19 de setembro de 2021

AS OFENSAS RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO E SUAS CONSEQUÊNCIAS


 

Alexandre Luso de Carvalho

 

I - INTRODUÇÃO

 

O Brasil é um país racista. Isso é fato. Dizer o contrário é ir contra todas as notícias veiculadas na mídia, bem como na própria quantidade de julgamentos sobre tal questão em todos os ambientes da sociedade. 

E como não poderia deixar ocorrer, esse racismo infelizmente faz parte da rotina dos ambientes de trabalho, não só na rejeição à contratação de pessoas negras, principalmente, mas também na contratação para cargos inferiores, no pagamentos de salários mais baixos que dos brancos para o mesmo cargo, na maior dificuldade nas promoções e, ainda, quanto ao tratamento diário dirigido à essas pessoas por colegas de trabalho e/ou superiores hierárquicos.

 

II - DOS ILÍCITOS COMETIDOS

 

Muitas vezes o tratamento racista do qual são alvos os negros e negras, em sua esmagadora maioria, mas também indígenas, orientais e etnias que tradicionalmente são objeto de discriminação, ocorre cotidianamente por meio de piadas, trotes, supostas brincadeiras, injúrias raciais e racismo, cujos conceitos, resumidamente, são os seguintes[1]:

 

a)   crime de injúria racial: “(...) consiste em ofender a honra de alguém, valendo-se de elementos referentes à raça, cor, etnia, religião ou origem (...)”;

 

b)  crime de racismo: “(...) implica numa conduta discriminatória dirigida a determinado grupo ou coletividade e, geralmente, refere-se a crimes mais amplos.” Um exemplo de crime de racismo é impedir o acesso a estabelecimento comercial em razão da raça ou etnia.


Tal comportamento é condenável pelo Poder Judiciário não só pelo fato de ser absolutamente reprovável sob o ponto de vista moral, mas por ferir os seguintes dispositivos legais:

 

a)  Constituição Federal:

 

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

(...)
III - a dignidade da pessoa humana;
(...)

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
(...)
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

(...)

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;
 

b) Código Penal:

 
Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:
(...)
§ 3o Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência:
Pena - reclusão de um a três anos e multa.

 

c)   Lei nº 7.716/1989 (define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor):

 
Art. 1º Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.
(...)
Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.

 

d) Código Civil:
 
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
 
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

 

Entretanto, apesar dessa legislação, o que se observa é que a prática do racismo, por suas mais diferentes manifestações, continua nos setores público e privado sem que, em muitos casos, seja coibida de modo efetivo. 

Ocorre, que em razão dessa omissão ou melhor dizendo, dessa conivência, o racismo, além de atingir a vítima, traz repercussões jurídicas para:

 

a)   a pessoa que pratica o ilícito: seja superior hierárquico ou não, essas consequências vêm por meio da ação penal pelo crime de racismo ou injúria racial e por ações indenizatórias, na esfera cível e administrativa, se for servidor público;

 

b)  as pessoas jurídicas do setor privado (empresas, entidades associativas, condomínios, etc.): as repercussões ocorrem por meio de condenações na esfera trabalhista, sendo as empregadoras obrigadas a indenizarem os empregados ou ex-empregados pelos danos morais sofridos, desde que devidamente provados pela vítima; 

 

c)   os entes estatais: nas seguintes esferas:

 

c.1. trabalhista (nos casos do de funcionários contratados pelo regime da CLT);

 

c.2. administrativa em relação a quem comete o ato, conforme já dito, e ao gestor público, pela omissão;

 

c.3. cível, no sentido de condenar o ente público por danos morais a serem pagos à vítima de atos racistas.

 

Cumpre destacar que nos últimos anos, em razão de um trabalho de conscientização de setores da sociedade civil organizada e de autoridades, os empregados vítimas de racismo têm, de modo absolutamente legítimo e salutar, saído de uma postura passiva, buscando a punição, dentro da lei, de quem comete injúrias e/ou crimes de naturezas raciais. E esse comportamento tende cada vez a tornar-se mais forte e definitivo, o que é um avanço social. 

Com isso, por parte do empregador, para evitar as condenações por dano moral, cabe elaborar e colocar em prática rotinas de combate aos atos racistas e quando esses ocorrerem, que haja uma rigorosa punição a quem os comete, uma vez que não é aceita pelos Tribunais uma “encenação de punição”, isto é, a aplicação de sanções brandas para tais atos.

 

III – CONCLUSÃO

 

Portanto, para concluir, é importante que empregador e empregado mantenham comportamentos de combate ao racismo, dentro do que lhes compete – um não aceitando e não se submetendo ao racismo e o outro com ações preventivas e punitivas quando esses ilícitos ocorrerem.

Com tais comportamentos, sem dúvida, ter-se-á um ambiente de trabalho mais saudável e humano e, sem dúvida, uma contribuição à evolução da sociedade como um todo. 

 

Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

alexandre_luso@yahoo.com.br


Fonte da imagem



[1] Fonte: https://www.cnj.jus.br/conheca-a-diferenca-entre-racismo-e-injuria-racial/

4 comentários:

  1. Excelente e útil postagem, precisamos mesmo estarmos alertas, afinal o racismo estrutural está presente em nosso cotidiano, sem contar que temos um presidente da Fundação Palmares, preto, mas que se sente branco e não reconhece as lutas dos pretos e pardos e pobres deste país.

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  2. Bom dia Dalva.

    Muito obrigado pelo elogio. Realmente! O racismo só é combatido com atitude. Mas não é uma atitude não só de quem é alvo desse tipo de comportamento, mas de toda a sociedade. Retórica sem ação de nada serve.

    Grande abraço!

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  3. O racismo é muito lamentável, em todo o lugar, mas especialmente no Brasil!
    Creio que só a educação poderá resolver esse deplorável comportamento, mas consta que o sistema educativo também tem muitos problemas...
    Vai levar tempo a extirpar esse mal...
    Excelente primavera. Beijinho.
    ~~~~~

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    1. Boa noite caríssima Majo Dutra!

      Enquanto esse mal não é extirpado pela educação, deve ser combatido pela lei e por suas sanções, pois ainda estamos na fase de "se não aprende pelo amor, aprende pela dor". Que evoluamos para que o respeito seja parte de nossa rotina.

      Abraço grande.

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