19 de setembro de 2020

TRATAMENTOS FORA DA RELAÇÃO DE COBERTURA DOS PLANOS DE SAÚDE


 

Alexandre Luso de Carvalho


É muito comum a ocorrência de casos em que uma determinada pessoa, cliente de uma operadora de plano de saúde, acometida de uma doença na qual o tratamento é coberto pelo plano contratado, mas que, devido à particularidade de seu caso, o tratamento indicado pelo médico não é exatamente o constante no rol de cobertura, sendo esta negada. Isso ocorre, principalmente, quando se trata de doenças graves, cujos tratamentos são extremamente caros.

Quando essa negativa ocorre há possibilidade de buscar o Poder Judiciário, uma vez que a relação entre o cliente e a operadora é regida pelo Código de Defesa do Consumidor e, portanto, segue os princípios nele contidos, dos quais destaco:

a) o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor;

b) proteção contra métodos comerciais coercitivos e ilegais;

c) inversão do ônus da prova;

d) proibição de exigir do consumidor vantagem excessiva;

e) interpretação contratual mais favorável ao consumidor;

f) nulidade das cláusulas contratuais abusivas.


Com isso, a partir dessa relação, verifica-se quais as obrigações existentes entre ambos:

a) do consumidor: manter os pagamentos em dia;

b) da operadora: fornecer o tratamento adequado para a patologia a qual se contratou a cobertura.

 

Assim, a partir do momento em que está estabelecido o dever da contraprestação contratual pela operadora do plano de saúde há de destacar dois aspectos fundamentais:

a)   o contrato de plano de saúde não envolve mera entrega de valores, mas a execução de uma obrigação bem mais ampla e complexa. É o chamado performance bond;

b)  as obrigações constantes no contrato de plano de saúde estão interligadas de modo profundo com os princípios constitucionais de proteção à vida, à saúde e à dignidade da pessoa humana, o que se sobrepõem ao lucro empresarial, principalmente nessa espécie de contrato.


Com isso, a jurisprudência também entende que os planos de saúde devem custear o tratamento prescrito pelo médico, conforme exemplifica-se abaixo:

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA. TUTELA ANTECIPADA. PLANO DE SAÚDE. MEDICAMENTO. ALEGAÇÃO AUSÊNCIA DE COBERTURA. VEDOLIZUMAB (ENTYVIO) COBERTURA DEVIDA. 1. O plano de saúde não pode se recusar a custear fármaco prescrito pelo médico, pois cabe a este definir qual é o melhor tratamento para o segurado. Além disso, o que importa é a existência de cobertura do contrato para a doença apresentada pela parte autora. 2. Tendo em vista a verossimilhança do alegado pela parte agravada, bem como o perigo de dano irreparável ou de difícil reparação à sua saúde, imperioso o deferimento da medida antecipatória postulada. Presença dos requisitos autorizadores da antecipação de tutela. Art. 300 do NCPC. Recurso desprovido. (TJRS, Agravo de Instrumento nº 70072657224, 5ª Câmara Cível, Rel. Des. Isabel Dias Almeida, julgado em 29.03.2017)

 

Por fim, é importante frisar que apesar dos princípios doutrinários e o entendimento jurisprudencial apresentados acima,  a matéria é muita mais complexa do que parece, uma vez que esta envolve, além do Código de Defesa do Consumidor, toda uma legislação específica e, portanto, a sua aplicação não ocorre de modo automático ou geral, mas sim, caso a caso, a partir da especificidade de cada contrato e de cada patologia.

 

 Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

alexandre_luso@yahoo.com.br


8 comentários:

  1. Alexandre, matéria de grande complexidade essa. Na maioria das vezes, só recorrendo ao judiciário se consegue o pretendido. Pior é que as operadoras indeferem, de plano, solicitações que merecem acatamento e cuja urgência de atendimento logo se mostra. Desanimados, muitos gastam o que não podem, com enormes sacrifícios, para não deixar alguém da família sem a cobertura que lhes era devida pelo plano de saúde. Conhecer direitos é fundamental. Bela postagem! Abraço.

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    1. Bom dia, Marilene.

      Exatamente!! E a cada caso é um procedimento individual diferente, pois depende da política de cada operadora e das particularidades de cada caso, o que torna a situação mais confusa para o consumidor.

      Muito obrigado pela leitura e por incluir meu blog no BlogRoll do diario-feminino.blogspot.com!!

      Um ótima semana!

      Abraço!

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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    1. Observação:

      A remoção do comentário acima, não ocorreu por nenhum comentário de leitor, mas por que, por lapso havia esquecido de agradecer na resposta ao comentário da caríssima amiga Marilene, neste artigo, por incluir meu blog no BlogRoll do diario-feminino.blogspot.com.

      Fica aqui, mais uma vez meu agradecimento à Marilene, amiga e colega advogada pela leitura e pelas, sempre, gentis palavras.

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    2. Alexandre, apesar de estar aposentada, gosto muito de acompanhar postagens voltadas para o direito, já que ele tem nuances diversas, dependendo do foco do profissional. É dinâmico e, hoje, principalmente, suas questões têm merecido apreciações que até sinto como descabidas rss. Você é bem objetivo e claro, o que proporciona uma agradável leitura de suas postagens. Abraço.

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    3. Boa noite, cara Marilene.

      Fico muito contente que tens acompanhado minhas postagens e que tens gostado da forma como abordo os assuntos e que pela dinâmica do Direito, como bem disseste, torna o estudo de cada assunto um desafio.

      Grande abraço!

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  3. Retribuindo o comentário de 22 de Junho, no A Vivenciar, que agradeço.

    São leis excelentes e é lamentável que não sejam irrevogáveis...
    Nós temos um Sistema Nacional de Saúde e os inquéritos administativos já são facilitados pelo arquivo computacional...
    Mas ainda aparecem em certos casos... Um horror para quem está doente!
    Aplaudo o 'post' por ser muito pertinente e esclarecedor.
    Boa semana, Alexandre.
    Beijos
    ~~~

    Uma boa semana e que tudo lhe corra pelo melhor.

    Beijinhos
    ~~~~~

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  4. Boa noite, cara Majo Dutra!

    A cobertura para tratamentos mais complexos parece ser um problema geral. Muito obrigado pelo teu tempo em ler o artigo e pelo comentário.

    Espero que continues a acompanhar os artigos.

    Ótima semana para ti e um grande abraço!!

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