29 de julho de 2023

NOVAS REGRAS PARA OS COLECIONADORES DE ARMAS, CAÇADORES E ATIRADORES


 

Alexandre Luso de Carvalho

 

Um dos assuntos que tem movimentado os noticiários diz respeito às novas regras para a aquisição de armas e munições pelos colecionadores, caçadores e colecionadores, os famosos CAC’s.

 

Todavia, muito desse debate, não raro marcado pela cólera das partes envolvidas, é calcado nos comentários de jornalistas e de influenciadores, sendo carente de informações acerca da cronologia das legislações – principalmente a do Governo anterior e a do atual –, o que causa uma impressão distorcida acerca do tema.

 

Tal controvérsia inicia no Governo de Jair Bolsonaro, quando foi publicado o Decreto nº 9.846/2019, que  regulamentou a Lei nº 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento)[1], para dispor sobre o registro, o cadastro e a aquisição de armas e de munições por caçadores, colecionadores e atiradores, sendo, posteriormente, publicado o Decreto nº 10.629/2021, que alterou o anterior em alguns aspectos. Nesses dois decretos estão dispostas uma série de flexibilizações quanto à aquisição, pelos CAC’s, de armas e munições, tanto no que tange aos modelos, como à quantidade de armas e munições com a compra permitidas, incluindo armamentos e munições de uso restrito, como, por exemplo fuzis semiautomáticos, e armas de grosso calibre, conforme vê-se abaixo:

a) arma de fogo de uso permitido - as armas de fogo semiautomáticas ou de repetição que sejam de porte (exemplos: revólveres de calibres 22, 32, 38; pistolas 380 e armas de calibre 12, com a aquisição permitida antes dos mencionados decretos): 


 


b) arma de fogo de uso restrito - as armas de fogo automáticas, semiautomáticas ou de repetição que sejam: não portáteis; de porte, ou portáteis de alma raiada (exemplos: pistola .40, pistola 9mm, revólver .45, pistola .45, revólver .44 Magnum, revolver .357, espingarda calibre 12 cano serrado e semiautomática, carabinas semiautomáticas .40 ou 9mm e fuzis semiautomáticos T4), com a aquisição permitida pelos CAC’s:

 




Com o advento da campanha presidencial de 2022, uma das bandeiras de campanha do então candidato Luiz Inácio Lula Silva era a reformulação da política em relação ao acesso às armas de fogo, dentre eles os CAC’s, restringindo esse acesso tanto no que diz respeito aos modelos e quantidades de armas e munições, além de outras medidas, muito sob os argumentos de:

 

a)   ineficiência do Exército na fiscalização dessa categoria (em 2022 foram fiscalizados menos de 3% dos CAC’s[2]), o que leva ao desconhecimento da quantidade de armas em poder dos CAC’s[3];

 

b)  de que parte do arsenal, em razão da incapacidade de fiscalização estaria sendo revendida ao crime organizado[4]., até porque se for bem analisado, houve, em quatro anos de flexibilização, um aumento muito grande na aquisição de armas sob a alegação de ser destinado aos CAC’s (entre 2019 e 2022 entraram em circulação no  Brasil 1.354.751 armas[5]).

 

Com isso, já em seu primeiro dia de governo, o atual Presidente assinou o Decreto nº 11.366/2023, que:

 

a)   suspendeu os registros para a aquisição e transferência de armas e de munições de uso restrito por CAC’s;

 

b)  restringiu os quantitativos de aquisição de armas e de munições de uso permitido, suspendeu a concessão de novos registros de clubes e de escolas de tiro;

 

c)   suspendeu a concessão de novos registros de colecionadores, de atiradores e de caçadores, e instituiu grupo de trabalho para apresentar nova regulamentação à Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003.

 

Como sequência, em 21.07.2023 foi publicado o Decreto nº 11.615/2023 que (sic) “Regulamenta a Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, para estabelecer regras e procedimentos relativos à aquisição, ao registro, à posse, ao porte, ao cadastro e à comercialização nacional de armas de fogo, munições e acessórios, disciplinar as atividades de caça excepcional, de caça de subsistência, de tiro desportivo e de colecionamento de armas de fogo, munições e acessórios, disciplinar o funcionamento das entidades de tiro desportivo e dispor sobre a estruturação do Sistema Nacional de Armas - Sinarm”. 

Assim, num quadro comparativo entre a regulamentação existente no Governo Bolsonaro e a nova regra, especificamente sobre os CAC’s, dispõe entre os artigos 30 a 45, fazendo as seguintes modificações[6]:

 



Ocorre que nesse debate, muitos dizem que se está impedindo o acesso às armas para defesa pessoal do cidadão. Entretanto, há um equívoco em tal afirmação. O que ocorreu foi a adoção de critérios mais rigorosos para tais permissões (aquisição e porte), algo que já se via anteriormente à flexibilização feita pelo Governo anterior. Vejamos o que o Decreto nº 11.615/2023 (do Governo atual) modificou no decreto passado quanto à aquisição de armas para defesa pessoal, por meio do quadro



 

Assim, para concluir, quando falamos do maior rigor ao acesso à compra de armamentos e munições pelos CAC’s, vale observar: a) tal rigor não significa restringir o direito à autodefesa da população, mas significa tornar mais restrita, aí sim, a aquisição de armas de coleção e/ou tiro desportivo, o que é completamente diferente; b) o cidadão comum não precisa de fuzis semiautomáticos ou armas de grosso calibre e cinco mil munições por ano para proteger-se e tampouco como artigo de coleção ou caça ou tiro desportivo – até porque não existe “tiro olímpico de fuzil”, por exemplo; c) o Exército Brasileiro já se mostrou incapaz de realizar a fiscalização do número de armas e munições nas mãos dos CAC’s, bem como a Polícia Federal, pois o seu efetivo não é suficiente para tal. 

 

Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808 

 

alexandre_luso@yahoo.com.br


Fonte da imagem: imagem livre da internet



[1] Lei nº 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento): Dispõe sobre registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição, sobre o Sistema Nacional de Armas – Sinarm, define crimes e dá outras providências.

[5] Fonte: https://www.brasildefato.com.br/2023/02/14/mais-de-um-milhao-de-armas-entrou-em-circulacao-durante-governo-bolsonaro#:~:text=ca%C3%A7adores%20de%20subsist%C3%AAncia.-,Os%20dados%20mostram%20que%20o%20n%C3%BAmero%20de%20armas%20em%20circula%C3%A7%C3%A3o,Em%202020%2C%20268.163%20armas.

[6] https://www.gov.br/mj/pt-br/assuntos/noticias/decreto-sobre-o-controle-de-armas-e-assinado-pelo-presidente-lula


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