31 de agosto de 2025

SENADO APROVA PROJETO DE LEI QUE PROTEGE CRIANÇAS CONTRA EXPLORAÇÃO NA INTERNET



Alexandre Luso de Carvalho 

 

I - INTRODUÇÃO

 

Uma preocupação que faz parte do cotidiano de muitos pais – ao menos os mais conscientes e responsáveis – é o tempo no qual crianças e adolescentes passam nas redes sociais assistindo vídeos e seguindo “influenciadores” que não se sabe de onde saíram e cujos conteúdos muitas vezes são impróprios para tais faixas etárias, o que acaba por expô-las a uma série de riscos, tanto na sua formação, como de sua imagem, de sua integridade física e emocional.

 

II – LEGISLAÇÃO DE PROTEÇÃO ÀS CRIANÇAS E ADOLESCENTES

 

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em seus artigos 17 e 18, expressamente determina a proteção da imagem e da inviolabilidade física e psíquica de crianças e adolescentes, conforme verificado abaixo:

 

Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais. 

Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor.

 

A partir disso, o ECA também estabelece punições contra crimes que atentem contra a imagem e integridade de crianças e adolescentes em vários meios de comunicação, dentre eles a internet, conforme vê-se a seguir:

 

Art. 240.  Produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, cena de sexo explícito ou pornográfica, envolvendo criança ou adolescente:

Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.

§ 1º Incorre nas mesmas penas quem:

I - agencia, facilita, recruta, coage ou de qualquer modo intermedeia a participação de criança ou adolescente nas cenas referidas no caput deste artigo, ou ainda quem com esses contracena;

II - exibe, transmite, auxilia ou facilita a exibição ou transmissão, em tempo real, pela internet, por aplicativos, por meio de dispositivo informático ou qualquer meio ou ambiente digital, de cena de sexo explícito ou pornográfica com a participação de criança ou adolescente.

§ 2 Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se o agente comete o crime:

I – no exercício de cargo ou função pública ou a pretexto de exercê-la;

II – prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade; ou

III – prevalecendo-se de relações de parentesco consanguíneo ou afim até o terceiro grau, ou por adoção, de tutor, curador, preceptor, empregador da vítima ou de quem, a qualquer outro título, tenha autoridade sobre ela, ou com seu consentimento.

 

Art. 241.  Vender ou expor à venda fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente:

Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.

 

Art. 241-A.  Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar por qualquer meio, inclusive por meio de sistema de informática ou telemático, fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente:

Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.

§ 1 Nas mesmas penas incorre quem:

I – assegura os meios ou serviços para o armazenamento das fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput deste artigo;

II – assegura, por qualquer meio, o acesso por rede de computadores às fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput deste artigo.

§ 2 As condutas tipificadas nos incisos I e II do § 1 deste artigo são puníveis quando o responsável legal pela prestação do serviço, oficialmente notificado, deixa de desabilitar o acesso ao conteúdo ilícito de que trata o caput deste artigo.

 

Art. 241-B.  Adquirir, possuir ou armazenar, por qualquer meio, fotografia, vídeo ou outra forma de registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

§ 1 A pena é diminuída de 1 (um) a 2/3 (dois terços) se de pequena quantidade o material a que se refere o caput deste artigo.

§ 2 Não há crime se a posse ou o armazenamento tem a finalidade de comunicar às autoridades competentes a ocorrência das condutas descritas nos arts. 240, 241, 241-A e 241-C desta Lei, quando a comunicação for feita por:

I – agente público no exercício de suas funções;

II – membro de entidade, legalmente constituída, que inclua, entre suas finalidades institucionais, o recebimento, o processamento e o encaminhamento de notícia dos crimes referidos neste parágrafo;

III – representante legal e funcionários responsáveis de provedor de acesso ou serviço prestado por meio de rede de computadores, até o recebimento do material relativo à notícia feita à autoridade policial, ao Ministério Público ou ao Poder Judiciário.

§ 3 As pessoas referidas no § 2 deste artigo deverão manter sob sigilo o material ilícito referido. 


Art. 241-C.  Simular a participação de criança ou adolescente em cena de sexo explícito ou pornográfica por meio de adulteração, montagem ou modificação de fotografia, vídeo ou qualquer outra forma de representação visual:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.

Parágrafo único.  Incorre nas mesmas penas quem vende, expõe à venda, disponibiliza, distribui, publica ou divulga por qualquer meio, adquire, possui ou armazena o material produzido na forma do caput deste artigo. 


Art. 241-D.  Aliciar, assediar, instigar ou constranger, por qualquer meio de comunicação, criança, com o fim de com ela praticar ato libidinoso:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.

Parágrafo único.  Nas mesmas penas incorre quem:

I – facilita ou induz o acesso à criança de material contendo cena de sexo explícito ou pornográfica com o fim de com ela praticar ato libidinoso;

II – pratica as condutas descritas no caput deste artigo com o fim de induzir criança a se exibir de forma pornográfica ou sexualmente explícita. 


Art. 241-E.  Para efeito dos crimes previstos nesta Lei, a expressão “cena de sexo explícito ou pornográfica” compreende qualquer situação que envolva criança ou adolescente em atividades sexuais explícitas, reais ou simuladas, ou exibição dos órgãos genitais de uma criança ou adolescente para fins primordialmente sexuais. 


Art. 242. Vender, fornecer ainda que gratuitamente ou entregar, de qualquer forma, a criança ou adolescente arma, munição ou explosivo:

Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos.

 

Com isso, em tese, as autoridades (Conselho Tutelar, Polícia, Ministério Público e Poder Judiciário) passaram a ter mais condições de coibir, investigar e punir os crimes dessa natureza contra crianças e adolescentes.

 

III – DO AUMENTO DOS CASOS DE EXPLORAÇÃO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO MEIO VIRTUAL

 

Apesar de todo o esforço e melhoria dos entes no combate à exploração infantil, também no ambiente virtual, a verdadeira imersão de crianças e adolescentes nas redes sociais ultrapassou a linha da inutilidade do conteúdo produzido para a formação cultural e adentrou o perigosíssimo e tenebroso território do uso indevido de suas imagens. E as informações são extremamente preocupantes, conforme pode ser visto no site Agência Brasil[1], em 20.08.2025:

 

Um relatório divulgado nesta quarta-feira (20) pela SaferNet revelou que entre 1º de janeiro e 31 de julho deste ano foram registradas 49.336 denúncias anônimas de abuso e exploração sexual infantil na internet. Isso significou um crescimento de 18,9% em relação ao mesmo período de 2024.

As denúncias recebidas este ano correspondem a 64% de todas as notificações de crimes cibernéticos recebidas pela SaferNet no período, que engloba ainda outros crimes como racismo e violência contra a mulher, por exemplo.

Segundo a organização, os dados confirmam o agravamento da violência contra crianças e adolescentes no ambiente digital.

Um dos pontos que chamou a atenção é o uso crescente de inteligência artificial para criar conteúdo com abuso sexual infantil, tanto por meio da manipulação de imagens reais quanto pela produção de materiais hiper-realistas, como fotografias manipuladas, deepfakes e imagens artificiais criadas a partir de comandos de texto. 

 

Ou seja, mesmo com a proteção já existente no Estatuto da Criança e do Adolescente a exploração de crianças e adolescentes, atualmente chamada de “adultização” aumentou, também, em razão a uma lacuna muito importante: a falta de um regramento mais rígido e específico em relação às plataformas de redes sociais quando se tratar dos conteúdos envolvendo tal público.

 

IV – DA APROVAÇÃO DO PROJETO DE LEI 2628/2022

 

Conforme já dito, a falta de um regramento rígido e específico para as redes sociais em relação à proteção das crianças e adolescentes se mostrou algo preocupante para parte dos legisladores – ao menos os que entendem que internet não é um “território” com liberdades absolutas e fora do alcance da tutela do Estado. Com isso, já no ano de 2022 o Senador Alessandro Vieira (MDB/SE) enviou ao Plenário o Projeto de Lei nº 2628 que “Dispõe sobre a proteção de crianças e adolescentes em ambientes digitais.” 

Entretanto, de 2022 até a agosto de 2025 tal Projeto de Lei estava tramitando morosamente na burocracia do Congresso Nacional até que em razão do vídeo postado pelo youtuber e influenciador digital Felipe Bressanim Pereira, o Felca, essa lenta tramitação legislativa foi acelerada, também pelo clamor popular, e teve sua aprovação na Câmara dos Deputados e quase unânime no Senado – quatro senadores votaram contra: Carlos Portinho (PL/RJ), Jaime Bagattoli (PL/RO), Eduardo Girão (Novo/CE) e Luís Carlos Heinze (PP/RS). Assim, dia 29.08.2025 o texto foi enviado ao Presidente da República para a sanção (aprovação) ou veto, cujo prazo para tal decisão vai até 18.09.2025. 

Mas, quais as novidades do Projeto de Lei 2628/2022 – também chamado de ECA Digital – na proteção contra a exploração de crianças e adolescentes no ambiente digital? Vejamos os principais aspectos, conforme veiculado pelo site do Senado[2]:

 

Remoção de conteúdo 

O texto obriga que fornecedores de produtos e serviços de tecnologia da informação adotem uma série de medidas para prevenir o acesso de crianças e adolescentes a conteúdos prejudiciais, como pornografia, bullying, incentivo ao suicídio e jogos de azar. Entre elas está a remoção de conteúdo.

Caso sejam identificados conteúdos relacionados a abuso sexual, sequestro, aliciamento ou exploração, as empresas devem remover e notificar imediatamente as autoridades competentes, tanto nacionais quanto internacionais. A exigência de remoção nesses casos não estava no texto aprovado pela Câmara e foi incluída pelo relator no Senado, Flávio Arns:


— Não se pode admitir que conteúdos de tamanha gravidade possam permanecer disponíveis publicamente mesmo após sua identificação e notificação às autoridades competentes. O dever de remoção deve ser entendido como implícito nesses caso — afirmou.

 

As empresas também deverão retirar o conteúdo que viola direitos de crianças e de adolescentes assim que forem comunicados do caráter ofensivo da publicação pela vítima, por seus representantes, pelo Ministério Público ou por entidades representativas de defesa  dos direitos de crianças e de adolescentes, independentemente de ordem judicial.

 

Denúncia abusiva 

O usuário que publicou conteúdo considerado abusivo deve ser notificado com antecedência, recebendo a justificativa da decisão de retirada da postagem e a informação sobre se a análise foi feita por um sistema automatizado ou por uma pessoa. A plataforma também deve oferecer um mecanismo de recurso acessível e claro, permitindo que o usuário conteste a remoção.

Se uma denúncia for feita de forma abusiva, o autor poderá sofrer sanções, incluindo a suspensão temporária ou até a perda da conta em casos de denúncias falsas recorrentes.

Redes com mais de 1 milhão de crianças ou adolescentes devem publicar, a cada seis meses, um relatório com dados sobre denúncias de abuso, conteúdos moderados e ações de gestão de riscos à segurança e saúde das crianças e adolescentes.

 

Supervisão dos pais e verificação de idade

Entre as obrigações dos provedores de redes sociais, está a de garantir que haja vinculação das redes sociais de crianças e adolescentes de até 16 anos a um responsável e a remoção de conteúdo considerado abusivo para este público.

O projeto proíbe que a verificação de idade seja feita por autodeclaração do usuário. Também exige que as empresas disponibilizem configurações e ferramentas acessíveis e fáceis de usar que apoiem a supervisão parental. A ideia é que os responsáveis tenham mais facilidade para acompanhar o conteúdo acessado pelas crianças e adolescentes, bem como limitar o tempo de uso.

 

Nível máximo de proteção 

As ferramentas de supervisão parental deverão, por padrão, oferecer o nível máximo de proteção disponível. Isso inclui bloquear a comunicação entre crianças e adultos não autorizados, limitar recursos que incentivem o uso excessivo — como reprodução automática, notificações e recompensas —, controlar sistemas de recomendação e restringir o compartilhamento da geolocalização.

Pais e responsáveis também devem ter acesso a controles que permitam configurar e gerenciar a conta da criança, definir regras de privacidade, restringir compras e transações financeiras, além de identificar os perfis de adultos com quem seus filhos interagem.

Na ausência de conta vinculada aos responsáveis legais, os provedores deverão impedir qualquer alteração que reduza o nível das configurações de supervisão parental.

 

Penalidades 

Quem descumprir a lei poderá ser penalizado com advertência, multa, suspensão ou até proibição de exercer atividades, sem prejuízo de outras sanções civis, criminais ou administrativas.

A advertência dará um prazo de até 30 dias para que o infrator adote medidas corretivas. Já a multa poderá chegar a até 10% do faturamento do grupo econômico no Brasil no último exercício. 

Caso essa informação não esteja disponível, a penalidade será calculada entre R$ 10 e R$ 1 mil por usuário cadastrado no provedor, limitada a R$ 50 milhões por infração. Todos os valores serão atualizados anualmente com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).

A aplicação das penalidades levará em conta fatores como a gravidade da infração, reincidência, capacidade econômica do infrator, finalidade social do provedor de internet e o impacto causado à coletividade.

Empresas estrangeiras serão solidariamente responsáveis pelo pagamento das multas aplicadas às suas filiais, sucursais, escritórios ou estabelecimentos no Brasil.

As penalidades mais severas — suspensão ou proibição de atividades — só poderão ser impostas pelo Poder Judiciário.

 

Caixas de recompensas 

O relator retomou o texto do Senado sobre as chamadas caixas de recompensas (ou loot boxes) em jogos eletrônicos. O projeto original previa a proibição desse recurso, que oferece ao jogador itens virtuais relacionados ao enredo do jogo sem que ele saiba previamente o que irá receber — ou seja, vantagens aleatórias. No entanto, a Câmara flexibilizou a regra e permitiu o uso da funcionalidade, desde que sejam seguidas determinadas condições.

Ao retomar a proibição total das loot boxes para crianças e adolescentes, Arns apontou que especialistas alertam que esse tipo de mecânica pode incentivar comportamentos compulsivos e manter o jogador engajado por longos períodos, mesmo quando não há envolvimento de dinheiro, mas sim de pontuações acumuladas dentro do próprio jogo.

— Não existem limites seguros para que crianças e adolescentes utilizem este tipo de ferramenta. Há evidências científicas que sugerem que o uso de caixas de recompensa pode resultar em comportamentos problemáticos em relação a jogos de azar entre adolescentes e jovens — apontou o senador.

 

Fiscalização 

O texto prevê que caberá à autoridade administrativa autônoma de proteção dos direitos de crianças e de adolescentes no ambiente digital fiscalizar o cumprimento da lei e editar normas complementares. Essa autoridade seguirá as regras da Lei das Agências Reguladoras[3], o que implica, por exemplo, a realização de consultas públicas antes da edição ou alteração de normas.

Uma lei própria regulamentará a criação dessa autoridade, que segundo o senador Alessandro Vieira poderá até mesmo ser incorporada pela Anatel, por exemplo. Ele fez a observação diante da preocupação da senadora Professora Dorinha Seabra (União-TO) de que isso poderia resultar em mais burocracia e na criação de cargos desnecessários.

 

Dados de crianças 

Os fornecedores deverão “se abster” de realizar o tratamento dos dados pessoais de crianças e adolescentes de maneira que possa causar ou contribuir para violações à privacidade e a outros direitos protegidos desse público.

 

Conteúdo impróprio 

De acordo com o texto, os fornecedores de produtos com conteúdo impróprio para menores de 18 anos deverão impedir o acesso por crianças e adolescentes.

Os provedores de aplicações de internet que disponibilizam conteúdo pornográfico deverão impedir a criação de contas ou de perfis por crianças e adolescentes.

 

Publicidade 

Outra medida de proteção de crianças e adolescentes prevista no projeto de lei é a proibição de traçar perfis para direcionar publicidade a essa faixa etária. Será vedado ainda o uso de análise emocional, realidade aumentada, realidade estendida e realidade virtual para esse fim.

 

Liberdade de expressão 

A regulamentação não poderá impor mecanismos de vigilância massiva, genérica ou indiscriminada; e serão vedadas práticas que comprometam os direitos fundamentais à liberdade de expressão, à privacidade, à proteção integral e ao tratamento diferenciado dos dados pessoais de crianças e adolescentes.” (g.n.)

 

Apesar de entender ser importante que todos os pais leiam o texto legal do Projeto de Lei 2628/2022 na íntegra, para que tirem suas próprias conclusões sem o perigo de interferência da ideologização – que ocorre em quase todos os temas nacionais e internacionais, o que acaba por distorcer uma avaliação mais racional –  já pelo resumo acima se vê que a regulamentação mais rígida das plataformas de redes sociais em relação ao acesso e utilização das crianças e adolescentes não acarreta cerceamento às liberdades de expressão e tampouco econômica, mas protege essa parcela da população, que por estare em formação, obviamente, é mais vulnerável a crimes que acabam por impactar pelo resto da vida.

 

V - CONCLUSÃO

 

Com tudo o que foi abordado acima, vemos que toda a tutela oferecida pelo Estado para a proteção contra o abuso de crianças e adolescentes em qualquer ambiente sempre será muito mais que bem-vindo, será indispensável e, portanto, se sobrepondo a qualquer interesse econômico. 

Ocorre que, importante sempre ressaltar, a primeira linha de defesa dessa parcela vulnerável da sociedade é a mais óbvia: a atenção dos pais ao que os filhos estão fazendo. Essa atenção e diversos “nãos dão trabalho, desgastam, geram embates, mas são absolutamente imprescindíveis para a adequada formação dessa geração tão voltada para um mundo (o digital) que além de isolar, guarda segredos que podem ser perigosos para os adultos do futuro.  

 

Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

alexandre_luso@yahoo.com.br





[1] https://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2025-08/mais-de-60-das-denuncias-de-crimes-na-internet-sao-de-abuso-infantil#:~:text=Um%20relat%C3%B3rio%20divulgado%20nesta%20quarta,ao%20mesmo%20per%C3%ADodo%20de%202024.

[2] https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2025/08/27/adultizacao-senado-aprova-projeto-para-proteger-criancas-em-ambientes-digitais

[3] Lei nº 13.848/2019. 


 

17 de agosto de 2025

CUIDADOS NA COMPRA DE VEÍCULOS USADOS



CUIDADOS NA COMPRA DE VEÍCULOS USADOS 

 

Alexandre Luso de Carvalho 

 

I - INTRODUÇÃO 

 

Comprar um veículo é o sonho ou necessidade de muita gente. Isso é fato. Comprar um carro ou moto zero quilômetro – à vista, financiado ou por consórcio – é possibilidade para poucos. Isso é outro fato. Com isso, para a maioria dos brasileiros buscam os veículos seminovos ou usados. 

Todavia, há de se ter uma série de cuidados na compra de um veículo seminovo ou usado para que isso não se transforme em prejuízos e imensos transtornos. Assim, após a escolha do modelo, ano e faixa de preço que se está disposto a pagar, vejamos a seguir alguns dos cuidados que se deve ter.

 

II – VEÍCULO COMPRADO DE PARTICULAR

(que não é loja de veículos)

 

Comprar veículo de particular, muitas vezes é uma vantagem, tendo em vista que sobre o valor de mercado do carro não incide a margem de lucro da loja. Todavia, há certos cuidados a serem tomados, quais sejam:

 

a)  requerer do comprador a certidão atualizada do veículo (certidão atualizada é aquela com menos de 30 dias) para verificar se não há qualquer restrição deste, isto é, se não há penhora, busca e apreensão ou determinação judicial e/ou administrativa que possa acarretar a futura perda do bem por parte do comprador;

 

b) pesquisar se há ações judiciais em nome do atual proprietário envolvendo o veículo, como, por exemplo, ação revisional e de busca e apreensão, além de outras que estejam prestes a ensejarem a penhora do veículo. Se isso for verificado, em hipótese alguma a compra deve ser feita;

 

c) caso o veículo seja financiado e o comprador assuma a dívida, é necessário verificar se o banco aceita a troca de titularidade do contrato. Se o banco não aceitar, o negócio não deve ser feito;

 

d) se há multas vinculadas ao veículo;

 

e) se o IPVA está em dia;

 

f) verificar se o carro é recuperado ou sinistrado. Isso pode ser feito por meio de consulta online nos sites do Detran de cada estado e/ou por meio de contratação de empresas especializadas em histórico veicular ou análise visual e mecânica do veículo;

 

g) solicitar ao mecânico de confiança (do comprador) uma vistoria prévia do veículo. Tal cautela é fundamental, pois a compra de um carro, moto, caminhão etc. de quem não é loja de veículo não é coberta pela garantia de 90 dias, prevista pelo Código de Defesa do Consumidor. Ou seja, se houver algum problema oculto, a resolução disso é bem mais complicada, pois pode (provavelmente) envolver a necessidade de ação judicial.

 

II – VEÍCULO COMPRADO DE LOJA ESPECIALIZADA

 

II.1. Das Cautelas Antes da Compra

 

Já ao comprar de lojas de veículos seminovos ou usados, o comprador pagará mais caro – as lojas precisam lucrar –, mas há certas vantagens (mais opções de crédito e a garantia de 90 dias, estabelecida pelo art. 26, inciso II do Código de Defesa do Consumidor). 

Entretanto, para compra em lojas de veículos não se tranforme num grande arrependimento, é importante, antes de realizar o negócio, que o comprador:

 

a)  verifique nos sites especializados de consumidores sobre a reputação das lojas de veículos - mesmo aquelas lojas indicadas por amigos ou parentes. Se houver muitas reclamações e se estas forem sérias no que tange à idoneidade, qualidade do produto e pós-venda ruim, não faça negócio com a loja;

 

b)  verificar no site do Tribunal de Justiça do seu estado se há ações judiciais de consumidores contra a loja. Se uma quantidade grande de processos, também aconselha-se abandonar qualquer negociação;

 

c)   verificar se o veículo está em nome da loja ou do antigo proprietário. Se estiver em nome do antigo proprietário, deve ser solicitada junto à loja todas as informações que se busca nos casos de compra de particular (certidão atualizada junto ao Detran, se há ações judiciais em nome do atual proprietário envolvendo o veículo, como, por exemplo, ação revisional e de busca e apreensão, dentre outras). Se isso for verificado, em hipótese alguma a compra deve ser feita;

 

d) se for dar um veículo como parte do negócio, em hipótese alguma assinar procuração para a loja, pois:

 

d.1. quando outorgamos (“passamos” na linguagem popular) uma procuração à alguém, estamos dando poderes para essa pessoa fazer algo em nosso nome. Isso significa que o veículo ainda continua sendo de propriedade do vendedor;

 

d.2. sendo o veículo ainda de propriedade do vendedor, tudo o que ocorrer será de responsabilidade do antigo proprietário, ou seja, este será o responsável pelo pagamento do IPVA, pelas multas (pagamento e pontuação) e corresponsável por todos os ilícitos que envolvam esse veículo;

 

e) se for financiar o veículo, antes de assinarem, o comprador deve estar muito atento com o seguinte:

 

e.1. a taxa de juros anunciada pela loja em seus anúncios (sempre salvar ou guardar esse anúncio), pois a promessa da publicidade deve ser cumprida;

 

e.2. qual a taxa de juros e demais valores constantes no contrato;

 

e.3. se for dar valor ou outro veículo de entrada, os valores negociados devem estar expressamente contidos no contrato;

 

e.4. valor total do financiamento;

 

e.5. caso o veículo seja financiado e o comprador for assumir o financiamento, se o banco aceita a troca de titularidade do contrato;

 

f) se há multas vinculadas ao veículo;

 

g) se o IPVA está em dia;

 

h) verificar se o carro é recuperado ou sinistrado, conforme já explicado;

 

i) solicitar ao mecânico de confiança (do comprador) uma vistoria prévia do veículo, pois, apesar de as lojas, por lei, darem a garantia de 90 dias após a compra, o pós-venda de muitas lojas se mostra muito ruim, o que pode causar muitos transtornos e prejuízos.

 

Tomadas essas cautelas, e estando tudo dentro da normalidade, pode o comprador realizar o negócio, mas deve prestar a atenção no seguinte:

 

a) não sair da loja sem seguro no veículo adquirido;

 

b) fazer o mais rápido possível o registro do veículo adquirido para o seu nome;

 

c) se no negócio, antigo veículo do comprador entrou como parte do pagamento, exigir e acompanhar se a loja transferiu a propriedade deste para o seu nome.

 

II.2. Do Pós-Venda

 

O pós-venda das lojas de veículos seminovos e usados é algo bastante complicado nessa relação de consumo, pois é muito comum os lojistas tentarem se eximir do cumprimento dessa obrigação, tanto por meio de limitação a certos reparos ou com a adoção da estratégia de fazer o comprador desistir dessa assistência pelo cansaço. 

Todavia, é importante, primeiramente, que o comprador saiba o que estabelece o Código de Defesa do Consumidor:

 

Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em:

(...)

II - noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis.

 § 1° Inicia-se a contagem do prazo decadencial a partir da entrega efetiva do produto ou do término da execução dos serviços.

§ 2° Obstam a decadência

I - a reclamação comprovadamente formulada pelo consumidor perante o fornecedor de produtos e serviços até a resposta negativa correspondente, que deve ser transmitida de forma inequívoca;

II - (Vetado).

III - a instauração de inquérito civil, até seu encerramento.

§ 3° Tratando-se de vício oculto, o prazo decadencial inicia-se no momento em que ficar evidenciado o defeito.

 

A partir da leitura da lei, o consumidor precisa ter consciência de que:

 

a) não há nada no Código de Defesa do Consumidor que restrinja a garantia a determinadas peças. Um exemplo clássico disso: muitas lojas dão a garantia somente para caixa de câmbio e motor. Está errado. A garantia de 90 dias é para outros itens do veículo, como:

 

a.1. sistema de freios;

a.2. suspensão;

a.3. sistema elétrico;

a.4. sistema de arrefecimento;

a.5. estética e acabamentos internos danificados.

 

b)  sempre deve fazer o registro dos problemas do veículo e do contato com a loja. Por isso, recomenda-se que sejam feitos mediante e-mail e/ou Whatsapp para que:

 

b.1. caso ocorra qualquer resistência da loja, haverá provas de sua conduta abusiva, o que é importante para futura ação judicial;


b.2. caso a loja tente ganhar tempo para fazer passar os 90 dias de garantia sem prestar a assistência devida, numa ação judicial o registro do problema e da comunicação do comprador ao vendedor é fundamental, pois o que contará é quando o consumidor iniciou os pedidos de reparos (antes ou depois da garantia);

 

c)   nos primeiros 90 dias, tentar utilizar o carro mais que a média normal. Tal ação é importante para que os problemas ocultos apareçam e o comprador possa comunicar e solicitar à loja a devida assistência.

 

Outro aspecto importante é que qualquer prejuízo (material e moral) que o consumidor venha a ter em razão do veículo comercializado com problemas ou por um serviço de pós-venda deficiente ou até mesmo abusivo, pode ter sua reparação buscada perante o Poder Judiciário. Todavia, há de se ter provas desses danos causados.

 

IV – CONCLUSÃO

 

A partir dos apontamentos acima, se o consumidor ficar atento às necessárias cautelas, os riscos de transtornos na compra de veículos seminovos e usados serão sensivelmente reduzidos. No entanto, se ocorrerem problemas, o comprador estará mais protegido, pois terá em mãos todas as provas necessárias para que o Poder Judiciário possa proteger seus direitos. 

 

Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

alexandre_luso@yahoo.com.br