20 de novembro de 2022

O DEVER DA FAMÍLIA ASSISTIR AOS SEUS IDOSOS


 

Alexandre Luso de Carvalho

 

Quando se fala em pensão de alimentos, automaticamente pensamos no valor pago pelos pais (pai ou mãe) aos filhos ou, não tão comumente, no valor pago pelos avós aos netos. Todavia, essa obrigação de assistência alimentar não se resume a tais casos: os pais e avós também podem pleitear alimentos junto aos filhos e até aos netos. 

O Código Civil é bem claro quanto ao dever de assistência entre parentes:

 

Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação. 

Art. 1.695. São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento. 

Art. 1.696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros.

 

O dever de assistência alimentar aos idosos (pessoas com idade igual ou superior aos 60 anos), começa pela Constituição Federal, tanto por um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, que é a dignidade da pessoa humana (artigo 1º, inciso III[1]), como pelo artigo 229 que expressamente dispõe:

 

Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.

 

A partir desses princípios constitucionais, mais especificamente, o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003), já nos artigos 2º, 3º e 4º, estabelece:

 

Art. 2º A pessoa idosa goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhe, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, para preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade. 

Art. 3º É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do poder público assegurar à pessoa idosa, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária. 

Art. 4º Nenhuma pessoa idosa será objeto de qualquer tipo de negligência, discriminação, violência, crueldade ou opressão, e todo atentado aos seus direitos, por ação ou omissão, será punido na forma da lei.

 

Tais dispositivos legais têm seu inegável reconhecimento pelos Tribunais do País, que determinam a assistência aos idosos por meio da pensão de alimentos, seja por um dos descendentes deste ou por vários, como coobrigados, conforme se vê abaixo:

 

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE ALIMENTOS PROPOSTA PELA MÃE EM FACE DE SEUS FILHOS. CHAMAMENTO DE OUTRAS FILHAS PARA INTEGRAR A LIDE. ESTATUTO DO IDOSO. NATUREZA SOLIDÁRIA. INVIABILIDADE. I - A obrigação alimentar, via de regra, é conjunta e, sendo várias pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos. Se intentada a ação contra uma delas, as demais poderão ser chamadas a integrar a lide, conforme estabelece o art. 1.698 do Código Civil. II – Na hipótese de ação de alimentos devidos a idoso, todavia, o art. 12 da Lei nº 10.741/2003 (Estatuto do Idoso) preconiza que a obrigação alimentar é solidária, podendo o alimentando optar entre os prestadores, de modo que é inviável o ingresso de outros coobrigados no processo. III – Negou-se provimento ao recurso. (TJDF, AGI: 20140020134148 DF 0013512-93.2014.8.07.0000, 6ª Turma Cível, Rel. Des. José Divino de Oliveira, julgado em 12.11.2014) 

 

Assim, é importante ficar claro é que além de ser uma obrigação moral – o que já deveria bastar – a assistência ao idoso pela família, é uma obrigação legal. Com isso, não há o que o idoso se constranger em pleitear a pensão de alimentos ou quem tenha tal poder (seu curador ou seu procurador) junto ao familiar ou aos familiares para que sozinho ou em conjunto venham a prover o sustento dos pais ou dos avós. 

  

Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

alexandre_luso@yahoo.com.br


Fonte da imagem: Depositphotos


[1] Constituição Federal de 1988, Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) III - a dignidade da pessoa humana;


6 de novembro de 2022

O ABUSO NA COBRANÇA DE DÍVIDAS POR TELEFONE


 

Alexandre Luso de Carvalho 

 

Na mesma medida em que o acesso ao crédito e às compras parceladas aumentou, também cresceram os serviços de cobrança realizados diretamente pelas empresas credoras e por empresas terceirizadas. Até aí nenhum problema. Ocorre que a maioria (senão a totalidade) desses serviços e empresas de cobrança utilizam métodos abusivos na abordagem aos devedores, seja por meio de cartas, e-mails e SMS, seja por meio de ligações telefônicas.

Dentre os meios de cobranças, as que ocorrem via ligações telefônicas onde vemos os maiores abusos, uma vez que um devedor, por exemplo, pode receber dezenas de ligações por dia, nos sete dias da semana e a qualquer horário; ou em vários casos a pessoa que recebe a ligação nem sequer é a devedora. Essa abusividade, importante ressaltar, é proibida pelo Código de Defesa do Consumidor, conforme vê-se abaixo:

 

Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:

(...)

VI - coibição e repressão eficientes de todos os abusos praticados no mercado de consumo, inclusive a concorrência desleal e utilização indevida de inventos e criações industriais das marcas e nomes comerciais e signos distintivos, que possam causar prejuízos aos consumidores;

(...)

Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.

(...)

Art. 71. Utilizar, na cobrança de dívidas, de ameaça, coação, constrangimento físico ou moral, afirmações falsas incorretas ou enganosas ou de qualquer outro procedimento que exponha o consumidor, injustificadamente, a ridículo ou interfira com seu trabalho, descanso ou lazer:

Pena – Detenção de três meses a um ano e multa.

 

Todavia, apesar do que estabelece o Código de Defesa do Consumidor, as práticas abusivas na cobrança de dívidas continuam a abarrotar os PROCONs e o Poder Judiciário. Em razão disso, nessa semana (03.11.2022) a ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicações) aprovou o uso do código 0304 antes do número do telefone, identificando as chamadas de serviços de cobrança. Assim, o devedor poderá decidir se atende ou não a ligação, uma vez que saberá sobre o que se trata. 

No entanto, vale destacar que a “Anatel realizará consulta pública, durante 60 dias, para regulamentar o procedimento operacional e após a publicação de ato pela Agência as empresas terão 180 dias para implementar a medida”, conforme consta em nota à imprensa. Ou seja, o consumidor ainda aguardará 240 dias para ter essa medida entrando em vigor. 

Apesar desse importante instrumento que será proporcionado ao consumidor, nunca se pode deixar de ter em mente dois fatos:

 

a)   é direito dos credores cobrar (sem abusividade) e, portanto, esses serviços continuarão;

 

b)  a abusividade na cobrança não desaparecerá. Só será atenuada, pois as empresas provavelmente já estão buscando outras maneiras de “infernizar” a vida dos devedores.

 

Com isso, é fundamental que o consumidor sempre que necessário continue a buscar o PROCON e/ou o Poder Judiciário para proteger-se dessas abusividades. Entretanto, para ter êxito nessa busca pela proteção legal é essencial:

 

a)   fazer a captura da tela do celular (screenshot) com as mensagens de SMS e WhatsApp enviados e/ou números da empresa que ligou, em todas as vezes que isso ocorrer;

 

b)  anotar o nome da empresa de cobrança, da empresa credora, os números de protocolos de ligações de reclamações que o consumidor fizer para essas empresas, anotando, também, a data e horário.

 

Assim, tendo consciência de que não pode ser objeto de abusividade na cobrança de dívida e coletando as provas de que isso acontece, o consumidor devedor poderá restabelecer, ao menos, um mínimo de tranquilidade em sua vida buscando tanto o PROCON como o Poder Judiciário para que as empresas cessem o abuso e, dependendo de cada caso, até indenizem quem está sendo perturbado pela avalanche de ligações. 

 

Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

alexandre_luso@yahoo.com.br


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