18 de abril de 2021

A RESPONSABILIDADE DO CONSTRUTOR E DO INCORPORADOR POR DEFEITOS NA OBRA


 

Alexandre Luso de Carvalho

 

I – INTRODUÇÃO

 

O setor da construção civil é um dos mais importantes da economia brasileira, tendo representado entre 2011 a 2014, 6% do PIB nacional, conforme dados do DIEESE[1]. Tal importância, apesar da crise econômica, é notada pela quantidade de novos empreendimentos para os mais diversos públicos, isto é, dos imóveis populares (Minha Casa Minha Vida e, após, Casa Verde e Amarela) até os condomínios de alto padrão, construídos com uma sofisticação e opções de espaços privativos e comuns para atividades de lazer e/ou profissionais, dependendo de sua finalidade. 

Ocorre que ao mesmo tempo em que se tem o aumento da oferta de imóveis, vê-se a queda na qualidade das construções. Aliás, muitas vezes verifica-se que as opções ofertadas nas áreas comuns dos empreendimentos imobiliários são um fator determinante e acabam por “esconder” a baixa qualidade construtiva do imóvel. E isso não é de hoje.

  

II – DA GARANTIA E DA INDENIZAÇÃO POR DEFEITOS NA CONSTRUÇÃO

 

Em razão dessa baixa qualidade construtiva que começam os problemas de quem compra esses imóveis, pois frequentemente esses são entregues com vários problemas, uns percebidos já de início e outros que são percebidos somente com o decorrer dos anos.

Quando esses defeitos (vícios) na construção – tanto das áreas comuns, como das áreas privativas – começam a aparecer alguns anos depois da aquisição do imóvel, é que as preocupações tomam conta da rotina dos proprietários em razão de um aspecto: a garantia construtiva. 

O Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 27[2] e o Código Civil, em seu artigo 618[3] determinam a prescrição de cinco (05) anos para a pretensão de reparação pelos danos causados por defeito no produto ou serviço. 

Esse prazo, em se tratando de vícios construtivos, entretanto, se mostra curto, pois quando os defeitos não são aparentes, muitas vezes eles demoram a aparecer, ou seja, demoram mais do que os cinco anos de garantia. E é nesse ponto, também, que as construtoras e incorporadoras se aproveitam. 

Todavia, há ressalvas para esse prazo de cinco anos, podendo estender-se por mais tempo, dependendo das circunstâncias de cada caso. Sobre isso, vale destacar o ensinamento de SERGIO CAVALIERI FILHO:

 

“(...) a responsabilidade do incorporador/construtor perante o consumidor não mais se limita aos vícios que a obra apresentar nos cinco primeiros anos de existência, estendendo-se agora, à luz do Código do Consumidor, por todo de razoável durabilidade do prédio. Acrescente-se que também aqui a responsabilidade do construtor é objetiva, por ser irrelevante que ele tenha ou não conhecimento desse vício. Nesse sentido o texto expresso do art. 23 do Código do Consumidor: ‘A ignorância do fornecedor sobre os vícios de qualidade por inadequação dos produtos e serviços não o exime de responsabilidade’.”[4]

 

Nesse sentido, importante trazer um trecho do Recurso Especial nº 984.106/SC[5], de relatoria do Ministro Luís Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça:

(...)

Cumpre ressaltar que, mesmo na hipótese de existência de prazo legal de garantia, causaria estranheza afirmar que o fornecedor estaria sempre e sempre isento de responsabilidade em relação aos vícios que se tornaram evidentes depois desse interregno.

Basta dizer, por exemplo, que, muito embora o construtor responda pela solidez e segurança da obra pelo prazo legal de 5 (cinco) anos, nos termos do art. 618 do CC/02, não seria admissível que o empreendimento pudesse desabar no sexto ano e por nada respondesse o construtor.

(...)

Deve ser considerada para a aferição da responsabilidade do fornecedor a natureza do vício que inquinou o produto, mesmo que tenha ele se manifestado somente ao término da garantia.

Nesse passo, os prazos de garantia, sejam eles legais ou contratuais, visam a acautelar o adquirente de produtos contra defeitos relacionados ao desgaste natural da coisa, como sendo um intervalo mínimo de tempo no qual não se espera que haja deterioração do objeto. Depois desse prazo, tolera-se que, em virtude do uso ordinário do produto, algum desgaste possa mesmo surgir.

Coisa diversa é o vício intrínseco do produto existente desde sempre, mas que somente veio a se manifestar depois de expirada a garantia, como é o caso de edifícios de estruturas frágeis que ruínam a partir de certo tempo de uso, mas muito antes do que normalmente se esperaria de um empreendimento imobiliário, de modo a ficar contrariada a própria essência do que seja um ‘bem durável’.

(...)” (Grifado)

 

Já em relação à indenização em razão do vício construtivo o prazo prescricional é de dez (10) anos, conforme entendimento jurisprudencial:

 

CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE RESSARCIMENTO CONTRA O CONSTRUTOR. DEFEITOS NA CONSTRUÇÃO. 1. PRAZO PRESCRICIONAL PARA OBTER, DO CONSTRUTOR, INDENIZAÇÃO POR DEFEITO DA OBRA NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 2002 É DE 10 ANOS. 2. VÍCIO CONSTRUTIVO. LAUDO PERICIAL. INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO Nº 7 DA SÚMULA DESTA CORTE. 3. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. O prazo prescricional da ação para obter, do construtor, indenização por defeito da obra na vigência do Código Civil de 2002 é de 10 anos. 2. O laudo pericial comprovou cabalmente os defeitos apresentados no edifício, não constatando a alegada falta de manutenção. Portanto, rever o acórdão recorrido enseja o reexame do conjunto probatório dos autos, o que é defeso na instância especial, de acordo com o disposto no enunciado nº 7 da Súmula desta Corte. 3. Em face da ausência de qualquer subsídio capaz de alterar os fundamentos da decisão agravada, subsiste incólume o entendimento nela firmado, não merecendo prosperar o presente recurso. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ, AgRg no AREsp 661548 RJ 2015/0029077-0, 3ª Turma, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 26.05.2015). (Grifado)

  

Ou seja, há de ser visto em casos de vícios construtivos, dentre tantos aspectos, três que são fundamentais: a) a natureza do vício; b) a garantia construtiva; c) o direito de indenização.

 

III – CONCLUSÃO

 

Com isso, devem os proprietários de imóveis e/ou dos síndicos ficarem atentos aos danos que surgirem, buscando, sempre, orientação técnica para saberem se esses são decorrentes do desgaste comum, mau uso do bem ou de vícios construtivos, para que, nesse último caso, comece a coleta das provas, no sentido de o mais rápido possível dar-se início aos procedimentos para a busca das soluções e indenizações, quer seja pela via extrajudicial, quer pela via judicial.

  

Alexandre Luso de Carvalho

OAB/RS nº 44.808

 

alexandre_luso@yahoo.com.br

  

Fonte



[1] https://www.dieese.org.br/estudosepesquisas/2020/estPesq95trabconstrucaocivil/index.html?page=6

[2] Código de Defesa do Consumidor, art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria.

[3] Código Civil, art. 618. Nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante o prazo irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais, como do solo.

[4] FILHO, Sergio Cavalieri, Programa de Responsabilidade Civil, Malheiros Editores, 5ª ed., São Paulo, 2004, p. 343/364

[5] STJ, REsp nº 984.106/SC, 4ª Turma, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, julgado em 04.10.2012.


3 comentários:

  1. Não sabia do prazo de 10 anos...
    Estes casos são sempre grandes imbróglios judiciais.
    Gostei muito de ler, Alexandre. Beijinhos
    ~~~

    ResponderExcluir
  2. Boa noite, Majo Dutra!

    Primeiramente, obrigado por ter lido e pelo elogio. Esse tipo de relação com construtoras e incorporadoras, sempre são imbróglios judiciais, pois, muitas vezes já começam com problemas contratuais, continuando em atraso na entrega da obra e finalizando nos vícios construtivos.

    Grande abraço!

    ResponderExcluir
  3. Boa noite Alexandre Luso !!!
    Muito obrigado !

    ResponderExcluir