6 de junho de 2021

O ACORDO TRABALHISTA EXTRAJUDICIAL


 

Alexandre Luso de Carvalho

 

I – INTRODUÇÃO

  

Para quem está envolvido em relações de trabalho que tenham ou possam ter características de vínculo de emprego, até a Reforma Trabalhista de 2017 (Lei nº 13.467/2017), um dos problemas era a finalização da relação laboral de forma amigável por meio de acordo. 

Essa dificuldade de terminar a relação laboral ocorria em razão da ausência de previsão legal e, portanto, da falta de validade do acordo realizado extrajudicialmente, o que levava as partes envolvidas aos seguintes riscos:

 

a) por parte do empregador: despedir o funcionário, arriscando-se a sofrer uma ação trabalhista após o pagamento e acabar pagando duas vezes;

 

b) por parte do empregado: de não receber todos os seus direitos, tendo que ajuizar a ação trabalhista e, por vezes, tendo o risco de perder o direito de ação devido ao prazo prescricional (dois anos a contar do término do contrato).

 

Com isso, infelizmente ocorriam episódios de ajuizamentos de ações trabalhistas nas quais os empregados e empregadores combinavam de simular um litígio – mesmo que não quisessem – para que na audiência de conciliação fizessem o acordo. Ocorre que mais do que uma hipocrisia judicial em sua manifestação mais explícita, tal prática se tratava de um ilícito processual (litigância de má-fé) e ético por parte dos advogados e disciplinar por parte do magistrado, caso, identificando a simulação, não a coibisse. 

Essa simulação – explicando, mas não justificando – ocorria também, a meu ver, por um não acompanhamento da legislação trabalhista (CLT) à evolução das relações trabalhistas e à própria filosofia do Poder Judiciário de incentivar os acordos, no sentido de diminuir os litígios judiciais e aliviar a sobrecarga processual existente, bem como a demora na solução dos problemas e os custos para as partes, resultantes dos processos. Só para se ter ideia, em 2016 – um ano antes da Reforma Trabalhista – no Brasil, foram ajuizadas mais de 3 milhões de ações perante a Justiça do Trabalho, conforme reportagem do site Exame.com[1]. Não há estrutura que dê conta.

  

II – DA IMPLEMENTAÇÃO DO ACORDO EXTRAJUDICIAL

 

A Reforma Trabalhista trouxe a possibilidade da realização de acordos extrajudiciais, homologados pela Justiça do Trabalho, pois passou-se a ter a previsão legal para tal, com a inclusão dos seguintes dispositivos legais na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT):

 

Art. 855-B.  O processo de homologação de acordo extrajudicial terá início por petição conjunta, sendo obrigatória a representação das partes por advogado.

§ 1o  As partes não poderão ser representadas por advogado comum.

§ 2o  Faculta-se ao trabalhador ser assistido pelo advogado do sindicato de sua categoria.

 

Art. 855-C.  O disposto neste Capítulo não prejudica o prazo estabelecido no §6º do art. 477 desta Consolidação e não afasta a aplicação da multa prevista no § 8 art. 477 desta Consolidação.

 

Art. 855-D.  No prazo de quinze dias a contar da distribuição da petição, o juiz analisará o acordo, designará audiência se entender necessário e proferirá sentença.

 

Art. 855-E.  A petição de homologação de acordo extrajudicial suspende o prazo prescricional da ação quanto aos direitos nela especificados.

Parágrafo único.  O prazo prescricional voltará a fluir no dia útil seguinte ao do trânsito em julgado da decisão que negar a homologação do acordo.

 

Um aspecto importante de ser abordado é que não são somente as relações laborais já com Carteira de Trabalho anotada é que podem ser submetidas ao acordo extrajudicial homologado pelo Poder Judiciário, mas também aquelas sem vínculo reconhecido também passaram a ter a possibilidade de uma resolução por tal meio. 

Todavia, vale destacar que apesar de o juiz, no geral, não interferir nas cláusulas do acordo a ele é vedado homologar um acordo ou cláusulas que:

 

a) estabeleça verbas estranhas ao contrato de trabalho já existente;

 

b) em que o trabalhador renuncie totalmente aos direitos trabalhistas, principalmente os indisponíveis (quando já houver vínculo ou pedido de vínculo);

 

c) cause lesão ao INSS e/ou ao Fisco. Acerca desse ponto, cabe salientar que a Lei nº 13.876/2019 alterou o artigo 832[2] da CLT nesse sentido, impedindo que nesses acordos fossem atribuídas a essas verbas o caráter exclusivamente indenizatório, o que acarretaria a isenção de recolhimentos previdenciários e isenção do imposto de renda. Essa alteração na lei, diga-se, já era uma tendência jurisprudencial.

 

Com isso, a partir da intenção das partes em realizarem o acordo, cabem a essas estabelecerem, por meio de seus advogados – lembrando que cada parte deverá ter seu advogado –  as cláusulas do acordo, com a discriminação dos cálculos e dos valores a serem pagos.

  

III – CONCLUSÃO

 

Assim, a partir do que foi resumidamente exposto, o que se verifica é que para a validade do acordo trabalhista ainda é necessária a participação do Poder Judiciário Trabalhista, por meio da homologação, para assegurar os efeitos jurídicos e dar segurança a todos. 

Todavia, com a modificação implementada pela Reforma Trabalhista de 2017, o que ocorreu é que se legalizou uma prática que antes era mascarada pela lide simulada e instrumentalizou o incentivo à saudável prática conciliatória, que significa menos custos para o empregador, menos espera para o empregado ou prestador de serviço em situação análoga, bem como um alívio ao já sobrecarregado sistema judicial, pois o que seria um processo lento, passa a ser finalizado, a princípio em aproximadamente trinta dias após o seu ajuizamento. Portanto, todos ganham.


Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

alexandre_luso@yahoo.com.br



[1] https://exame.com/economia/em-2016-brasil-ganha-3-milhoes-de-acoes-trabalhistas/

[2] CLT, Art. 832 - Da decisão deverão constar o nome das partes, o resumo do pedido e da defesa, a apreciação das provas, os fundamentos da decisão e a respectiva conclusão. (...) § 3o As decisões cognitivas ou homologatórias deverão sempre indicar a natureza jurídica das parcelas constantes da condenação ou do acordo homologado, inclusive o limite de responsabilidade de cada parte pelo recolhimento da contribuição previdenciária, se for o caso. § 3º-A.  Para os fins do § 3º deste artigo, salvo na hipótese de o pedido da ação limitar-se expressamente ao reconhecimento de verbas de natureza EXCLUSIVAMENTE indenizatória, a parcela referente às verbas de natureza remuneratória não poderá ter como base de cálculo valor inferior: I - ao salário-mínimo, para as competências que integram o vínculo empregatício reconhecido na decisão cognitiva ou homologatória; ou II - à diferença entre a remuneração reconhecida como devida na decisão cognitiva ou homologatória e a efetivamente paga pelo empregador, cujo valor total referente a cada competência não será inferior ao salário-mínimo. § 3º-B Caso haja piso salarial da categoria definido por acordo ou convenção coletiva de trabalho, o seu valor deverá ser utilizado como base de cálculo para os fins do § 3º-A deste artigo.


2 comentários:

  1. Casos que só se podem resolver com a ajuda de um bom advogado e nem sempre se tem a sorte de o encontrar.
    O artigo tem advertências importantes e acessíveis à interpretação de um leigo.
    Sucesso e felicidades. Beijos, Alexandre.
    ~~~~

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  2. Boa tarde, Majo Dutra.

    É sempre necessário ter um advogado de confiança e que, acima de tudo, tenha critério na análise das situações e elaboração dos termos de acordo.

    Obrigado pela leitura.

    Grande abraço!

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