiciário Trabalhista, por meio da homologação, para assegurar os efeitos jurídicos e dar segurança a todos.
Todavia, com a modificação implementada pela Reforma Trabalhista de 2017, o que ocorreu é que se
legalizou uma prática que antes era mascarada pela lide simulada e
instrumentalizou o incentivo à saudável prática conciliatória, que significa
menos custos para o empregador, menos espera para o empregado ou prestador de
serviço em situação análoga, bem como um alívio ao já sobrecarregado sistema
judicial, pois o que seria um processo lento, passa a ser finalizado, a
princípio em aproximadamente trinta dias após o seu ajuizamento. Portanto, todos
ganham.
Alexandre
Luso de Carvalho
OAB/RS
nº 44.808
[1] https://exame.com/economia/em-2016-brasil-ganha-3-milhoes-de-acoes-trabalhistas/
[2] CLT, Art. 832 - Da decisão deverão constar o
nome das partes, o resumo do pedido e da defesa, a apreciação das provas, os
fundamentos da decisão e a respectiva conclusão. (...) § 3o As
decisões cognitivas ou homologatórias deverão sempre indicar a natureza jurídica
das parcelas constantes da condenação ou do acordo homologado, inclusive o
limite de responsabilidade de cada parte pelo recolhimento da contribuição
previdenciária, se for o caso. § 3º-A. Para os fins do § 3º deste
artigo, salvo na hipótese de o pedido da ação limitar-se expressamente ao
reconhecimento de verbas de natureza EXCLUSIVAMENTE
indenizatória, a parcela referente às verbas de natureza remuneratória não
poderá ter como base de cálculo valor inferior: I - ao salário-mínimo, para as competências que integram o vínculo
empregatício reconhecido na decisão cognitiva ou homologatória; ou II - à diferença
entre a remuneração reconhecida como devida na decisão cognitiva ou
homologatória e a efetivamente paga pelo empregador, cujo valor total referente
a cada competência não será inferior ao salário-mínimo. § 3º-B Caso haja piso
salarial da categoria definido por acordo ou convenção coletiva de trabalho, o
seu valor deverá ser utilizado como base de cálculo para os fins do § 3º-A
deste artigo.
Casos que só se podem resolver com a ajuda de um bom advogado e nem sempre se tem a sorte de o encontrar.
ResponderExcluirO artigo tem advertências importantes e acessíveis à interpretação de um leigo.
Sucesso e felicidades. Beijos, Alexandre.
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Boa tarde, Majo Dutra.
ResponderExcluirÉ sempre necessário ter um advogado de confiança e que, acima de tudo, tenha critério na análise das situações e elaboração dos termos de acordo.
Obrigado pela leitura.
Grande abraço!