26 de julho de 2020

PAGAMENTOS DE FINANCIAMENTOS DURANTE A PANDEMIA





Alexandre Luso de Carvalho


Conforme já abordado em vários outros artigos, a pandemia de coronavírus afetou profundamente a economia. Assim, cumprir as obrigações financeiras ficou muito mais difícil, senão impossível para grande parte da população e, com isso, algumas medidas tiveram que ser adotadas para minimizar a inadimplência, que já em 2019 foi de 63,8 milhões – um crescimento de 2% em relação a 2018[1].

Assim, apesar de amplamente divulgadas as medidas tomadas quanto à suspensão dos pagamentos dos financiamentos, cabe relembrar algumas delas:

a) FINANCIAMENTO HABITACIONAL JUNTO A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL: em 19.03.2020 os pagamentos foram suspensos por dois meses; já no dia 26.03.2020, tal suspensão foi ampliada para três meses e, finalmente em 14.05.2020 a suspensão passou para quatro meses, sendo automática para quem já havia requerido anteriormente e, para os novos pedidos, a pausa já será dos quatro meses. Para os contratos novos, a carência é de seis meses. Para tais renegociações, recomenda-se a procura dos canais digitais (Habitação CAIXA) e pelos telefones 3004-1105 para os pedidos de suspensão e para as renegociações dos contratos – diferente da mera suspensão – o telefone de contato é 0800-726-8068[2];

b) FINANCIAMENTO EMPRESARIAL JUNTO A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL: a Caixa Econômica Federal suspendeu os pagamentos de financiamentos destinados à produção de empreendimentos e para a aquisição e construção de imóveis comerciais – individual – e a prorrogação de carência por até seis meses para projetos com obras concluídas e em fase de amortização;

c) FINANCIAMENTOS DE VEÍCULOS: quanto a tais financiamentos, ainda tramitam no Senado Federal dois projetos de lei:

c.1. o PL nº 3.534/2020, de autoria da Senadora Rose de Freitas (PODEMOS/ES), que prevê a suspensão do pagamento de financiamentos de veículos por 120 dias;

c.2. o PL nº 3.521/2020, de autoria do Senador Sérgio Petecão (PSD/AC), que dispõe sobre a suspensão de cobrança de financiamentos de veículos contratados pelo FAT-Taxista, enquanto perdurar a vigência do Estado de Calamidade Pública estabelecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20.03.2020;


d) EMPRÉSTIMO CONSIGNADO DE APOSENTADOS E PENSIONISTAS: foi aprovado no Senado o Projeto de Lei nº 1.328/2020, de autoria do Senador Otto Alencar (PSD/BA), alterando a Lei nº 10.820/2003 (sobre a autorização para desconto de prestações em folha de pagamento), suspendendo temporariamente as prestações das operações de créditos consignados em benefícios previdenciários, enquanto persistir a pandemia de coronavírus. Sobre esse ponto, em abril o Juiz Federal Renato Coelho Borelli, da 9ª Cível do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (Distrito Federal), em decisão liminar, suspendeu por 120 dias a cobrança de parcelas de empréstimos consignados – decisão com repercussão para todo o Brasil. Todavia, em 28.04.2020, o Juiz Federal Carlos Augusto Pires Brandão, suspendeu a decisão liminar[3]. Como isso, para tal suspensão aguarda-se a votação do PL nº 1.328/2020, que ainda tramita na Câmara dos Deputados[4].

e) PAGAMENTO DO FIES: foi sancionada, com vetos, a Lei nº 14.024/2020, que altera a Lei nº 10.260/2001, suspendendo temporariamente as obrigações financeiras dos estudantes beneficiários pelo Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) durante a vigência do estado de calamidade pública (até 31.12.2020);

f) FINANCIAMENTOS JUNTO AO BNDES: foi aprovada em março de 2020 algumas medidas[5]:

f.1. a possibilidade de concessão da suspensão temporária por prazo de até seis meses de amortizações de empréstimos contratados junto ao BNDES, nas modalidades direta e indireta às empresas afetadas pela crise – medida conhecida no mercado como standstill;

f.2. “Nas operações diretas e mistas, o pedido de suspensão relativo ao subcréditos diretos deve ser encaminhado pelo cliente ao BNDES por meio do Portal”;

f.3. “Para operações indiretas não automáticas e subcréditos indiretos de operações mistas, a suspensão deverá ser negociada pelo cliente com o agente financeiro, que, caso concorde, deverá encaminhar o pedido de suspensão ao BNDES”;

f.4. “Por fim, em operações indiretas automáticas, a interrupção deverá também ser negociada com o agente financeiro que concedeu o financiamento. Neste caso, a autorização da suspensão dos pagamentos fica a critério do agente financeiro”;

g) FINANCIAMENTOS RURAIS[6]: o Conselho Monetário Nacional (CMN) autorizou a renegociação e a prorrogação para o crédito rural para produtores afetados pela seca, podendo, as instituições financeiras, prorrogar o vencimento das parcelas vencidas ou a vencer, a partir de 1º.01.2020. A prorrogação será até 15.08.2020.

Portanto, visto alguns dos financiamentos que foram objeto de medidas para minimizar os impactos nos orçamentos domésticos e empresariais da população brasileira, cabe a atenção de todos para as próximas medidas – e provavelmente virão –, salientando que é fundamental o conhecimento das especificidades de cada uma, pois, se não forem buscadas essas informações detalhadas pode-se perder oportunidades de diminuir os estragos que a pandemia faz, também, nas finanças de cada um.


Alexandre Luso de Carvalho
OAB/RS nº 44.808








[1] Fonte: economia.ig.com.br (link 1)

[2] Fonte: g1.globo.com (link 2)

[3] Fonte: jota.info ( link 3)

[4] Fonte: camara.leg.br (link 4)

[5] Fonte: bndes.gov.br (link 5)

[6] Fonte: agenciabrasil.ebc.com.br (link 6)

18 de julho de 2020

O DIREITO DE “IR E VIR” DURANTE A PANDEMIA




                   Alexandre Luso de Carvalho

Volta e meia assistimos nos noticiários ou nas redes sociais as pessoas bradando que seu direito constitucional de “ir e vir” está sendo violado pelas autoridades, em razão das medidas de restrições sanitárias, principalmente nas cidades em que foram adotados o lockdown.

Está previsto na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, inciso XV: “é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens”.

Os direitos de “ir e vir” e de “ficar”, saliente-se, já vêm de outras Constituições, que, conforme ensinamento do jurista SAMPAIO DÓRIA, tal princípio significa que (sic) “podem todos locomover-se livremente nas ruas, nas praças, nos lugares públicos, sem temor de serem privados de sua liberdade de locomoção”[1].

Entretanto, assim como o regramento constitucional preserva o direito individual do cidadão, este é limitado por outros direitos e garantias fundamentais previstos na própria Constituição – Princípio da Convivência da Liberdades Públicas – que dentre eles, destaco o direito à saúde, conforme disposto no artigo 6º da Constituição Federal[2], constante no Capítulo dos “Direitos Sociais” (Capítulo II, do Título II), a serem promovidos pelo Estado, no sentido de proteger a população e em especial as camadas mais vulneráveis.

Assim, tentando simplificar, ainda mais em se tratando de Direito Constitucional, a partir do momento em que o Estado tem a obrigação de promover políticas e ações para proteger os direitos sociais da população, pode-se, então, fazer uma leitura mais clara e correta acerca das medidas que estão sendo tomadas, por meio dos decretos estaduais e municipais, no sentido de estabelecerem regras de restrições sanitárias, uma vez que a infraestrutura hospitalar pública e privada não estavam (e não estão) preparadas para a pandemia do coronavírus.

Importante aqui salientar que as ações tomadas pelos estados e municípios só iniciaram a partir da decretação do estado de calamidade pública, por meio do Decreto Legislativo nº 06, de 20.03.2020, pelo Congresso Nacional, e que permite uma série de medidas em caráter excepcional. Medidas excepcionais, mas que não afrontam os dispositivos constitucionais, diga-se.

Todavia, já escutei comentários informais, tentando aproximar as medidas de restrições sanitárias das semelhantes às de um “estado de defesa” ou “estado de sítio” e que, portanto, teriam sido impostas de forma abusiva por prefeitos e governadores, pois, afrontariam as garantias constitucionais individuais. O equívoco de tal linha de raciocínio é evidente, uma vez que as próprias conceituações legais deixam bem claras as diferenças entre essas medidas. Veja-se:

a)   Situação de Emergência: é a situação anormal, causada por desastres, implicando danos e prejuízos que comprometam PARCIALMENTE a capacidade de resposta do ente público atingido (Decreto nº 7.257/2010[3], artigo 2º, inciso III);

b)  Estado de Calamidade Pública: é a situação anormal, causada por desastres, implicando danos e prejuízos que comprometam SUBSTANCIALMENTE a capacidade de resposta do ente público atingido (Decreto nº 7.257/2010, artigo 2º, inciso IV);

c)   Estado de Defesa: é a medida tomada pelo Presidente da República, por meio de decreto, “para preservar ou restabelecer, em locais restritos ou determinados, a ordem pública e paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza” (Constituição Federal, artigo, 136[4]);

d)  Estado de Sítio[5]: é a medida tomada pelo Presidente da República, por meio de decreto, mediante autorização do Congresso Nacional, nos casos de:

d.1. "comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa";

d.2. "declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira";

                          Assim, sobre as restrições causadas pelo coronavírus no direito de “ir e vir”, ou melhor dizendo, de acesso da população a certos locais, destaco o entendimento de RODRIGO BRANDÃO, Professor de Direito Constitucional da UERJ e Procurador do Município do Rio de Janeiro, em seu artigo “Coronavírus, estado de exceção sanitária e restrições a direitos fundamentais[6]:

"Desse modo, a crise do coronavírus não implica a suspensão da aplicação do Direito, mas maior tolerância à restrição de determinados princípios jurídicos desde que tais medidas sejam autorizadas pela ordem jurídica brasileira e se revelem absolutamente necessárias à restauração da normalidade"

 Com isso, quando ouvirmos alguém vociferar que seu direito constitucional de “ir e vir” está sendo violado porque não pode ter acesso a um parque, por exemplo, há de se ter cautela com tal irresignação, pois é necessário verificarmos os demais princípios constitucionais envolvidos, principalmente os coletivos para vermos se ações que os entes estatais adotam, encontram amparo legal, em especial no dever de assim agirem para a defesa da população. Portanto, no momento, não vejo nenhuma agressão aos direitos individuais do cidadão, previstos na Constituição Federal.


Alexandre Luso de Carvalho
OAB/RS nº 44.808





Referências bibliográficas e legislativas

[1] SAMPAIO DÓRIA, Antônio Roberto, Direito Constitucional: comentários à Constituição de 1946, 2ª edição, vol. IV, São Paulo, 1960, p. 651

[2] CF/88, Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

[3] Decreto nº 7.257/2010: Regulamenta a Medida Provisória no 494/2010, para dispor sobre o Sistema Nacional de Defesa Civil - SINDEC, sobre o reconhecimento de situação de emergência e estado de calamidade pública, sobre as transferências de recursos para ações de socorro, assistência às vítimas, restabelecimento de serviços essenciais e reconstrução nas áreas atingidas por desastre, e dá outras providências.

[4] CF/88, Art. 136. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.

[5] CF/88, Art. 137. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, solicitar ao Congresso Nacional autorização para decretar o estado de sítio nos casos de: I - comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa; II - declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira.

            





11 de julho de 2020

A LEI DO USO DE MÁSCARAS




- Alexandre Luso de Carvalho

Devido a pandemia de Coronavírus, assim como no Mundo inteiro, a obrigatoriedade do uso de máscara para autoproteção e de terceiros, passou a ser objeto de determinação das autoridades públicas. Aqui no Brasil, isso ocorreu por meio de decretos municipais e estaduais.

No Brasil, somente em 02.07.2020 é que, no âmbito federal, o uso de máscara tornou-se obrigatório, devido a publicação da Lei nº 14.019, alterando a Lei nº 13.979/2020 (que estabelece as medidas de enfrentamento à pandemia), conforme verifica-se abaixo:

a)  a obrigatoriedade do uso da máscara, seguindo as orientações médicas, em espaços públicos (parques, praças, calçadões e, no meu entendimento, também prédios públicos que estejam funcionando), e locais privados, mas com o acesso do público (supermercados, shoppings, agências bancárias, farmácias, etc.), bem como em transportes coletivos, táxis e veículos por aplicativos;

b) as exceções para o não uso da máscara, mostrando sensatez e sensibilidade são as seguintes:

b.1. pessoas com transtorno do espectro autista, com deficiência intelectual, com deficiências sensoriais ou com quaisquer outras deficiências que as impeçam de fazer o uso adequado de máscara de proteção facial, desde que comprovadas essas situações por atestado médico;

b.2. crianças menores de três (03) anos de idade;

c) a preferência de atendimento nos estabelecimentos de saúde aos profissionais dessa área, da segurança pública;

d)  o auxílio pelas empresas concessionárias de transporte público na fiscalização e do cumprimento do uso de máscaras, podendo, inclusive intervir no acesso aos terminais por elas operados;

e)  a determinação aos órgãos e entidades públicos, bem como às empresas permissionárias e concessionárias para que adotem medidas preventivas à proliferação de doenças.

Essas alterações acabaram com algumas dúvidas e impasses até então existentes, devido às próprias dissonâncias entre o Executivo Federal com Estados e Municípios e aproximou um pouco os protocolos de segurança sanitária entre esses entes federativos.

Todavia, o Projeto de Lei (PL 1562/2020), com o Substitutivo do Senado, que originou a Lei em questão, foi sancionado pelo Presidente da República com dezessete (17) vetos, sendo que, provavelmente, o que mais causou polêmica foi o veto ao inciso III do artigo 3º-A, com a seguinte redação:

Art. 3º-A. É obrigatório manter boca e nariz cobertos por máscara de proteção individual, conforme a legislação sanitária e na forma de regulamentação estabelecida pelo Poder Executivo federal, para circulação em espaços públicos e privados acessíveis ao público, em vias públicas e em transportes públicos coletivos, bem como em:
(...)
III – estabelecimentos comerciais e industriais, templos religiosos, estabelecimentos de ensino e demais locais fechados em que haja reunião de pessoas. (VETADO)

A justificativa de veto desse dispositivo legal, está na mensagem de veto nº 374, de 02.07.2020, conforme transcrição abaixo:

Razões do veto
“A propositura legislativa, ao estabelecer que o uso de máscaras será obrigatório em demais locais fechados em que haja reunião de pessoas, incorre em possível violação de domicílio por abarcar conceito abrangente de locais não abertos ao público, a teor do art. 5º, XI, da Constituição Federal, o qual dispõe que a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial. Deste modo, não havendo a possibilidade de veto de palavras ou trechos, conforme o § 2º do artigo 66 da Constituição da República, impõe-se o veto do dispositivo.” (Grifado)

Em contraponto à mensagem de veto, a Secretaria-Geral da Mesa da Câmara dos Deputados (SGM), em matéria veiculada no site daquela Casa legislativa[1], sobre o veto ao inciso III do artigo 3º-A, pronunciou-se da seguinte forma:

“No entendimento da Secretaria-Geral da Mesa (SGM) da Câmara, no entanto, ‘demais locais fechados’ refere-se a espaço privado acessível ao público e nunca a domicílios. Para a SGM, a garantia constitucional de inviolabilidade de domicílio não poderia, em nenhuma hipótese, ser afastada por lei ordinária.” (Grifado)


Particularmente, entendo da mesma forma que a SGM da Câmara dos Deputados, pois o caput do próprio artigo 3º-A deixa claro a que se destina a obrigatoriedade do uso de máscaras: “espaços públicos e privados acessíveis ao público, em vias públicas e em transportes públicos coletivos”. Ou seja, os espaços privados de acesso público são lojas, shoppings, escolas, templos religiosos, restaurantes, etc. Não residências.

Frise-se: os domicílios só perdem a sua inviolabilidade em caso de flagrante delito, conforme determina o artigo 5º, inciso XI[2] da Constituição Federal. Assim, trazendo esse dispositivo constitucional para o caso em questão, as residências teriam que ter a sua finalidade desvirtuada. Exemplos: um domicílio passar a receber cultos religiosos ou uma chácara de lazer, de uso familiar, virar casa de eventos ou de festas. Em ambos os casos estar-se-ia diante do descumprimento de restrições/determinações sanitárias, o que, dependendo do texto legal é um delito com repercussões penais. Portanto, não vejo sentido jurídico no veto do mencionado dispositivo.

Outros artigos vetados que me chamaram, particularmente a atenção, foram o 3º-B, 3º-C e 3º-F, com as seguintes redações:

“Art. 3º-B. Os estabelecimentos autorizados a funcionar durante a pandemia da Covid-19 são obrigados a fornecer a seus funcionários e colaboradores máscaras de proteção individual, ainda que de fabricação artesanal, e outros equipamentos de proteção quando o estabelecimento funcionar com atendimento ao público.

§ 1º O descumprimento da obrigação prevista no caput deste artigo acarretará a imposição de multa de até R$ 300,00 (trezentos reais) por funcionário ou colaborador, que será aplicada em dobro nos casos de reincidência.

§ 2º O disposto no § 1º deste artigo será regulamentado por decreto ou por ato administrativo do Poder Executivo estadual ou municipal, que estabelecerá as autoridades responsáveis pela fiscalização da obrigação prevista no caput e pelo recolhimento da multa prevista no § 1º deste artigo.

§ 3º A obrigação prevista no caput deste artigo também se aplica a órgãos e entidades públicos.

§ 4º Na aquisição das máscaras de proteção individual a serem fornecidas em virtude do disposto no § 3º deste artigo, deve o poder público dar preferência às produzidas artesanalmente, por costureiras ou outros produtores locais, de forma individual, associada ou por meio de cooperativas de produtores, observado sempre o preço de mercado.

Art. 3º-C As multas previstas no § 1º do art. 3º-A e no § 1º do art. 3º-B desta Lei somente serão aplicadas na ausência de normas estaduais ou municipais que estabeleçam multa com hipótese de incidência igual ou semelhante.” “Art. 3º-D Os recursos advindos das multas previstas no § 1º do art. 3º-A e no § 1º do art. 3ºB desta Lei deverão ser utilizados obrigatoriamente no enfrentamento da pandemia da Covid-19 no País. Parágrafo único. Os valores recolhidos deverão ser informados em portais de transparência ou, na falta destes, em outro meio de publicidade, para fins de prestação de contas.
(...)
“Art. 3º-F É obrigatório o uso de máscaras de proteção individual a todos os trabalhadores dos estabelecimentos prisionais e de cumprimento de medidas socioeducativas, incluídos os prestadores de serviço, observada a primeira parte do caput do art. 3º-B desta Lei.”


Com isso, a lei em questão poderia ser mais abrangente e, portanto, eficaz, se muitos dos artigos não tivessem sido vetados pelo Presidente da República, pois, aqui perdeu-se uma excelente oportunidade de:

a) ampliar a proteção estabelecida em lei para a população economicamente ativa, dos setores público e privado, e, não depender de acordos privados, que podem ser feitos ou não; ou, ainda, de normatização municipal e estadual, que pode ter uma grande variação, o que não auxilia no combate a uma pandemia, que necessita de uma série de determinações e ações coordenadas;

b) NORMATIZAR UMA QUESTÃO TRABALHISTA, pois, no atual momento a máscara (descartável ou reutilizável) é, sem dúvida, um EPI (equipamento de proteção individual), independentemente da característica originária da função e, portanto, incumbe ao empregador fornecer esse material, conforme determina a Norma Regulamentadora nº 6 (NR-6) e artigo 166 da CLT[3]. Todavia, se alguns empregadores entenderem que não devem fornecer tal equipamento aos empregados, isso causará uma série de embaraços nas rotinas trabalhistas e pode ser motivo de inúmeras de ações perante à Justiça do Trabalho.

Assim, os vetos aqui tratados, a meu ver, só podem ser explicados por motivos políticos, no sentido de contemplar um determinado grupo, dado a improbabilidade de “violação de domicílio” e pelos custos que isso acarretaria, tanto para o setor público, como para o privado, em razão do fornecimento do equipamento e do descumprimento da obrigação expressa em fornecer a máscara.


Alexandre Luso de Carvalho
OAB/RS nº 44.808




[2] Constituição Federal. Art. 5º (...). XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial; 

[3] CLT, art. 166 - A empresa é obrigada a fornecer aos empregados, gratuitamente, equipamento de proteção individual adequado ao risco e em perfeito estado de conservação e funcionamento, sempre que as medidas de ordem geral não ofereçam completa proteção contra os riscos de acidentes e danos à saúde dos empregados.




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4 de julho de 2020

COMPRAS FEITAS DE CASA DURANTE A PANDEMIA




                     - Alexandre Luso de Carvalho

As compras pelo sistema online ou de telecompras que em 2019 já representava 14% das vendas do comércio  são regrados pelo Código de Defesa do Consumidor, no qual se destaca o artigo 49, que assim estabelece:

Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.

Parágrafo único. Se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados.


Obviamente que tal prazo de sete (07) dias não se aplica a produtos e/ou serviços de consumo imediato, como medicamentos, alimentos perecíveis, dentre outros, uma vez que isso inviabilizaria as práticas comerciais e de serviços nessa modalidade.

Ocorre que durante a pandemia que nos assola, a compra de produtos e contratação de serviços passaram a ser preponderantemente pelo sistema online –, delivery e “pague-pegue”. Até aí nada de novo. Todos sabem.

Todavia, em razão da pandemia de Coronavírus, o mencionado artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor teve sua aplicação suspensa pela Lei nº 14.010/2020 (Regime Jurídico Emergencial e Transitório das Relações Jurídicas de Direito Privado – RJET), que assim dispõe sobre o tema:

Art. 8º. Até 30 de outubro de 2020, fica suspensa a aplicação do art. 49 do Código de Defesa do Consumidor na hipótese de entrega domiciliar (delivery) de produtos perecíveis ou de consumo imediato e de medicamentos. 


Tal suspensão do artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor pelo artigo 8º da Lei nº 14.010/2020 tem como intenção, dado o momento de excepcionalidade, simplificar esse aspecto da relação de consumo, uma vez que, dentre outros motivos, a devolução dos produtos dentro dos sete (07) dias e da consequente devolução do valor pago ficaria prejudicada, pois, a restrição de circulação, de horários de atendimento e diminuição da capacidade de operação das empresas inviabilizaria o consumidor de usufruir desse direito e o comerciante de cumprir o prazo. Isso, certamente, causaria um grande imbróglio jurídico, que em tempos normais não ocorreria.

Entretanto, o texto do artigo 8º carrega em sua redação um risco desnecessário de dubiedade interpretativa, pois, apesar de suspender o artigo 49, como um todo, contém a expressão “delivery que, para o mercado brasileiro, é entendido como aquelas compras de alimentos, refeições prontas e medicamentos, que não são, comumente, abarcados pelo artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor. Certamente se trata de uma redação equivocada neste ponto (inclusão desnecessária da expressão “delivery”) e, portanto, a suspensão deve ser entendida para aquelas compras online de produtos duráveis (roupas, móveis, eletrodomésticos, etc.).

Cumpre destacar que a Lei nº 14.010/2020 não altera ou suspende o restante das regras de consumo estabelecidas pelo Código de Defesa do Consumidor. Suspende somente o artigo 49.

Outro aspecto importante é que, além das vendas online, todas as partes envolvidas na relação de consumo devem atentarem-se, também, que as vendas e serviços realizados em loja devem seguir os princípios da relação de consumo estabelecidos expressamente pelo Código de Defesa do Consumidor. Isto é, não é uma “sugestão” de boa prática comercial; é uma determinação legal.

Entendo, inclusive, que dos princípios estabelecidos pelo Código de Defesa do Consumidor, a relação de consumo deve iniciar pelo PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA (art. 4º, III), cuja redação é a seguinte:

Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:
(...)
III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;


Com isso, se forem observados os princípios determinados no Código de Defesa do Consumidor, a começar pelo da boa-fé objetiva, evitar-se-á desnecessárias ações perante o Poder Judiciário e, portanto, prejuízos a todos os envolvidos. Isso mesmo. Importante frisar que os consumidores não são os únicos a perderem com as más práticas comerciais: as empresas, principalmente as de pequeno porte sofrem muito, já que perdem os clientes e as indicações vindas destes e, numa ação judicial, acabam arcando, na maioria das vezes, com as custas judiciais, honorários advocatícios e indenizações às quais são condenadas, o que causam consideráveis gastos a estes pequenos e médios estabelecimentos.

Portanto, observar os direitos do consumidor, mais do que um dever legal, que é o principal, acaba sendo um bom negócio, pois, evita prejuízos e é um ótimo marketing.


Alexandre Luso de Carvalho
OAB/RS nº 44.808